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1008 I SÉRIE - NÚMERO 23

tivo que vigia de cima do Muro de Berlim. E não poderá ser eliminado sem aceitar, com Raymond Barre, que «a oportunidade da Europa é a lucidez, o trabalho e a vontade dos europeus». O voluntarismo político, sem o qual nenhum outro factor é mobilizável, mas que realmente se reconhece dificilmente para além da cortina de palavras em que se transformou o mais espesso discurso político europeu de todos os tempos.
É acreditando na permanência da paz, única garantia de que o factor tempo não faltará ao voluntarismo europeu, que pode incentivar-se a campanha no sentido de restabelecer a confiança, sem a qual a Europa não conseguirá, como necessita, harmonizar as políticas de defesa, tornar coerentes as políticas externas, assegurar que não perderá ao menos o segundo lugar nas áreas económicas e geográficas. Porque potência europeia, só existe na ficção estatística que não tem dificuldade em arrumar as partes num conjunto, faltando-lhe sempre que as vontades políticas estejam de acordo. E estas não convergiram, até hoje, no sentido de considerar globalmente o desafio económico, de considerar globalmente o interesse dos povos que habitam um território realmente definido pela decisão e acção de poderes exteriores. A consciência de ser um reduto, uma cidadela acossada, a Roma que foi obrigada a recolher as legiões sem previamente o ter decidido, não se desenvolveu suficientemente no sentido de permitir que coordenação substitue a anarquia em que se afundou, em duas guerras civis chamadas mundiais, a autoridade com que a Europa falou ao mundo durante séculos. Esperamos que o Acto Único marque um ponto de viragem.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Gama.

O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na ocasião em que se procedeu ao debate preliminar sobre o Acto Único Europeu, e que precedeu a sua assinatura pelo Governo, o PS deixou bem claro o seu apoio às reformas introduzidas no funcionamento das Comunidades Europeias. A nossa posição não variou e, por isso, iremos votar favoravelmente a sua aprovação.
O Acto Único alarga as competência das Comunidades em matérias tão significativas como o mercado interno, a capacidade monetária, a política social, a coesão económica e social, a investigação, o desenvolvimento tecnológico e o ambiente. A cooperação política europeia reforça-se significativamente. O Parlamento Europeu e a Comissão vêem os seus poderes alargados. O sistema decisório dos órgãos comunitários liberta-se de alguns entraves que o bloqueavam. Trata-se de um aperfeiçoamento de claro sentido positivo.
Não é, porém, agora ocasião para repetir o que ficou dito no debate de 7 de Fevereiro de 1986. Para além do sentido que as alterações implicam, e que para muitos é ainda redutor de uma autêntica União Europeia, afigura-se-nos estarem adequadamente salvaguardados mecanismos para contemplar interesses vitais da economia portuguesa na fase inicial da integração, nomeadamente no que respeita à construção do mercado interno e ao papel acrescido dos fundos estruturais na coesão económica e social das Comunidades.
A elaboração do Acto Único foi um processo paralelo à decisão de alargamento, visto, aliás, por alguns como medida cautelar face ao recurso abusivo ao veto por parte de alguns Estados membros. As resistências a vencer na negociação do novo tratado vieram igualmente testar os dois novos aderentes quanto ao seu posicionamento europeu. Salvaguardando os seus interesses essenciais e uma vez assinado o documento, que não derroga o período transitório previsto no Tratado de Adesão, Portugal não teria qualquer vantagem em atrasar o processo de aprovação e ratificação, isolando--se entre os novos membros e colocando-se eventualmente no grupo dos retardatários do processo de união europeia. Várias vezes o PS chamou a atenção para este ponto e lamenta profundamente que só agora o Governo tenha trazido o assunto à Assembleia da República. Inutilmente, sem a menor inserção em qualquer estratégia diplomática consistente, acabámos por erosionar um capital importante junto dos nossos parceiros comunitários.
Qual a razão deste facto? Será o avivar do preconceito antieuropeu da campanha eleitoral do PSD em 1985, a sua investida contra a integração e a defesa, não cumprida, da renegociação da adesão? Será a consequência de, por interferência do PSD, se ter bloqueado a estruturação dos adequados mecanismos de ligação às Comunidades desde a assinatura do Tratado de Adesão até 31 de Dezembro de 1985, data de publicação da orgânica da Direcção-Geral das Comunidades Europeias e da reestruturação do Ministério dos Negócios Estrangeiros? Será por, apesar de criados na legislação, tais organismos ainda não se encontrarem em funcionamento pleno? Será por se ter partidarizado a nomeação dos altos funcionários para as Comunidades? Ou será porque o Governo, assente numa solução política extremamente frágil e minoritária, não tem a capacidade para enfrentar com segurança o desafio do ajustamento estrutural necessário à entrada de Portugal na Europa? Assustado com um ritmo mais acelerado no que respeita à edificação do mercado interno e ignorando os méritos resultantes do reforço do papel dos fundos estruturais, bem como da cooperação política europeia, o Governo padeceu de um complexo neoproteccionista no que respeita ao momento de escolha para aprovação e ratificação do Acto Único, colocando Portugal na faixa menos Europeísta dos membros das Comunidades. Um erro diplomático que afecta a nossa credibilidade no interior do sistema comunitário e que, para mais, assentou numa avaliação totalmente errada das expectativas de ratificação por parte de outros Estados membros. Se estavam, como estão, salvaguardados interesses vitais no que respeita ao ajustamento faseado entre a construção do mercado único e o alargamento, nomeadamente quanto ao processo decisório, se o reforço do papel dos fundos estruturais e da cooperação política nos são extremamente vantajosos, não havia a menor razão para a hesitação e o atraso. O Governo procedeu com muita irresponsabilidade e incompetência neste domínio particular.
Aliás, este foi apenas um dos vários sintomas da incapacidade do actual governo para enquadrar satisfatoriamente o dossier europeu. Numa perspectiva mais global, e sem entrar no exame minucioso do balanço da adesão capítulo a capítulo, que esta Assembleia deve efectuar em momento oportuno, sublinharia os factores negativos.