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1006 I SÉRIE - NÚMERO 23

Mas consideramos lesivo do interesse nacional que o Governo não tenham aproveitado o reforço do poder negocial, obtido com as negociações do Acto Único, para renegociar os aspectos mais lesivos dos acordos com a CEE e que apareça aqui com factos consumados.
Não é com a propaganda, com a falta ou falsas informações que o Governo anula as consequências da adesão e a sua acção no Conselho.
O Governo sabe que a Assembleia da República desconhece ainda qual a contribuição financeira deste ano de Portugal para a CEE - ainda hoje isso foi aqui perguntado e não obtivemos resposta. Sabe que o saldo que tem apresentado entre recebimentos e pagamentos é bem inferior àquele que apresentou no Orçamento de 1986 e que tem anunciado oficialmente. Sabe que as autarquias, até Outubro, dos 7 milhões anunciados pelo Governo só tinham recebido l milhão.
O Governo não desconhece que os produtores de tomate viram apodrecer na terra uma boa parte da sua colheita, que, passado um ano, não há qualquer decisão sobre a expansão e modernização da siderurgia, enquanto cerca de 40 milhões de contos de maquinaria se encontra encaixotada a deteriorar-se.
O Governo sabe, por exemplo, que empresas produtoras de estanho (neo-estanho) viram os seus resultados, com a adesão, passarem de positivos a negativos, que a indústria electrónica se encontra em dificuldades, que cerca de 90% das empresas portuguesas de calçado começam a defrontar-se, mesmo a nível interno, com a concorrência estrangeira, que, segundo o representante do IAPME1 no Algarve, com a adesão, a indústria conserveira algarvia poderá extinguir--se a curto prazo.
O Governo devia ter consciência de que, ao nada propor para as embarcações de pesca com menos de 9 m, está a impedir qualquer hipótese de financiamento pela CEE em relação à pesca artesanal, que a negociação do acordo multifibras vai criar maiores dificuldades aos exportadores têxteis, tendo perdido uma boa ocasião para pôr em causa o regime de quotas a que se encontra submetida esta indústria.
O Governo não desconhece também que neste primeiro ano de adesão se agravou o défice comercial com a Espanha e com a CEE. Mas, apesar de tudo isto, o Governo aparece aqui irresponsavelmente sem explicações convincentes e pedindo urgência.
Ora, com o Acto Único, a CEE que Portugal encontrará após o período transitório não será a mesma que existia no momento da celebração do Tratado de Adesão. A construção do «grande mercado» colocará ainda mais graves problemas a uma economia atrasada como a portuguesa e as disposições de carácter institucional serão de aplicação imediata.
Não haja dúvidas de que a aplicação das teses ultraliberais que inspiram o Acto Único não visa defender os «pequenos países» da Comunidade, mas são sim uma defesa dos «grandes países» da Comunidade a 10 face ao alargamento.
Por isso, é nosso entendimento que a ratificação do Acto Único deveria ser pelo menos acompanhada de uma declaração complementar, sob a forma de projecto de resolução, que enquadrasse a interpretação e o entendimento da AR, não só quanto ao alcance e significado de algumas disposições, como vinculasse o Governo à prestação atempada das informações necessárias quanto ao processo da sua aplicação.
Nós continuamos a pensar que a defesa do interesse nacional é ditada pelo povo português e não pela «Europa de Bruxelas».
Para nós a soberania nacional é indivisível e a independência nacional é inalienável.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a fim de conjugarmos os interesses da Assembleia com os do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, que tem de se ausentar dentro de alguns momentos, vamos interromper os nossos trabalhos, ficando com a palavra reservada o Sr. Deputado Adriano Moreira.
Está, pois, suspensa a sessão.

Eram 12 horas e 50 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 30 minutos.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.

O Sr. Adriano Morara (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Enquanto decorriam os trabalhos sobre a ratificação do Acto Único Europeu, fui recordando as palavras amargas que Ortega escreveu em 1952, quando lhe parecia já evidente que a Europa estava a perder a função directora do Mundo em que lhe aconteceu a ele viver: «se o europeu se habitua a não mandar, bastará geração e meia para que o velho continente, e atrás dele o mundo inteiro, caia na inércia moral, na esterilidade intelectual e na barbárie total». Abstraindo da violência do estilo que brotava da angústia pessoal, a lucidez do escritor mostrava a consciência aguda de que uma estrutura mundial tinha desabado sem projecto de substituição, que dificilmente seriam absorvidos os marginalismos consequentes, e que a maneira de ser Europa, que conhecera e vivera, tinha chegado ao fim. Mas um fim, tantas vezes repetido, de apenas um sistema político e não o desastre definitivo de uma cultura nem da capacidade de produzir novos desígnios, nem da vontade de reorganizar o convívio dos seus povos, e destes com o mundo que descobrira, que unificara, que tinha governado, e que finalmente a desafiava, obrigando-a a reencontrar-se e a definir uma nova maneira de estar no mundo. O Acto Único Europeu, que motivou este debate, é um passo numa marcha que ainda será longa, porque ele não abrange a Europa toda, não inclui toda aquela que corresponde à definição de valores que proclama, nem aquela que está violentamente impedida de proclamar os mesmos valores. A nova maneira de ser Europa está longe de uma definição, e por isso mais devemos reverenciar a coragem dos que não desistiram quando tudo parecia perdido, aproveitando o seu realismo para avaliar os resultados conseguidos. Nesta avaliação parece que devemos distinguir aquilo que respeita às Comunidades, que vão constituindo a sua estrutura com experiência e prudência, e aquilo que diz respeito a Portugal, como País que enfrenta uma experiência nova. É nesta perspectiva que o debate aqui iniciado deve alargar-se a um debate nacional, já que o acidentado percurso da adesão portuguesa foi dominado por exigências políticas que não deram espaço e tempo às reflexões que este debate deve ter a ambição de