O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

2528 I SÉRIE - NÚMERO 64

O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr. Primeiro-Ministro, sou deputado do PRD. Isto para lhe dizer que num aspecto o Sr. Primeiro-Ministro tem razão quando diz que o PRD devia autocensurar-se por muitas coisas, uma vez que penso que o PRD tem de se autocensurar. Porquê? Porque inicialmente acreditou no governo presidido pelo Sr. Primeiro-Ministro, e isso, devo dizer-lhe, foi um erro grave, do qual, provavelmente, o PRD jamais se conseguirá libertar.
É que, depois do discurso feito hoje pelo Sr. Primeiro-Ministro, ficaram evidenciadas questões que eu não achava possível e não acreditava ser possível serem colocadas aquando da discussão do Programa do Governo na Assembleia da República, Programa esse que o PRD viabilizou.
Reconheço hoje que, em muitos aspectos, tinha razão um senhor deputado que, na altura, fez um discurso altamente crítico e com aspectos que pessoalmente tive o cuidado de dizer que não subscrevia. Refiro-me ao discurso produzido pelo Sr. Deputado Sottomayor Cárdia.

Vozes do PCP e do MDP/CDE: - Muito bem!

O Orador: - Se me permitem, como não vou fazer as perguntas que tinha previsto, gostaria de recordar uma diferença fundamental que penso ser de sublinhar. Recordo que, depois do 25 de Abril, o I Governo Constitucional, presidido pelo Dr. Mário Soares, caiu na Assembleia da República porque apresentou uma moção de confiança que não foi aprovada. Mas que diferença de discurso, Sr. Primeiro-Ministro!... O Dr. Mário Soares dizia no seu discurso que a democracia, nesta Casa, tinha cumprido as suas obrigações, tinha feito valer valores fundamentais da democracia. Nessa altura, o Sr. Primeiro-Ministro Mário Soares sublinhava isso de uma maneira verdadeiramente determinante. Pois bem, veio-me à memória - veio-me à memória, repito - a diferença dos dois discursos.
Para terminar, vou fazer-lhe uma pergunta: pensa o Sr. Primeiro-Ministro que o discurso que aqui fez hoje se insere na matriz cultural, política e democrática do nosso sistema político português?

Aplausos do PRD, do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres.

O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Primeiro-Ministro, ao ouvi-lo descrever a situação económica do País imaginei, por momentos, que era ainda o Prof. Cavaco Silva de Económicas e que um aluno tinha a ousadia e a lata de descrever a situação económica do País e a sua evolução recente com as mesmas palavras utilizadas pelo Sr. Primeiro-Ministro.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Que reprimenda esse aluno não teria levado do Prof. Cavaco Silva!?
Sr. Primeiro-Ministro, o senhor mostrou sofrer de uma doença, até agora desconhecida para mim, e que é o daltonismo numérico, que o faz reparar em todos os números que de perto ou de longe possam parecer favoráveis à acção do Governo e ter uma cegueira total em relação a todos aqueles - e são muitos! - que constituem um severo libelo acusatório em relação à ineficácia da gestão económica do mesmo governo.
Por outro lado, é necessário inverter algumas das perguntas que no; fez. Nesse sentido, pergunto-lhe: que outro governo, desde o 25 de Abril, encontrou um quadro de evolução na situação económica e financeira internacional tão favorável como o actual?
É necessário perguntar-lhe que outro país da Europa Ocidental, que não Portugal, gozou de um efeito tão positivo da evolução dos termos de troca sobre as suas contas? É que, infelizmente, é maior em Portugal do que em qualquer outro desses países o peso das dependências alimentar e energética, e foi essa fraqueza que neste caso funcionou a nosso favor.
Sr. Primeiro-Ministro, como é possível perguntar qual é a taxa de desemprego em Espanha ou na Irlanda? Se eu perguntasse ao Sr. Primeiro-Ministro qual o poder de compra dos salários em Espanha ou na Irlanda, como não me acusaria de demagogo!... Se perguntasse a taxa de inflação na Suíça ou na Alemanha, como mo me acusaria de demagogo!... Nada disso tem a ver com a gestão deste governo, nada disso tem a ver com a conjuntura, como o Sr. Primeiro-Ministro sabe perfeitamente.
O Sr. Primeiro-Ministro também falou da recuperação do investimento. Mas é necessário dizer que o essencial é ver qual a recuperação do investimento privado - e esse Foi extremamente reduzido em Portugal, uma vez que teve um crescimento um pouco superior a 5% - e o ano passado o investimento estrangeiro cai de 42 milhões para 24 milhões de contos.
Apetece perguntar o seguinte: será que o Sr. Primeiro-Ministro não percebe que a vida económica e o investimento não se compadecem com a incapacidade dos seus ministros para acordarem, com eficácia e rapidez, um verdadeiro sistema de incentivos ao investimento, capaz de fomentar devidamente o investimento privado em Portugal?
Mas mais importante e mais grave do que o discurso económico é o discurso político - e o seu discurso é, aliás, o de um estróina que recebeu uma herança e que diz ao vizinho do lado, que ganha honestamente a sua vida: «Malandro, não és capaz de gerir tão bem como eu as tuas finanças». No essencial, o Sr. Primeiro-Ministro procurou dar ao País, mais do que à Câmara, pois falou mais para a televisão do que para nós, a seguinte ideia simples:

Há aqui um homem, que sou eu - o Sr. Primeiro-Ministro -, que está preocupado com o bem-estar dos Portugueses e com o interesse nacional. Tudo o resto é um conjunto de pessoas que só cuidam do seu interesse partidário.
Penso que o Sr. Primeiro-Ministro não tem autoridade moral para fazer declarações deste género.
Recordo-lhe que foi ministro das Finanças num momento de vacas gordas», que as ajudou a fazer emagrecer e, quando as viu já bastante magras, saiu do Governo; que o seu primeiro acto político, como líder do PSD, foi o de derrubar o Governo do «bloco central»; que o Sr. Primeiro-Ministro, no fundo, tem andado em permanente campanha eleitoral, à espera de uma crise que deseja e que ajudou a provocar.
Permita-me que lhe pergunte o seguinte: E Portugal? E os Portugueses? E a estabilidade política?

Aplausos do PS, do PRD, do PCP e do MDP/CDE.