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80 I SÉRIE - NÚMERO 4

O Sr. Presidente da Câmara terá razões para, como disse ao jornalista, sair de Amarante no dia em que uma máquina entrar no rio Tâmega para retirar uma única pedra? Certamente que sim! As pedras, que tanto dialogaram com Teixeira de Pascoaes, têm guardado silêncio, mas estão dispostas a falar e a arremessar acusações. É, na verdade, de fugir.
O Sr. Presidente da EDP, com os avisos públicos, andará a divertir-se aos sustos, a dizer «aí vai água», só para gargalhar com o prazer de assistir à hidrofobia da terra do vinho verde? Certamente que não! Seria brincadeira de muito mau gosto.
Sendo assim, então o assunto é sério, o desvairo segue sem travão, o volume de idiotices vai mesmo mergulhar a Ilha dos Amores, a Ínsula dos Frades, as azenhas, os açudes, os Moroleiros, e até abalar a ponte de São Gonçalo? Sem dúvida!
Teremos um afogamento sem nobreza, reles, sem respeito até pela Constituição, sem dó nem piedade de todo um enquadramento paisagístico, de um inestimável património artístico, histórico e cultural. E tudo está a ser feito com a frieza, com a insensibilidade, com a irresponsabilidade, com a imbecilidade dos que não cumprem a religiosidade dos povos, religiosidade essa feita de um entranhado amor à terra, donde emerge, forte e altaneiro, o tronco da democracia.
Saiba-se, Sr. Presidente, Srs. Deputados, que desfigurar Amarante é destruir a obra de Teixeira de Pascoaes, é nunca mais poder ver e compreender-se o universo do seu panteísmo, do seu misticismo, do seu mimetismo literário; é ficar sem saudades da Saudade.
Mutilar Amarante da sua alma e suporte é varrer da cultura portuguesa os nomes do abade de Jazente, António Cândido, António Carneiro, Amadeu de Sousa-Cardoso, Augusto Casimiro, Alfredo Brochado, Acácio Lino.
Mexer no corpo de Amarante é magoar Agustina Bessa-Luís e Alexandre Pinheiro Torres.
E como dói, Sr. Presidente e Srs. Deputados, saber que Amarante é apenas um bilhete-postal, que «o seu passado passou e que o seu presente agoniza» perante a nossa total indiferença!

Aplausos do PRD, do PS, do PCP, do CDS e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Junqueiro.

O Sr. Raul Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tenho tido a ocasião, por diversas vezes, de chamar a atenção da Assembleia da República para os problemas que mais afectam a Beira Alta e os diferentes concelhos que a integram.
Um desses concelhos, Tondela, tem sido objecto de particular atenção, não só porque contém dentro de si importantes capacidades e potencialidades de desenvolvimento, mas também porque apresenta em algumas das suas freguesias sinais evidentes de carências básicas de infra-estruturas.
Daí que venha procurando sensibilizar as entidades competentes, e nomeadamente o Governo, para a necessidade de avançar com alguns projectos considerados essenciais, quer na área das vias de comunicação, quer na área do turismo, quer na área da agricultura, quer na área do sistema educativo.
O próprio projecto de elevação a cidade da vila de Tondela, subscrito pelo PSD e pelo PS, tem de ser entendido não só como uma aposta séria das populações e das actividades económicas da região, mas também como um desafio lançado ao Executivo no sentido de se empenhar na modificação das condições de vida no interior do País, assumindo com determinação o apoio ao seu desenvolvimento e modernização.
A serra do Caramulo, com características específicas, constitui um dos pólos de maior potencialidade do concelho de Tondela, mas apresenta, ao mesmo tempo, carências graves a requerer urgente atenção e tratamento.
A localidade do Caramulo, pertencente à freguesia do Guardão, atravessa dificuldades que são típicas de uma zona em crise.
«Apadrinhada» durante várias décadas por uma conhecida família aí instalada, vivendo do grande movimento provocado pela existência de bons sanatórios, o Caramulo conheceu um razoável desenvolvimento, nomeadamente turístico.
Aproveitando, por um lado, as excelentes condições ambientais e, por outro lado, o dinamismo de alguns dos seus habitantes, foi possível crescer e criar riqueza.
Surgiram novos sanatórios, investimentos em novas actividades económicas como, por exemplo, a agricultura, e, ao mesmo tempo, realizações significativas de carácter cultural, com destaque para o Museu do Caramulo.
No entanto, a evolução dos tempos demonstrou que tais iniciativas, embora tivessem revelado aspectos positivos, geraram também uma excessiva concentração de poder económico e político.
O reconhecimento da importância de um certo processo de desenvolvimento verificado especialmente nas décadas de 60 e 70 não chegou para ocultar os inconvenientes da crescente estrutura neofeudal e, sobretudo, das cada vez maiores assimetrias sociais e económicas locais.
A democratização da sociedade que a Revolução de Abril trouxe consigo, constituindo um factor de esperança, deparou, talvez por isso mesmo, com incompreensões e intolerâncias.
No caso do Caramulo, a entrada em funcionamento de órgãos autárquicos democráticos, livremente eleitos pela população, originou uma modificação profunda na estrutura do poder político.
À sua frente surgiram homens identificados com os anseios do povo, desejosos de lutarem unidos pelo progresso da região e pela melhoria das condições de vida.
Esta modificação tinha de gerar, como gerou, choques com o antigo sistema.
Rapidamente surgiram as dificuldades, agravadas com a progressiva desactivação dos sanatórios, por desnecessários em tão grande quantidade.
O poder económico deixou de colaborar com o poder político, as novas iniciativas nunca passaram de promessas, os despedimentos, com destaque para os elementos socialmente mais activos, sucederam-se.
E até as realizações que tinham sido levadas a cabo no passado começaram a ver a sua continuidade posta em dúvida.
Dir-se-ia que, contra os autarcas livremente eleitos pelo povo, se conjugaram as adversidades naturais com as adversidades artificiais que alguns teimosamente insistiram em criar.
Dir-se-ia, no fundo, que se tentou demonstrar a «excelência» dos bons velhos tempos, nem que para tal fosse preciso destruir aquilo que durante tantos anos levou a construir.