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17 DE DEZEMBRO DE 1986 973

Há que distinguir a liberdade de expressão dos meios legítimos para a utilizar e não arredamos que se venha a legislar nesse domínio, embora desde já diga que nos parece que o projecto de lei apresentado pelo PSD não é adequado a prosseguir esses objectivos porque quase que parte do inverso, ou seja, passa a ser tudo proibido, excepto o que as câmaras permitam, o que, além de poder conformar uma inconstitucionalidade orgânica, levanta problemas de outra ordem.
Seja como for, esta é matéria para a discussão do fundo da questão. Por isso - repito - subscrevemos por inteiro as conclusões do parecer da Comissão e, no essencial, a análise que às mesmas conclusões remete.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O problema subjacente ao projecto de lei apresentado pelo PSD é seguramente uma matéria que a todos preocupa e para a qual não deixaremos de querer concorrer, para que se ponha fim a alguns manifestos abusos que têm havido no que diz respeito à utilização indevida ou mesmo ao abuso de direitos, em matéria de afixação de cartazes ou outras formas de propaganda.
Todavia, reconhecer este problema não implica necessariamente que se esteja de acordo com algumas das soluções apresentadas no projecto de lei do PSD. O que importa é perguntar se, vivendo como queremos viver num Estado de direito, não deveremos adequar as medidas legislativas que propomos justamente aos princípios constitucionais.
Ora, o que é duvidoso é o facto de o projecto de lei apresentado pelo PSD estar integralmente de acordo com esses mesmos princípios constitucionais. Desde logo, porque faz depender das câmaras municipais licenciamentos, ou seja, despachos com a natureza de acto administrativo para o exercício da actividade de propaganda política. E poder-nos-emos perguntar se estes actos administrativos que precedem o exercício da actividade de propaganda não poderão, virtualmente, condicionar o próprio direito de expressão. Esta é uma matéria manifestamente mal acautelada no projecto de lei do PSD. Por isso, em nome de remediar um mal, não queremos vir a criar um outro mal por não termos sido capazes de criar o instrumento jurídico adequado.
Por outro lado, intenta-se às câmaras municipais a possibilidade de elas estabelecerem regulamentos para o exercício desse tipo de actividades. Será que estaremos exclusivamente em matéria de regulamentos com carácter regulamentar ou estaremos a permitir às câmaras municipais, por via da lei ordinária, que estes regulamentos venham a impor restrições ao exercício de direitos? Sabemos que o exercício de direitos, liberdades e garantias faz parte do domínio reservado da lei e, por isso, nesta matéria temos que ter as maiores cautelas, aliás, de acordo com boa doutrina que já foi expendida a propósito pelo Tribunal Constitucional.
Por outro lado, o projecto de lei apresentado pelo PSD visa criar um ilícito de mera ordenação social. Ora, o que se diz no parecer apresentado é uma chamada de atenção para o n.º 3 do artigo 37.º da Constituição da República, nos termos do qual se afirma que «as infracções cometidas no exercício destes direitos [...]» - justamente o direito de exprimir e divulgar livremente o pensamento - «[...] ficam submetidas aos princípios gerais de direito criminal, sendo a sua apreciação da competência dos tribunais judiciais».
Ora, se a Constituição quis dizer que tais infracções ficavam submetidas aos princípios gerais de direito criminal, o que seguramente quis dizer é que não poderia haver sanções de natureza administrativa que por outra via viessem a criar um sistema de co-actividade, que a Constituição não quis prever, dando aos tribunais, como entidade e órgão de soberania independente, a completa jurisdição na avaliação dessas infracções.
Portanto, são matérias que pela sua natureza bastante sensível impõem uma larga reflexão a esta Câmara. Foi isto que se quis aduzir no parecer apresentado e aprovado na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
É de acordo com este parecer e com as preocupações aqui expendidas que, na matéria de fundo, o PS irá orientar a sua posição de voto. Por agora basta que esta reflexão aqui fique definida de maneira que não haja aproveitamentos demagógicos acerca de uma matéria que deve ser tratada com ponderação e com ponderação deve ser deliberada por esta Câmara.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, uma vez que não há mais inscrições, dou o debate por encerrado, pelo que, de imediato, vai ser submetido à votação o parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre o pedido de impugnação da admissibilidade do projecto de lei n.º 308/IV, apresentado pelo PCP e pelo MDP/CDE.
Creio não ser necessário lê-lo agora, uma vez que já foi lido no início do debate.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Para formular uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi para poder fazer esta declaração que o CDS não usou da palavra para uma intervenção prévia. Já quando esta iniciativa legislativa foi apresentada pelo PSD, achámos que a intenção era louvável e continuamos a considerá-la tão louvável que o CDS a acompanha agora, pois não se pode permitir que o abuso de liberdade de expressão, até de práticas antijurídicas e anticonstitucionais, seja consagrado em nome da Constituição.
Aliás, há uma votação desta Assembleia, como órgão institucional que é, que considerou como não inconstitucional o projecto de lei apresentado pelo PSD. Foi a maioria PS/PSD, a maior maioria de sempre, que aqui fez passar, por não inconstitucional, esse projecto. Tanto bastaria para que esta impugnação não surtisse qualquer efeito, pois a Assembleia da República não pode hoje dizer uma coisa para amanhã vir dizer o contrário sobre o mesmo preceito constitucional.
Temos de respeitar as votações já realizadas nesta Assembleia sobre a mesma matéria e por isso mesmo nos congratulamos que todos os partidos, mesmo aqueles que votaram contra o parecer na anterior legislatura, o tenham, agora, votado a favor.
Naturalmente que o nosso voto processual nada tem a ver com a bondade de todas as soluções propostas pelo PSD nesta matéria.