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4344 I SÉRIE - NÚMERO 111

É óbvio que o princípio da separação de poderes está inserido na Constituição, não, aliás, nos termos clássicos deste mesmo princípio, mas em termos mais modernos, uma vez que se fala da separação e interdependência de poderes.
Ora, é óbvio que o Governo depende da Assembleia da República e por isso este órgão, entre os seus poderes, tem a faculdade de fiscalização da actividade do Governo. Mais ainda: no caso da comunicação social pertencente ao Estado ou a outras entidades públicas, a Constituição, ao definir um certo número de princípios por que esses órgãos devem pautar a sua actuação, criou um órgão constitucional para velar por esse cumprimento. E não foi, com certeza, por acaso que esse órgão constitucional ficou de certo modo na dependência da Assembleia da República, uma vez que é um órgão eleito por ela.
Parece-me portanto, Sr. Deputado Jorge Lacão, que salvo melhor entendimento, essa sua argumentação não tem razão de ser. Na resolução não se vai de modo nenhum invadir a esfera de competência do Governo. O que se refere é que, tendo havido uma comissão de inquérito que concluiu que esses princípios constitucionais, ou alguns deles eram grosseiramente violados pela televisão portuguesa, é urgente tomar medidas que ponham cobro a essa situação.
É isto que é o poder de fiscalização.
O que seria grave e, isso sim, violador do princípio da separação de poderes era se a Assembleia da República, através de uma resolução se pusesse a dizer que devia ser nomeado o senhor A, B ou C para a gestão da televisão ou que as políticas de pessoal e financeira deviam ser processadas desta, daquela ou daqueloutra maneira.
Não é isso que faz. O que a Assembleia da República faz é a constatação de que princípios gerais, que são princípios constitucionais, foram violados e emite um voto no sentido de que se tomem as medidas necessárias para fazer cessar esse estado de coisas.
Isto não pode de maneira nenhuma ser considerado uma violação das atribuições de outro orgão de soberania. Pelo contrário, é um exemplo claro de actuação da Assembleia da República dentro da esfera da sua competência. O caso da Comissão Eventual de Inquérito à Televisão, penso mesmo é um daqueles em que a Assembleia, de uma forma exemplar, usou os poderes de fiscalização que lhe são conferidos pela Constituição.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Deputado Luís Beiroco, a sua questão poderá certamente contribuir para clarificar melhor o meu pensamento.
Gostaria de dizer, como ponto prévio, que vai ser interessante, no futuro quando a próxima Assembleia da República vier a assumir poderes de revisão constitucional, saber qual o comportamento do CDS e do PSD perante uma questão, apresentada na fase da revisão constitucional pelo PS que, no passado, votaram contra e que é a de atribuir força vinculativa, aos pareceres do Conselho de Comunicação Social, sobre as nomeações dos directores dos departamentos de informação - seja na RDP, na RTP ou em qualquer outro orgão estatizado de comunicação social. Veremos, então, se os partidos que aqui aparecem a defender a independência relativamente aos poderes políticos vão, na altura, institucionalizar essa independência. No passado não o fizeram e por isso fica na expectativa de saber qual o seu comportamento futuro. Quanto à questão que me põe, devo dizer que não nego a hipótese, aliás tantas vezes praticada aqui na Assembleia da República, de esta tomar posição política sobre as mais diversas questões. Normalmente, quando o quer fazer, a Assembleia encontra, no período de antes da ordem do dia, a possibilidade de, através da votação de moções, tomar posições que têm o valor político que a cada caso cabe e que, portanto, permitem aos grupos parlamentares, que representam correntes de opinião, exprimir essas posições políticas.
Contudo, quando se trata de aprovar um projecto de resolução, que tem, nos termos constitucionais, o valor da prática de um acto próprio, de uma competência própria da Assembleia da República, o que nós vamos é aprovar uma resolução, que é suposto ter uma eficácia - e não fazer a aprovação de uma moção no período de antes da ordem do dia em que, se a Assembleia assim entendesse, poderia manifestar-se preocupada com isto e com aquilo, concretamente com a situação na RTP -,ou seja, que é concebida de acordo com uma competência própria e específica da Assembleia da República para poder ser eficaz.
Ora, há-de o Sr. Deputado Luís Beiroco convir que não é disso que se trata pela forma como esta resolução está concebida, forma esta que é completamente inepta para produzir qualquer tipo de eficácia. Isto porque, se o objectivo é o de que as medidas que genericamente se propõem venham a ser tomadas pela Assembleia, é sabido que esta não tem condições para tomar medidas a não ser tomar uma iniciativa legislativa que mude alguma coisa - e não está neste momento em condições de tomar essa iniciativa.
Se é para fazer uma recomendação ao Governo, isto é dê tal maneira surrealista que nem diz que tipo de recomendação é que quer que se faça ou que medida é que o Governo deve tomar, mas, em todo o caso, aí mantenho que a resolução não é a forma adequada de a Assembleia se pronunciar sobre isso.
Se é para fazer uma recomendação ao Conselho de Comunicação Social, não deixa de ser curioso que, nos termos da Constituição, tenha sido criado um Conselho de Comunicação Social para garantir a independência dos órgãos de comunicação social relativamente ao poder político portanto também ao poder político que está estabelecido na Assembleia da República, e que, por outro lado, a Assembleia da República se permitisse dar indicações, com força vinculativa, ao referido Conselho,' para que se comportasse de determinada maneira, o que seria um óbvio contra-senso relativamente à independência do Conselho de Comunicação Social.
Ora bem, isto significa que o projecto de resolução apresentado pelo MDP/CDE tem apenas um conteúdo panfletário - foi o que eu quis dizer à pouco - e que este conteúdo panfletário, institucionalmente, não dignifica a Assembleia da República. Este é o meu ponto de vista, Sr. Deputado, peço-lhe desculpa se não estiver de acordo comigo, mas, em todo o caso, permita-me que o mantenha.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Amaral.