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20 DE NOVEMBRO DE 1986 399

Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em Portugal, embora o crescimento do peso das despesas públicas no PIB tenha sido enorme, a parte relativa às despesas correntes da Segurança Social subiu muito menos espectacularmente, até porque convém não esquecer que no início da década de 70 a situação da protecção social no nosso país estava praticamente próxima da estaca zero. Foi um dos legados do salazarismo.
Hoje, continuamos com pensões mínimas muito afastadas dos salários mínimos, em grande parte dos subsistemas económicos com pensões médias muito injustas para quem, com uma vida activa de trabalho e contribuições, foi logo à partida castigado pela metodologia que a lei impõe, sobretudo em períodos de forte inflação. Hoje, num contexto de grande desemprego, nem 20 % do total dos que estão nessa situação têm acesso a qualquer subsídio. Hoje, em Portugal, prestações como o abono de família, para além da injustiça relativa da sua aplicação universal com o mesmo quantitativo por descendente, mesmo para quem dele não precisa, atingiram tamanha degradação que deixaram de desempenhar qualquer função de utilidade significativa.
Temos, no nosso país, um sistema de segurança social incipiente, com grandes limitações no que se refere às condições de acesso, duração ou valor de múltiplas prestações.
Queixa-se o Governo, na proposta de lei das Grandes Opções do Plano a médio prazo, de que as prestações sociais pecuniárias já consomem uma parte significativa do PIB. Isso é verdade, mas só meia verdade, já que esse indicador comparado com a CEE, onde nos integramos, é extremamente baixo, o mesmo acontecendo em relação a países com nível de desenvolvimento semelhante ao nosso. E isto não acontece com outras despesas públicas.
Se há que aliviar o peso das despesas públicas totais na nossa economia, se há que criar condições para o desenvolvimento da iniciativa económica e da inovação social, isso significa que há que optar politicamente na afectação dos recursos financeiros disponíveis. E estrangular o sistema de segurança social revelaria uma clara opção de classe, em que a máscara da falsa modernidade apenas poderia servir para iludir incautos.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O ataque ao Estado-providência em Portugal, como se ele existisse, como se no nosso país houvesse «excessos de socialização das responsabilidades face aos riscos da existência» ou «crescimento desmesurado do sistema estatal de segurança social», é uma revelação prática da má vontade do Governo relativamente aos fracos direitos sociais dos trabalhadores e do conjunto da população portuguesa.
Na proposta de lei das Grandes Opções do Plano a médio prazo, o Governo afirma como um dos seus grandes objectivos a transferência para fora dos serviços oficiais de uma parte cada vez maior das responsabilidades, favorecendo, quer fiscal, quer institucionalmente, a procura e a oferta de esquemas de cobertura dos riscos colectivos fora dos regimes públicos. Por outro lado, afirma que o sistema de segurança social português deverá evoluir para uma cobertura tripartida com três patamares.
No primeiro patamar, assistencial, haveria prestações universais tendencialmente sujeitas a condições de recursos, sem base contributiva, de modo a assegurar a toda a população um valor mínimo; a intervenção do Estado

aqui é definida como «igualitária e primorosa», mas não deixa de se afirmar o objectivo de incentivo às misericórdias.
No segundo patamar, a base seria o seguro social obrigatório sobre as remunerações até determinado plafond, e as prestações de base contributiva seriam concedidas em substituição dos rendimentos perdidos por riscos sociais (doença, invalidez, acidentes de trabalho, doenças profissionais, morte, viuvez, desemprego, constituem as situações enumeradas); aqui o papel do Estado seria «equitativo e regulador».
No terceiro patamar, as prestações seriam concedidas através de esquemas de segurança voluntária ou colectiva. É aqui que são referidas as pensões, afirmando-se que a evolução deve avançar no sentido da sua capitalização. Neste patamar, para onde sistematicamente o Governo propõe que se deva evoluir, o Estado assumiria uma atitude «liberal e desinteressada».
Em resumo, um primeiro patamar de assistência social, um segundo de seguro social obrigatório, um terceiro de seguro livre privado. Se vingasse esta proposta, regressaríamos ao «atestado de pobreza» como instrumento de regulação social indispensável. Os necessitados (primeiro patamar) teriam de estender a mão, em massa, à porta das instituições em boa parte privadas e de caridade. Em lugar de um direito que hoje podem reivindicar, passariam a pedir esmola.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Muito bem!

O Orador: - O que as Grandes Opções do Plano a médio prazo nos ensinam é que o Governo tudo fará para que, assim que puder e ainda por cima em nome da dimensão humana e do sentido da fraternidade, a Segurança Social deixe de ser um direito humano básico, forma de materialização da solidariedade nacional e expressão da capacidade reguladora do Estado democrático, e passe a constituir principalmente uma base de arranque de grupos financeiros e de reforço da influência cultural, política e social de instituições privadas assistenciais e seus aparelhos ideológicos de suporte.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em Setembro passado, o Governo levou a cabo uma grande operação de propaganda com o aumento das pensões mínimas. Como a seu tempo afirmámos, e hoje reiteramos, medidas que pudessem contribuir para minorar a gravidade da situação de parte substancial dos pensionistas, mesmo que insuficientes e parciais, eram bem-vindas. É um facto que elas foram insuficientes, já que, segundo números do próprio Governo, não representavam, para 1987, mais do que um aumento médio de 50$ por dia por pensionista abrangido; é um facto que foram parciais, pois os aumentos não beneficiaram uma boa parte dos pensionistas, sobretudo no regime contributivo. Mais concretamente, e segundos dados governamentais, dos 850 000 pensionistas de invalidez e velhice do regime geral, cerca de 60 % não foram abrangidos e, dos que foram, enquanto menos de 50 000 tiveram aumentos superiores a 3000$ mensais, mais de 200 000 tiveram aumentos inferiores a 1000$. Dos 1 250 000 pensionistas que o Governo afirma terem sido aumentados, só 13 % alcançaram aumentos mensais superiores a 2000$, enquanto quase metade (46 %) teve melhorias mensais inferiores a 1000$.