2327 - 25 DE MARÇO DE 1987
político-partidários, mas escamoteando a posição dos parceiros sociais quando ela lhe não é grata; poder-se ia falar das incorrecções do diploma relativo ao salário mínimo e da marginalização dos deficientes que nele transparece ou da confusão jurídica aí patente entre salário mínimo e rendimento mínimo garantido, com consequências graves para alguns assalariados. Mas, onde a lógica de desconcertante desconcertação social aparece mais clara é agora, com a aprovação, pelo Conselho de Ministros, de um diploma sobre alterações ao regime jurídico da negociação colectiva, que foi transformado em facto consumado, mesmo após a frontal oposição da maior parte dos parceiros sociais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Queremos deixar bem clara, neste debate, a nossa orientação: o PS, embora na oposição, assume uma cultura de governo, uma postura alternativa.
Consideramos que medidas expressivas de apoio à criação de empregos para desempregados de longa duração, para jovens, incentivos suficientes para iniciativas locais de emprego, cooperativas ou outros agentes da economia social, ajudas à partilha do trabalho, ligando o dinamismo empresarial à resposta a amplas necessidades sociais, constituem vectores importantes no combate ao desemprego.
Consideramos que uma política activa de criação de emprego, com expressão regional diferenciada e preocupações sectoriais específicas, deverá ser colocada no centro da política portuguesa, para que venha a ser materialmente possível a conjugação da modernização da economia portuguesa com o desenvolvimento da liberdade e da justiça.
Consideramos que o trabalho infantil não pode ser encarado como uma fatalidade, com observações do género «trata-se de um problema cultural» ou «os pais são tão responsáveis como os patrões» ou «sempre houve e sempre haverá enquanto o País não se desenvolver» ou ainda «a realidade é o que é e não o que gostaríamos que fosse», pois embora muito disto seja verdade, o Governo não se pode demitir de intervir, de actuar, de transformar, com desincentivos ou mesmo com medidas dissuasoras exemplares, articulando o Ministério do Trabalho e Segurança Social com o próprio Ministério da Educação. Não faz sentido que a Inspecção-Geral do Trabalho seja manuseada como um instrumento de pressão sobre os recalcitrantes das obrigações fiscais, como um agente secundário da política de trabalho do Estado democrático, não faz sentido que o Ministério da Educação não desempenhe um papel activo no esforço para o cumprimento da escolaridade obrigatória.
Consideramos que a situação de desemprego não pode obstar ao prosseguimento de uma política efectiva da melhoria das condições de trabalho. O País não pode permanecer espectador dos acidentes laborais, o País não pode admitir a contínua degradação das condições de higiene e segurança, o País não ganhará com a marginalização dos assalariados do processo micro-económico de introdução de novas tecnologias, que só será dinâmico se participado.
Consideramos que há que legislar sobre trabalho temporário, contratos a prazo, regime jurídico da negociação colectiva, flexibilidade negociada dos horários de trabalho. Mais uma vez desafiamos o Governo a propor nesta Assembleia estes e outros diplomas relativos ao trabalho. Desafiamos o Governo a governar. Como maior partido da oposição, saberemos assumir nesse contexto as nossas obrigações.
Consideramos que a boa utilização dos dinheiros investidos na formação profissional, do Fundo Social Europeu ou do Orçamento, mas no fundo, dinheiro de todos nós, é uma grande exigência nacional. A formação profissional constitui vector fundamental da política de modernização. Tem de ser assumida como uma política essencial, e isto exige enquadramento e sistematização de objectivos estratégicos e meios. Queremos que a formação profissional sirva para qualificar, para o aumento da quantidade e da qualidade do emprego, para dinamizar a mudança de especialização do País, para alargar a liberdade individual e não para limitar escolhas ou perspectivas. Queremos ver os parceiros sociais e os agentes regionais com uma palavra decisiva sobre as opções e sobre o controle das acções prosseguidas.
Consideramos que os ganhos de produtividade da economia portuguesa devem constituir uma mola impulsionadora para a melhoria continuada dos salários reais e para a correcção da distribuição do rendimento. Para a população mais favorecida, há que criar incentivos à poupança e ao investimento e não ao consumo privado ou à especulação.
Consideramos que modificações de múltiplos mecanismos da segurança social, desde o que define as regras de cálculo das pensões até aos que se ligam à concessão de subsídios de desemprego ou aos processos de apoio a reformas progressivas ou antecipadas, constituem uma importante arma de simultânea dignificação de inactivos ou desempregados e incentivos à criação de postos de trabalho.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Como socialistas, assumimos como fundamentais os valores da liberdade, da solidariedade, da justiça social e da igualdade real de oportunidades. Os custos da mudança têm de ser suportados por todos os que dela beneficiam, em última análise por toda a comunidade, não apenas por alguns, e nunca pelos mais fracos. Os resultados do labor colectivo, em que cada um interpreta um papel diferenciado, têm de ser repartidos à luz de critérios de justiça, que reforcem a coesão social evitando fenómenos de marginalização.
Como defensores da inovação e da modernidade, pretendemos contribuir para a construção de uma sociedade aberta, vitalizada por múltiplas e diversificadas iniciativas, onde sejam minimizadas as resistências às mudanças culturais, sociais ou tecnológicas, que sejam portadoras de futuro, no sentido de melhorar a qualidade da vida e a harmonia no relacionamento entre os homens e entre estes e o meio ambiente.
Somos pelo dinamismo e contra o conformismo. Assim, encaramos a crise como oportunidade para mudar para melhor. As energias, as vontades, as capacidades criativas têm de convergir. Somos inconformistas face aos dramas que afectam os trabalhadores - a miséria, o trabalho infantil, os salários em atraso, o desemprego, a discriminação.
Somos pelo diálogo e pela concertacão. Sabemos que não há verdades totais e absolutas. Sabemos que o conflito é próprio dos organismos vivos e que a dinâmica gerada pelas tensões conflituais pode e deve ser aproveitada para a mudança e o progresso humano. Recusamos um Estado totalitário ou mesmo asfixiante das iniciativas dos cidadãos ou grupos sociais. Porém, não advogamos um liberalismo selvagem que abriria espaço à prevalência da lei do mais forte. O Estado deve contribuir para suscitar iniciativas que conduzam à con-