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I SÉRIE - NÚMERO 101

negociação tinham sido à partida viciadas pelo Governo quando este assumiu desde logo o compromisso público de «fechar negócio», não dando aos negociadores outra margem de manobra que não fosse a de discutir o preço, ainda por cima na situação de constatarem que a outra parte, as Forças dos Estados Unidos, usavam e abusavam ilegitimamente de todo o tipo de facilidades (incluindo militares) com o beneplácito do Governo Português!

Importa, entretanto, Srs. Deputados, sublinhar duas notas.

Por um lado, o Governo fez tudo para evitar que fosse dado conhecimento público destes documentos. Negociou-os secretamente e tentou fazê-los passar na Assembleia em Junho de 1984 a golpe, através de uma autorização legislativa limitada aos aspectos jurisdicionais, aduaneiros e fiscais. Estão ainda por esclarecer, e o Sr. Secretário de Estado não se encarregou agora de o fazer, as razões que levaram o Governo a tentar o golpe e depois a desistir dele. Claro que os tratados envolvem mais do que uma parte e não espanta que cada uma das partes vigie o comportamento da outra, designadamente verifique se foram cumpridos os procedimentos condicionadores da eficácia jurídica do tratado. É bom dizer, portanto, que mesmo um pequeno ou médio consultor jurídico explicaria ao embaixador Holmes o conteúdo do sistema constitucional português e, ao fim e ao cabo, que os tratados não podiam vigorar sem passarem pela Assembleia da República.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A segunda nota a sublinhar é a de que nos documentos em discussão não estão englobadas as matérias dos tratados militares com os Estados Unidos.

Não está na Assembleia o documento referente ao prazo, nem o documento sobre a instalação da estação de rastreio em Almodôvar, documentos sobre os quais existem meras trocas de notas, publicadas nos Diários da República, mas sem qualquer eficácia na ordem jurídica portuguesa.

A técnica do retalho pode convir aos Estados Unidos, mas a negociação foi conjunta, envolveu um conjunto organizado de questões, designadamente questões técnicas, militares, financeiras, laborais, logísticas, aduaneiras, fiscais e jurisdicionais. É esse tratado, esse complexo normativo com que o Governo pretende vincular o País, que continua a ser sonegado a esta Assembleia.

Srs. Deputados, o chamado acordo técnico é no seu conteúdo um escandaloso repositório de cedências, de novas cedências aos Estados Unidos.

Todos o dizem. Basta citar como já aqui foi feito, o Sr. Almirante Pereira d'Eça, chefe da delegação portuguesa nas negociações:

A renovação da presença americana nos Açores foi feita em termos de um alargamento das facilidades, quer em termos qualitativos quer em termos quantitativos, que se podem considerar significativos.

Aumentam-se as instalações na Terceira, São Miguel e Santa Maria, permite-se a utilização dos aeroportos do Faial, São Jorge e Graciosa, aumentam-se os depósitos de combustíveis, munições, explosivos e armamento, permite-se a utilização em todo o território nacional (incluindo o continental) de qualquer aeródromo civil ou militar, alargam-se as facilidades portuárias, alarga-se o número e a presença de militares americanos.

Dá-se, em suma, expressão à afirmação já feita de que «Portugal está vocacionado para se tornar um porta-aviões» ou como disse o Sr. Secretário de Estado uma plataforma aeronaval dos EUA, com funções específicas definidas pelos americanos e para servir interesses estratégicos dos americanos.

Importa recordar o sentido geral dessa função tal como consta do relatório oficial apresentado por Gaspar Weinberg ao Congresso dos EUA:

Ponte de passagem, reabastecimento e apoio polivalente para forças de intervenção, designadamente da Força de Intervenção Rápida e das novíssimas Divisões de Infantaria, naturalmente para operações na Europa, zona do Mediterrâneo e países árabes.

Porto de escala no quadro de uma ponte aérea (air lift) e de uma ponte marítima (sea lift);

Escala obrigatória dos aviões de intercepção e de ataque americanos enviados para a Europa do Sul e Central;

Base de apoio logístico da 2.ª Esquadra;

Plataforma aeronaval.

Está completamente de acordo com o Sr. Secretário de Estado. Foi tudo isto que o Governo negociou e quer aqui, à pressa, fazer aprovar.

As missões estratégicas definidas por este «acordo técnico» projectam-se para fora do território nacional e envolvem operações militares contra terceiros países, designadamente da Europa e do mundo árabe.

Portugal torna-se assim alvo e inimigo por força de operações militares dos EUA, operações militares em que Portugal não é parte, não é ouvido e não tem nenhum interesse.

E tudo isto com riscos tão acrescidos quanto, como tem sido abundantemente demonstrado, o tratado envolve necessariamente a utilização de armas nucleares.

O Ministro da Defesa Mota Pinto afirmava em começos de Fevereiro de 1984 que a proibição do trânsito dessas armas «seria contrária aos princípios da solidariedade que um país aliado da NATO deve manter».

Mais longe foi o comandante português na Base das Lajes que sobre o armazenamento de armas nucleares dizia: «Montadas não há. Mas se calhar os americanos têm os componentes». E acrescentava: É preciso ainda notar que em caso de conflito os EUA colocam aqui todo o material em apenas 12 horas.

Obviamente, Srs. Deputados, que se se pretendesse impedir o estacionamento e armazenamento de armas nucleares isso teria sido claramente expresso no tratado. A explicação para esta omissão deu-a em conferência de imprensa, George Shultz, quando interrogado sobre se há ou não armas nucleares nos Açores, respondeu, cândida, pura e simplesmente, que não podia dizer se sim, se não! Ou seja, podem estar ou podem não estar.

Quanto ao chamado «acordo laboral» é um escândalo inqualificável rejeitado pelos trabalhadores e de vigência incompatível com a ordem jurídico-constitucional portuguesa.

Não é difícil demonstrá-lo: o regime de contrato de trabalho que se pretende aplicar permite o despedimento individual sem justa causa; prevê a figura es-