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28 DE MARÇO DE 1987 2441

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por marcação do PRD voltamos hoje a analisar na Assembleia da República a problemática do áudio-visual, desta vez centrada na questão da televisão.
Questão importante, sem dúvida, a merecer profunda análise, enquadrada no aspecto global da comunicação, tendo em conta a diversidade de situações em presença, os avanços tecnológicos e as novas possibilidades de aproveitamento dos meios áudio-visuais.
Pelo nosso lado, gostaríamos que este debate se pudesse realizar no seu quadro próprio, proporcionando uma profunda reflexão em torno desta matéria e do áudio-visual em geral, considerando as suas diferentes componentes, os seus avanços e novas possibilidades de aproveitamento. Temos dúvidas que tal seja possível no momento actual.
Não se trata apenas de estar em causa o exacto momento constitucional para debater esta matéria. Estão também em causa questões muito concretas da actualidade política que, a não serem consideradas, nos levariam a visões parcelares da realidade, com inevitáveis consequências negativas.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Ora, aí está!

O Orador: - Importa acentuar que continuamos sujeitos a uma poderosa ofensiva do Governo contra o sector público da comunicação social, que chega a revestir a forma de ultimato à Assembleia e que, do nosso ponto de vista, urge travar.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - É uma vergonha!

O Orador: - É neste quadro que decorre o presente debate, tornando-se urgente a aprovação de medidas de fundo que permitam alterar radicalmente as perturbações, anomalias e distorções resultantes da actuação de um governo que, apesar de minoritário e isolado, procura conjurar, a todo o vapor, medidas inconstitucionais fortemente lesivas do direito à informação.
Do nosso ponto de vista, não é possível adiar por mais tempo a adopção de medidas que permitam desgovernamentalizar, reestruturar e modernizar, viabilizar e desenvolver o sector público de comunicação social; é urgente definir uma nova política para o áudio-visual; tardam as medidas para apoiar a informação escrita e difundir o gosto pela leitura; há que garantir novas condições para o exercício da profissão dos jornalistas e dos demais trabalhadores do sector.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Importa melhorar a qualidade da informação produzida e salvaguardar a independência do sistema informativo nacional.
Uma tal postura não deve, porém, levar a ignorar o que em matéria de televisão se tem vindo a passar nestes últimos tempos. Um articulista do insuspeito jornal Expresso chamava a atenção, no passado fim-de-semana, para as movimentações que neste momento estão sendo desenvolvidas no nosso país por esse grande tubarão da TV privada, o australiano Sr. Murdoch, para a actuação em Portugal nos domínios da televisão e da comunicação social em geral e das ligações que ia mantendo com os candidatos «nacionais» à TV privada.
Como referia o citado articulista, «o condicionamento maciço e a uniformização de padrões de gosto e consumo - segundo os valores mais conformistas e retrógrados - são dois elementos essenciais do modelo Murdoch, ou ainda que «a ser aplicada em Portugal a receita Murdoch com a mesma intensidade que se registou na Austrália, na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos estaria possivelmente liquidada a veleidade de produzir informação independente no País».
Interessantes reflexões, sobretudo se conjugadas com o conhecimento das ligações, de concretos candidatos nacionais à TV privada com o grupo Berlusconi, cuja programação anticultural e antinacional é por demais conhecida em vários países da Europa, de modo a dispensar comentários adicionais.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sim senhor!

O Orador: - Estes factos não podem ser ignorados no presente debate e aconselham à maior prudência e ponderação nas soluções a adoptar.
Sabe-se, por outro lado, que a gula pela TV privada vem crescendo, chegando-se ao ponto de, sem qualquer despudor, se reclamar o total sorvedouro da empresa pública RTP, ou a pura transferência para os privados do 2.º canal (e já agora porque não também o 1.º!).

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Lá chegarão! ...

O Orador: - Sempre com a tónica de que o sector público pague a factura e o privado assuma os lucros. As vozes de sereia podem encantar, mas não podem enganar!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Prova exemplar do que foi dito é o projecto de lei do CDS.
Para este partido o importante é destruir a actual lei da televisão, sempre com o objectivo de pôr a saque a RTP, E. P. Se o projecto já de si era abstruso e rotundamente inconstitucional, se para o CDS direitos essenciais como os direitos de antena e de resposta não contam, se para este partido de nada interessa preservar direitos dos profissionais da informação e programação ou assegurar regras mínimas de funcionamento, ficámos ontem a saber que, apesar de tentar vender a teoria de que todos seriam iguais em oportunidades de acesso, ficámos a saber, dizia, que para o CDS há uns mais iguais que outros.
É preciso descaramento, senhores deputados do CDS! Não nos venham, pois, com argumentos de pseudo-igualdade - o que o CDS preconiza é a retoma de forma encapotada da proposta de lei n.º 5/IV, que não conseguiu obter vencimento nesta Câmara. É tentar fazer passar gato por lebre, o que é a todos os títulos inaceitável, quer do ponto de vista político, quer do ponto de vista ético.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Para além disto, a não previsão de qualquer tipo de limitações que permitissem afastar à partida a gula estrangeira revela à evidência o que quer o CDS. Quer o domínio dos grandes grupos económicos internacionais, quer a destruição do serviço público da televisão. Quer a lei da selva tão querida dos Murdochs, Berlusconis e companhia.