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5 DE DEZEMBRO DE 1986 735

visões das receitas de impostos dado o seu carácter técnico e o facto de serem meras previsões; o que interessa em termos de efeitos não são as previsões mas as receitas efectivas, as quais dependem da incidência, das taxas, das isenções, das deduções.
O mesmo se pode dizer em relação às despesas que resultam de contrato, como os juros da dívida pública - não é, como é óbvio, o montante elevado da previsão que vai fazer com que o Estado pague juros diferentes daqueles que são devidos.

O Sr. José Magalhães (PCP): - É evidente!

O Orador: - Mas se a votação do Orçamento cabe à Assembleia da República, a competência para o executar cabe inteiramente ao Governo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. José Magalhães (PCP): - Inteiramente, não! Disse-o o Tribunal Constitucional.

O Orador: - Srs. Deputados, não podia deixar de ser assim, pois o Governo é o órgão superior da Administração Pública.
Na revisão da Constituição de 1982 desapareceu de entre as competências do Governo a da elaboração do Orçamento, mas permaneceu, muito claramente, na alínea b) do artigo 202.º a competência de fazer executar o Orçamento como uma das que lhe são exclusivas - competência administrativa, como diz a Constituição. Na nossa época, Srs. Deputados, no nosso século, segundo os fundamentos da nossa organização social e política, a nenhum outro órgão de soberania, a não ser ao Governo, podia caber a competência em matéria de execução do Orçamento. Aliás, se é o Governo que é julgado pelo Tribunal de Contas pela execução, como poderia aceitar-se que fosse outro órgão de soberania a determinar a execução do Orçamento? Não são os Srs. Deputados, não é a Assembleia da República, não é o Sr. Presidente da República que é julgado pelo Tribunal de Contas pela execução do Orçamento, é a administração, e no topo da administração está o Governo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - As despesas contidas no Orçamento só podem ser realizadas desde que obedeçam aos requisitos legais e haja justificação prévia da sua eficácia, eficiência e pertinência económica e social.
Durante a execução é ao Governo, com a Direcção-Geral da Contabilidade Pública, que compete verificar a legalidade e a rentabilidade económica e social das despesas, isto para além do papel atribuído ao Tribunal de Contas no que se refere a despesas que exijam visto.
Diz a lei que a execução do Orçamento deve obter a maior utilidade e rendimento sociais com o mais baixo custo.
O Governo tem, assim, de ser muito exigente em relação às despesas do Estado. Não há lei que possa obrigar um governo a fazer despesas que ele considera um desperdício ou obrigá-lo a deitar dinheiro à rua.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Como podia se de outra forma se, como disse há pouco, é a administração que tem de responder perante o Tribunal de Contas? Repito, não é a Assembleia da República, não é o Sr. Presidente da República, é o Governo.
A Assembleia da República só a posteriori realiza o controle da execução, apreciando e votando a conta geral do Estado, precedendo um parecer do Tribunal de Contas. Para deixar de ser assim ter-se-ia primeiro de mudar a Constituição e, depois, fazer uma revolução do nosso sistema financeiro retirando a Direcção-Geral da Contabilidade Pública e suas delegações da dependência do Governo e passando-a para outro orgão de soberania.

Uma voz do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas, Srs. Deputados, se chegássemos a isso, então já estaríamos numa fase muito avançada de degradação das nossas instituições democráticas.

Aplausos do PSD.

O Orador: - Já não estaríamos no mesmo sistema de governo, já estaríamos, até, noutro regime político. Por isso, o Governo não prescinde da sua competência de executar o Orçamento.
Não pretendemos de modo algum, Sr. Presidente e Srs. Deputados, dar lições a quem quer que seja. Mas que não se ignore com simples retóricas, mais ou menos inflamadas, a gravidade que representa o simples facto de terem de se abordar questões tão básicas e tão melindrosas.
Algo não está bem num país quando estes temas se tornam motivo de debate. Como Primeiro-Ministro, mas também como cidadão crente nos princípios que regem o estado democrático de direito, não posso deixar de expressar a minha preocupação, preocupação que estou certo será partilhada a todos os níveis, órgãos de soberania e opinião pública.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quem leu lições de finanças públicas, entre elas as do professor Teixeira Ribeiro, sabe que tudo isto são verdades elementares mas de grande importância, não podendo ser esquecidas nem postas em causa por razões políticas conjunturais, como a existência de um governo sem apoio maioritário na Assembleia da República.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O conjunto destas verdades constitui um dos pilares das instituições democráticas. E, sabem--no todos, são assuntos que não se discutem.

A história mostra, aliás, que essas instituições democráticas saem sempre mal tratadas das tentativas excessivas e injustificadas de parlamentarização do Orçamento.
A evolução do direito financeiro na década de 1974-1984 mereceu do ilustre professor citado atrás, num artigo publicado em 1985, a qualificação de «muito positiva».
Sobre a qualificação que a evolução do direito financeiro português de 1984 a 1989 irá merecer, têm os Srs. Deputados uma responsabilidade muito particular.