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I SÉRIE - NÚMERO 37

guatemalteco, pois que na referida nota se anunciam medidas, citamos, «visando reduzir o risco de não correspondência à realidade dos documentos exibidos».
É estranho que seja necessário tomar mais medidas que as já previstas no Decreto-lei n.º 371/80, de 11 de Setembro, aprovado pelo governo do PSD/CDS, onde, para além da autorização do Ministro da Defesa, se prevê da parte deste a respectiva fiscalização com recurso às autoridades competentes, designadamente militares, e ainda sem prejuízo da competência das autoridades aduaneiras.
A falsificação de assinaturas -ou a sua aceitação pelas autoridades- torna-se tanto mais inverosímil quando se sabe que, designadamente na banca, não se executam operações de comércio externo sem as análises das assinaturas por espécimes, a confirmação telegráfica chavada das operações, as informações completas, a confiança entre todos os intervenientes. E tais operações, se legais, têm certamente componentes de natureza cambial.
O silêncio governamental, que não consideramos quebrado com esta nota emitida pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, não é, pois, de molde a afastar as suspeições.
A questão é, pois, delicada e embaraçosa para o Governo. Portugal foi utilizado como placa giratória no tráfico de armas dos Estados Unidos para o Irão e a Nicarágua. Até que ponto o Governo de Portugal ou qualquer outra entidade oficial foram utilizados como peões da administração Reagan?
A verdade é que foram utilizados portos e aeroportos portugueses para o tráfico ilegal de armas.
Quanto a este facto -a utilização de portos e aeroportos-, a comunicação social dá números de voos, cita datas, companhias aéreas envolvidas, exportadores e importadores, natureza do armamento, montantes, tonelagem embarcada, nomes de navios, origens e destinos (e ao longo de vários meses), revelações que deveriam merecer um esclarecimento completo do Governo.
A vertente portuguesa do Irangate americano exige pois um rápido esclarecimento, já reclamado pela opinião pública do nosso país, e a Assembleia da República tem o dever e o direito de questionar o Governo sobre este problema!

Vozes do PCP: - Muito bem!

Vozes do PSD: - Muito mal!

O Orador: - O País tem de saber se sim ou não é deficiente o nosso sistema de fiscalização de importação-exportação de armamento, se existiram pressões da CIA para que os mísseis Hawk não fossem encalhados em Lisboa, o que diz realmente o suporte magnético de computador sobre a presença de aviões de transporte no Aeroporto da Portela, se o Governo está disposto a divulgar oficialmente os nomes das empresas responsáveis e como vai actuar em relação às mesmas no futuro, qual a nacionalidade das armas transaccionadas que escalaram ou foram remetidas directamente da Portela ou de Setúbal, como explica a presença em Portugal dos voos assinalados da Southern Air Transport, Inc., e que compromisso assumiu o primeiro-ministro Cavaco Silva na viagem aos Estados Unidos da América e designadamente no encontro com o director da CIA, Sr. Wílliam Casey.

Temos presente que no volume de informação até agora divulgado o núcleo central provém das investigações efectuadas pelas instituições americanas. Para apurar a verdade sobre o Irangate. Aí se descobriu a vertente portuguesa do escândalo.
A Assembleia da República tem o dever de averiguar se esta política faz ou não parte da política externa de colaboração do governo Cavaco Silva com a administração Reagan.
As instituições dos Estados Unidos da América já decidiram enviar ao estrangeiro inquiridores sobre o caso. Não queiramos arriscar-nos a que, mais uma vez, o núcleo das revelações provenha do senado americano. Seria acrescentar ao escândalo a vergonha de uma escandalosa cumplicidade.
A Assembleia da República deve, pois, ser informada com toda a clareza sobre esta matéria e adoptar as medidas necessárias para que lhe sejam fornecidos todos os elementos oficiais e públicos, tanto de carácter nacional como internacional, com vista a apurar todas as circunstâncias em que ocorreu a participação portuguesa nos acontecimentos que levaram ao Irangate.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Borges de Carvalho.

O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Momentos há na história que marcam profundamente a vida e o futuro das nações.
Momentos altos, admiráveis e para sempre admirados uns, momentos outros que, ao invés, marcam a existência, sempre tenebrosamente presente, da bestialidade e da ignomínia, lembram que a memória colectiva não é só cheia de glória mas também cheia com vergonha, que o sono da razão engendra monstros, que a injustiça, a estupidez e a brutalidade são também ingredientes da história dos povos.

Voz do CDS: - Muito bem!

O Orador: - O regicídio de Fevereiro de 1908 - faz no próximo domingo 79 anos - é um desses momentos infaustos em que a inteligência é vencida pela brutalidade, em que a história e a nobreza de um povo são espezinhadas, em que a lógica infernal das alfurjas leva de vencida a limpidez e a honra dos homens e das instituições, em que a inveja bate a dignidade, a cobardia ganha à coragem, os instrumentos da tirania vencem a legitimidade e a história.
«Quando ao sol poente daquele dia - cito livremente Sousa Tavares - a antinação assassinou o rei e o príncipe real, caíram por terra, na pedra batida ali do arsenal, dois homens, uma Pátria, o carácter de um povo e um princípio secular de soberania.
Aqueles tiros de espingarda atingiram em cheio o objectivo marcado. Mais do que um rei, mais do que um homem na perfeita e total acepção da palavra, era o carácter de um povo que caía na rua, e com ele um fecundo sistema de aliança e de legitimidade do poder.»
Um ano antes, escrevia D. Carlos, talvez em lógica premonição: «Seja como for e suceda o que suceder, temos de caminhar para diante, ainda que a luta seja áspera e rude (e espero-a), porque aqui, mais do que nunca, parar é morrer, e eu não quero morrer assim.»