O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

6 DE MARÇO DE 1987 2001

O Orador: - A mulher tem pela sua frente muito maiores obstáculos a vencer do que o homem, que têm a sua raiz determinante não em razões de ordem natural, mas sim em razões profundamente alicerçadas de ordem cultural.
E de tal modo assim é que superficiais classificações de direita e esquerda, conservantismo e progressismo, saltam em estilhaços quando se passa do mero formalismo das profissões de fé gerais, do plano do abstracto e despersonalizado para o plano do concreto e do quotidiano. Não se é, não sendo. As palavras que voam sem nada que as ligue à realidade do quotidiano não são uma luta, são uma acomodação envernizada; não são uma mutação autêntica do ser e do ser-se, são uma hipocrisia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O princípio é tão válido e aplicável quer ao homem que não se reconhece inferior na sua superioridade, intelectualmente assumida ou através de uma igualdade apenas preconizada mas de facto rejeitada, quer à mulher que aceita passivamente a subalternidade.
Mas se a questão dos direitos é sobretudo uma sucessão de lutas, de comportamentos assumidos, de factos, em ruptura com o estatuto social da desigualdade, e não simples profissões de fé, não poderia deixar de referir uma das lutas, um dos acontecimentos que mais subverteram a espessa e repressiva crosta cultural e política da sociedade portuguesa contemporânea.
Acabou de passar um quarto de século, 25 anos bem contados e com quantos acontecimentos em cima, sobre a célebre Carta a Uma Jovem Portuguesa, que um colega meu, Artur Jorge Marinha de Campos, publicou em Coimbra, no ano de 1961, e que havia de marcar o decisivo arranque de um movimento estudantil que viria a abalar de forma irremediável os muros da clausura que o núcleo duro de uma classe dirigente, cego e ferozmente fechado sobre si mesmo, teimava em manter de pé.
Porquê a profundeza, a força, a energia expansiva e explosiva desse movimento? Porque ele havia tocado e quebrado o tabu da relação entre homem e mulher, produzindo num ápice a centelha reveladora de que ambos precisavam da liberdade e a liberdade de ambos.
A Carta a Uma Jovem Portuguesa foi no fundo e sobretudo uma carta a um jovem português, a quem faltava não menos que à sua companheira o reconhecimento do outro, da outra, identificador e libertador.
É assim que, se a reinvidicação política ou jurídica da igualdade não toma verdadeira dimensão quando despojada do seu profundo sentido cultural, o único que lhe transmite força e autenticidade, é pura falsidade fazer crer que a mutação cultural e a libertação dispensam a liberdade. Não há libertação sem liberdade. Não há libertação possível autêntica, da pessoa, do homem, da mulher, em parte alguma da terra, sob a asfixia da ditadura e do partido único.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - No seio do movimento revolucionário que alagou e transformou as sociedades e o mundo no primeiro quartel do nosso século, um contraste sobressai carregado de simbólica significação. De entre os grandes pensadores e dirigentes revolucionários da época são homens os que secundarizam e mesmo negam a liberdade como valor permanente e insubstituível da libertação, enquanto que são mulheres os que de forma mais notabilizada mantêm a indissolubilidade do elo entre uma e outra e dizem não ao assassínio da liberdade.
São de Rosa Luxemburgo, essa grande mulher da extrema-esquerda do que então era a social-democracia alemã, e por isso duplamente insuspeita, quando o movimento revolucionário começava a abandonar o estandarte da liberdade, narcotizado por vitórias espúrias e poderes inesperados, estas corajosas, incómodas e premonitórias palavras:
A liberdade apenas para os partidários do governo, apenas para os membros de um partido - por mais numerosos que sejam - não é liberdade. A liberdade é sempre pelo menos a liberdade daquele que pensa de modo diferente. Isto não em virtude de um apego abstracto e fanático à ideia de justiça, mas porque tudo o que a liberdade comporta de instrutivo, de salutar e de purificador depende daquele princípio e deixa de ser eficaz quando a liberdade se torna um privilégio.
Mas é também uma outra grande mulher que nos dá a chave da liberdade autêntica, da liberdade libertadora, sobre a qual e só sobre a qual se podem erguer as grandes construções humanas. Reproduzo palavras de Mary McCarthy, escritora de sentido social americana também do nosso século, citada por Shimon Peres no frontispício do seu livro A Herança dos Sete: «Sou suficientemente amadurecida para compreender que as pessoas não são menos importantes do que as ideias.»
Não, não há libertação sem Uberdade. Não, não há liberdade libertadora sem o derrubamento dos espessos e abjectos muros do sectarismo.
As mulheres e os homens oprimidos de todo o mundo o sabem.

Aplausos do PSD, do CDS e de alguns deputados do PS e do PRD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, igualmente para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Alda Nogueira.

A Sr.ª Alda Nogueira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de dar início propriamente à minha intervenção, permitam-me que, para além da saudação que já aqui foi feita à delegação da Assembleia Popular da República Democrática de São Tomé e Príncipe que se encontra entre nós, vos peça uma saudação especial para a sua Presidente, que, assim como eu, passou pelas cadeias fascistas, tal como naquela altura acontecia com os militantes nas colónias que lutavam pela independência e liberdade dos seus países.

Aplausos do PCP, do PSD, do PS, do PRD, do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Hoje e dentro do pouco tempo que ainda nos resta, pensamos ser de sublinhar aqui a importância para todas as mulheres portuguesas da realização, em Novembro passado, da Conferência Nacional do PCP sobre a Emancipação da Mulher no Portugal de Abril.
Do amplo e aberto debate nela travado, da proveitosa e rica discussão ali havida, com frontalidade, verdade e sem complexos, sobre as mais polémicas e deli-