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14 DE NOVEMBRO DE 1986 245

à habitação, por forma a permitir uma política de habitação adequada», já que o diploma anterior, ou seja, o Decreto-Lei n.º 459/83, se encontrava unicamente adaptado, passo a citar, «à situação macroeconómica recessiva que então se vivia».
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que inovação foi essa que o novo decreto trouxe?
Tome-se como exemplo o caso das bonificações: enquanto no regime anterior (o tal que se adequava ao tempo das vacas magras) a classe mais bonificada e necessitada era contemplada com 9,5%, agora é com 8,6% (baixou); a classe imediatamente a seguir tinha 6,5% de bonificação, tal como agora; a seguinte 4,5%, enquanto presentemente tem 4,3%, e a última, portanto das mais privilegiadas, 1,5%, tendo passado agora para 2,5%.
Isto, traduzido em termos de dinheiro, quer dizer, enquanto no regime anterior a classe mais bonificada (por ser a economicamente mais desfavorecida) pagava por cada 1000 contos de empréstimo 3107$ mensais no 1.º ano e 57 569$ no 25.º ano, agora que, volto a repetir, estamos em tempo de vacas gordas, vai pagar mais: 3824S40 no 1.º ano e 63 254$ no 25.º ano.
É então este o modo como o actual governo ajuda as classes necessitadas? É esta a inovação que trouxe? A adequação do regime de crédito à habitação à conjuntura económica favorável?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: não se ficam por aqui as inovações introduzidas pelo diploma para. como o Governo diz, beneficiar o povo português. E que existem atitudes que inevitavelmente nos levam a pensar, uma de duas:

Ou os actuais governantes pretendem unicamente promover a sua imagem através de medidas legislativas, não realistas mas demagógicas, bem exploradas em alguns órgãos da comunicação social, em especial na Televisão;
Ou os actuais governantes estão deliberadamente a adiar o problema habitacional do País.
Com efeito, que outra explicação se pode encontrar para o facto de, em simultâneo, se falar na descida da inflação e no plafond de aumento salarial de 9% (em negociação no Conselho de Concertação Social) e, repito, em simultâneo, se publicar um diploma como este a que nos estamos a referir, em que os aumentos das prestações anuais chegam aos 11,8% no 1.º ano e a 17,8% no 2.º ano. O que quer dizer que o Governo não acredita na descida da inflação ou, então, que pretende agravar a situação dos trabalhadores dando-lhes 9% de aumento salarial & aumentando-os em 11,8% no 1.º ano e em 17,8% do aumento anual de renda no 2.º ano. Então, por que razão afirma o Sr. Ministro, em entrevista ao jornal Urbanismo e Construção, de 6 de Outubro, que, e passo a citar, «é necessário compatibilizar a progressividade das prestações financeiras decorrentes dos empréstimos com a política de actualização de rendimentos das famílias, sem o que ocorrem, naturalmente, dificuldades acrescidas na solvência de muitos dos que recorrem ao crédito»?
Durante largos meses esteve paralisado o regime da «poupança-habitação», impossibilitando não só a compra de casa a muitos portugueses, como agravando o sector da construção civil. Por isso no 1.º trimestre de 1986 o número de licenças para construção diminuiu 12,8%, percentagem que vai aumentar, sem dúvida, porque não são tomadas quaisquer medidas para viabilizar a indústria da construção civil, a qual ainda recentemente viu a situação seriamente agravada com a aplicação do IVA, que, necessariamente, gera aumento dos custos de produção, sem que o Governo se importe minimamente com o assunto.
E que dizer do tão apregoado crédito bonificado para os jovens?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já não digo que perguntem aos jovens, mas pergunto: de que tipo de crédito se trata? Em que é que ele se distingue do outro? Passo a explicar: no 1.º e 2.º anos de amortização do empréstimo tanto faz ser jovem como não, porque o montante das prestações é o mesmo; a partir do 3.º ano os jovens pagam menos 200$ por mês. Não sei bem porquê, mas não consigo deixar de pensar num poema da poetisa Sophia de Mello Breyner, em que ela diz que «o demagogo diz da verdade a metade».
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mais podia ser dito a propósito do exemplar Decreto-Lei n.º 328-B/86, de 30 de Setembro, que é mais uma prova inequívoca da ausência de coerência da política em geral e da inexistência de um programa globalizante de política habitacional. Nove meses esteve o Governo para publicar o regime de crédito à habitação, pouco se importando que os processos de pedido de empréstimo se fossem acumulando aos milhares nas instituições de crédito durante longos meses. Entre Janeiro e Abril do corrente ano o crescimento do número de pedidos foi de 122%, enquanto o número de contratos celebrados apenas aumentou 11%. Por que é que o Governo deixa chegar a situação a este ponto, tendo o Secretário de Estado da Habitação sido obrigado a reconhecer já perante a Televisão que para solucionar os pedidos de crédito atrasados em três meses seria necessário que não entrassem mais pedidos?
A explicação para tudo isto está, repito, na inexistência de uma política de habitação ajustada à realidade. O que é que o Governo já fez para desenvolver a habitação social? Nada. Não serão as situações de economia favorável, como a actual, as mais indicadas para se intensificar a construção social e solucionar os problemas daqueles que nem ao crédito bonificado podem recorrer, os chamados indigentes e insolventes?
O que é que o Governo já fez em matéria de intensificação da autoconstrução e do regime de construção evolutiva ou de auto-acabamento? Nada. E quanto à recuperação de zonas históricas e zonas degradadas, e quanto ao sector das cooperativas de habitação, que fez o Governo? O Governo parece ignorar a importância deste sector para a resolução do problema da habitação, sobretudo no que se refere às camadas populacionais mais desfavorecidas. As cooperativas de habitação são, com efeito, as entidades mais vocacionadas e com maior experiência na construção de habitação social, foram já responsáveis pela construção de mais de 20 000 fogos e, se forem apoiadas, os resultados que delas se podem esperar serão progressivamente mais compensadores. Só que o actual governo não vê ou não quer ver esta realidade e, antes pelo contrário, parece apostado em seguir uma política de destruição do cooperativismo em Portugal; segundo afirmação dos responsáveis pela FENACHE, o Governo extorquiu às cooperativas, através do IVA, cerca de 1 milhão de contos e não foi capaz de pôr em prática soluções para a regularização das contas das cooperativas com o ex-Fundo de Fomento da Habitação nem de conceder financiamentos a infra-estruturas já aprovadas anteriormente.