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25 DE FEVEREIRO DE 1987 1863

No entanto, gostava de o alertar para este aspecto: de acordo com o novo Código de Processo Penal, os tribunais de execução de penas vão ver aumentados o seu movimento e a duração dos processos.
Ora, não estão absolutamente preparados para isso! O número de processos por magistrado é absolutamente preocupante. Eles não podem cumprir as suas funções, não só as que já têm face à lei, como também não poderão cumprir aquelas que lhes vão ser cometidas, e as consequências disso são muito graves porque as suas competências já são muito magras.
A administração penitenciária tem hoje um conjunto de actos dos quais não cabe recurso e que, todavia, são decisivos para a vida do preso. Penso, por exemplo, na transferência, mas também penso, por exemplo, noutros actos que têm a ver com a liberdade, com o regime disciplinar, etc. Não há recurso desses actos e isso é inconstitucional e além do mais é malsão.
Gostava de lhe perguntar qual é a disponibilidade do Partido Socialista para considerar a necessidade de uma reflexão que culmine numa revisão legislativa deste aspecto.
A segunda questão tem a ver com a situação da Policia Judiciária. Que o Ministro da Justiça escamoteie por completo e não dedique uma só palavra à situação da Polícia Judiciária é da responsabilidade do Governo. O Governo lá sabe porque é que guarda esse silêncio em relação à questão da Policia Judiciária! Creio, no entanto, que, no momento em que aquela estrutura enfrenta uma situação que é melindrosa mas que deve e tem de ser ultrapassada, pois ousou levantar aquilo que o Sr. Deputado Almeida Santos chamou «a ponta de um icebergue», era útil que o Partido Socialista precisasse a sua posição sobre as medidas que podem ser encaradas para garantir a defesa da Polícia Judiciária como polícia com a missão fulcral que tem e para a prestigiar como deve ser em Portugal.
Terceiro aspecto: o Código de Processo Penal e a situação criada pelo decreto preambular. Como é que vamos sair dela? O Ministro da Justiça disse que assume a responsabilidade, mas não nos disse como é que vai sair dela. Espero que a ideia não seja a de fazer um decretozinho-lei através do qual o Governo, usurpando competências, pretenda corrigir aquilo que em má hora aprovou, pois esse caso seria inconstitucional. Há que vir à Assembleia da República, espero eu, para corrigir essa situação com a máxima urgência. Da nossa parte há disponibilidade completa para que essa alteração seja feita com a máxima celeridade possível e eventualmente com preterição de outros debates agendados.
Em todo o caso, que venha à Assembleia da República, de contrário corrigiríamos com uma entorse adicional aquilo que já é suficientemente grave.
Está o Partido Socialista disponível para corrigir aquilo que seria uma tragédia para os tribunais de polícia, designadamente aqui em Lisboa?
Eram estas as perguntas que lhe deixava.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Naturalmente não é difícil fazer uma interpelação a um governo em matéria de justiça. O Ministro da Justiça, o Governo de qualquer país, terá sempre no sector da justiça as suas maiores dívidas para com a colectividade. É assim em todas as colectividades do mundo, até porque o domínio da justiça é o domínio da utopia permanentemente deslocada, pois o domínio da justiça é o domínio da realização do direito, é o domínio da integração social, é o domínio da interiorização de normas fundamentais de convivência numa sociedade democrática.
Acontece que tudo isto está sempre em movimento recíproco. Todas estas variáveis são variáveis não dependentes de manipulação por qualquer engenharia social: podemos derrotar um montanha rompendo-a com um túnel ou fazendo pontes; estabelecer padrões efectivos de comportamento a nível humano é sempre extraordinariamente difícil. As mutações sociais estão aí e as normas herdadas ou adquiridas tornam-se obsoletas, não encontrando qualquer eco na consciência colectiva e, portanto, estar-se-á sempre em dívida em matéria de justiça. O direito nunca estará permanentemente realizado, a sociedade nunca estará perfeitamente integrada e os níveis de conformidade de comportamento desejável nunca estarão assegurados.
A tese da normalidade, da universalidade e da ubiquidade do crime, por exemplo, é uma tese clássica na sociologia. Desta tese só os criminólogos socialistas se desviaram durante um período relativamente temporário na história das ideias, mais ou menos nos anos 20 a 30, correspondente à afirmação de um certo voluntarismo dialéctico na história, chegando-se a acreditar que nos anos 30 desapareceria o crime nas sociedades socialistas então em vias de realização.
Contudo, isto hoje está completamente ultrapassado.
Dizia eu que se estará sempre em défice em matéria de justiça e daí a facilidade com que se pode fazer uma interpelação nesta matéria. Daí também a facilidade com que se faz um diagnóstico como o que acaba de ser feito agora. Só que isto obriga-nos a colocar algumas perguntas. Por imperativo constitucional a matéria da justiça, ou quase toda ela, está directa (na sua maior parte) e indirectamente (na outra parte) na dependência da Assembleia da República ou dos parlamentos. Numa Assembleia da República onde se tem o poder para gizar e estabelecer as linhas de uma política criminal não basta dizer que não há uma política criminal nem basta dizer que, em matéria de justiça, se tem caído no domínio da negligência.
A quem isto diz cabe perguntar o que tem sido feito. Naturalmente que é fácil sindicar o Governo, na medida em que este não cumpre as suas próprias metas, não cumpre a sua própria política. Contudo, não posso deixar de manifestar alguma perplexidade pelo modo como o Partido Socialista expôs a sua posição, através da intervenção que acabou de ser feita, embora esta mostre com alguma pertinência algumas deficiências, alguns débitos do Governo. Essa intervenção fala dos défices em matéria de ressocialização, ideia que não é cara, e até uma ideia que as ideologias socialistas de justiça rejeitam, é uma ideia que os criminólogos e os políticos criminais socialistas que se prezam rejeitam e acusam ...

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Socialistas de onde?! ...

O Orador: - Se quiser eu explico-lhe, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Mas explique agora.