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9 DE JANEIRO DE 1987

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O Sr. José Carlos Vasconcelos (PRD): - Sr. Deputado António Capucho, devo dizer-lhe que me surpreendeu a intervenção de V. Ex.ª, cuja serenidade na condução da sua bancada me tenho habituado a respeitar.
E surpreendeu-me, primeiro - e começando pelo fim -, porque, salvo o devido respeito, comparou o Sr. Secretário de Estado a um extraterrestre que tivesse vindo de outro planeta e que pela primeira vez visse esta Constituição.

Risos do PRD.

O Sr. Secretário de Estado tem virtudes e defeitos, como toda a gente, mas não lhe conhecia esse de ser um extraterrestre.

Risos do PRD.

Soube agora que era um docente com uma lição proferida nesta matéria - desconhecia-o -, mas isso só vem agravar as suas declarações, pois significa que não lhe saíram no calor da entrevista, não foram «lapsus linguae» ou «lapsus calami», foi alguma coisa de mais pensado, premeditado.
Portanto, o Sr. Secretário de Estado ainda não era Secretário de Estado e já pensava que a Constituição da República de Portugal não era portuguesa. Mas, nesse caso, tinha uma boa solução: ficava na sua Madeira natal - cujos ares, se calhar, lhe inspiraram, com outras influências, estas declarações vibrantes -, e ninguém o obrigava a ser membro de um Governo que tem de cumprir e respeitar a Constituição.

Aplausos do PRD, do PS e do MDP/CDE.

E para mim, como português, não há nada mais grave do que considerar que a Constituição não é portuguesa. V. Ex.as podem dizer que ela é de inspiração marxista, que é socialista e que está cheia de excrescências desnecessárias - é uma opinião -, mas não há nada pior do que considerar que a Constituição da República de Portugal não é portuguesa.

O Sr. António Capucho (PSD): - Dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. António Capucho (PSD): - Ó Sr. Deputado, uma coisa tem de ficar clara: é que nem nas notícias vindas a lume na imprensa escrita, nem muito menos na entrevista dada à RDP, cuja gravação V. Ex.ª poderá consultar, em altura alguma perpassam sequer indícios de que o Sr. Secretário de Estado não acata a Constituição, antes pelo contrário.
Por outro lado, o Sr. Deputado não pode negar a ninguém, nem mesmo a um membro do Governo, o direito de citar uma afirmação sua, feita no âmbito de um colóquio sobre a Constituição, em que, como constitucionalista e intelectual do direito que é - como certamente V. Ex.ª reconhece -, o Sr. Secretário de Estado fez comentários sobre soluções concretas e pontuais que a Constituição encerra e que do ponto de vista dele não são soluções portuguesas.
Qual é o problema disto, Sr. Deputado?! Não empole, nem tente tirar daí que há um membro do Governo que não acata a Constituição! O Sr. Deputado está a tirar uma ilação que não é verdadeira!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado António Capucho, se o Sr. Secretário de Estado tivesse dito que nesta Constituição há muitas soluções com as quais ele não concorda e que pensa não estarem de acordo com a melhor tradição do direito português, obviamente que não teríamos produzido esta intervenção. Mas o que o Sr. Secretário de Estado disse textualmente foi que temos uma Constituição da República, mas não temos uma Constituição portuguesa, pelo que é preciso que na próxima revisão constitucional seja encontrada uma fórmula que viabilize a existência dessa Constituição portuguesa».
«Não temos uma Constituição portuguesa» foi o título que saiu em vários jornais, designadamente no «Diário de Notícias», que não é um jornal qualquer, e o Sr. Secretário de Estado não desmentiu nem esclareceu esta afirmação. Portanto, isto reveste-se da maior gravidade e não tem nada a ver com a discordância, que - volto a dizê-lo - é perfeitamente legítima, sobre alguns comandos ou considerandos da Constituição. Querer dizer o contrário, por mais brilhante que seja a dialéctica utilizada, é fugir da essência da questão. Temos um secretário de Estado que disse publicamente, e não desmentiu, que a Constituição a que deve obediência não é portuguesa e para mim, como português, não há pior insulto, nem pior acusação do que esta.
Portanto, o PRD mantém inteiramente a sua posição sobre este assunto.

Aplausos do PRD, do PS e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos, vou fazer-lhe uma pergunta de natureza muito prática, antecedida apenas de uma breve introdução.
Perfilhamos de grande parte das considerações que o Sr. Deputado produziu relativamente às lamentáveis e gravíssimas declarações do Sr. Secretário de Estado para os Assuntos Parlamentares, feitas em primeira ou segunda mão, citando-se, como alega o Sr. Deputado António Capucho.
Também nos associamos à sua exigência de demissão do Sr. Secretário de Estado, mas pensamos que não é de esperar que, por iniciativa própria ou do Governo, isso venha a acontecer...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ..., como, de resto, se pode verificar nos antecedentes que já existem. Ainda ontem falámos aqui do Secretário de Estado que tem hoje a tutela da comunicação social e anteriormente vimos como membros do Governo e da bancada do PSD foram desautorizados pelo Sr. Primeiro-Ministro sem que tenham reagido de uma forma digna, como seria recomendável.
Tudo isto nos inculca a ideia de que não haverá a tal demissão se a Assembleia da República não tomar qualquer iniciativa, e por isso mesmo lhe pergunto se não encara a necessidade de serem tomadas medidas por parte da Assembleia da República para obter a demissão do Sr. Secretário de Estado enquanto não se obtém a demissão do Governo.

O Sr. António Capucho (PSD): - Uma moção de censura, muito bem!