O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

23 DE DEZEMBRO DE 1988 811

Aí, onde se negligencia ou não se assegura a protecção social e o bem-estar, as categorias mais pobres e vulneráveis da população não gozam plenamente dos seus direitos civis e políticos.
Também por isso, o dia de hoje não pode ser «um dia de ser bom, um dia de falar e ouvir em mavioso tom».
E há que perguntar, frontalmente, se entre nós temos assegurados os direitos económicos, sociais e culturais que a Declaração Universal e a nossa Constituição da República reconhecem.
Pode dizer-se que está garantida em Portugal a protecção social e o bem-estar quando sabemos que o número de famílias vivendo abaixo da linha de pobreza é dezasseis vezes superior à média da CEE? Quando é certo que aumenta o número de famílias a braços com o desemprego absoluto? Quando os nossos reformados, pensionistas e idosos vivem na míngua de uma minguada pensão?
Perante a vergonha do trabalho infantil, que contas daremos a nós mesmos e ao mundo do cumprimento do direito da infância a ajuda e assistência especiais?
Que peso na consciência carregamos quando nós apresentamos a assinar a Declaração Universal dos Direitos da Criança!
Igual ao que connosco levamos quando em instâncias internacionais se faz o balanço do Estatuto dá Mulher em todo o Mundo.
Contra o artigo 2.º da Declaração Universal, contra a nossa Constituição e a nossa lei, a mulher portuguesa continua hoje a ser discriminada no trabalho, na sociedade e na família, precisamente por falta de realização dos seus direitos económicos, sociais e culturais. Também aqui, ao invés de se extinguirem mecanismos que asseguram a vigilância sobre o cumprimento do princípio da não discriminação, se justificaria o reforço dos mesmos e a criação de outros.,
O que se está a passar em relação à Comissão Parlamentar da Condição Feminina ameaçada de extinção é um grave recuo no cumprimento do princípio da não discriminação inserto na Declaração Universal.
A condição da mulher é, aliás, reflexo da situação que se vive no que toca ao cumprimento dos direitos económicos, sociais e culturais dos trabalhadores.
Como será possível afirmar que atingimos a plenitude das liberdades civis e políticas, quando é certo que na prática não se garante o direito a uma remuneração justa, quando nem sequer se garante o direito a qualquer remuneração, ou para melhor explicitar, quando se permitem salários em atraso?
Estando o direito ao trabalho, nos termos da própria Declaração Universal, no centro dos direitos económicos, sociais e culturais, como será possível afirmar que todos os portugueses gozam na sua plenitude dos direitos civis e políticos, quando através de um projecto de decreto-lei - o pacote laboral - se pretende aumentar a reserva dos desempregados, a pretexto da revolução técnico-científica aqui pretensamente usada contra o próprio Homem, para satisfação dos desejos, da cupidez de um punhado?
Neste preciso momento, não podemos deixar de salientar que em Portugal a Comemoração do 40.º aniversário da Declaração Universal dos Direitos do Homem se salda negativamente na ameaça, muitas vezes tentada mas sempre repelida, ao direito ao trabalho.
O Grupo Parlamentar do PCP não pode deixar de apresentar o seu mais veemente protesto por mais esta violação da Declaração Universal.
O que prova que, afinal, o Dia de Natal já nem sequer é um dia para ser bom.
Não cremos que seja possível ler o texto fundamental dos Direitos do Homem, sem sentir um frémito incómodo quando perante a proclamação do direito à livre escolha do trabalho e a condições equitativas e satisfatórias do trabalho nos defrontamos com os que se vêem obrigados a aceitar a contratação a prazo, ou qualquer forma de trabalho precário, novo quadro da servidão neste final do século XX.
Tudo isto com as decorrentes consequências negativas sobre os direitos sindicais, limitados, e mesmo muitas vezes negados, como acontece com a PSP e restantes forças de segurança,- com estabelecimentos fabris das Forças Armadas, com os Sapadores Bombeiros.
Não é desta forma que se reforçam a liberdade e a dignidade humanas.
E se uma única prova quiséssemos para justificar as palavras agrestes, poderíamos bastar-nos com as graves restrições colocadas aos cidadãos no acesso ao Direito e aos Tribunais, precisamente no mundo em que se efectivam os Direitos, Liberdades e Garantias dos cidadãos, poderíamos bastar-nos com a crise que atravessa o mundo da justiça.
Nesta área, é de igual modo inadmissível e há que salientar, a situação degradante vivida pelo reclusos em muitos dos estabelecimentos prisionais.
Também a situação nos serviços de informações e a ameaça que constituem para os cidadãos são um expoente que permite complementar o balanço que até aqui fizemos e que aditaremos com alguns breves traços das perspectivas futuras.
Não podemos esquecer hoje que o Processo de Revisão Constitucional, tal qual se encontra ensejado na base do conhecido acordo bipartidário, ameaça pôr em causa garantias constitucionais e condições de realização dos direitos fundamentais dos portugueses.
Direitos que mereceram uma aprofundada análise no programa do PCP, aprovado no XII Congresso.
Para nós, comunistas, a democracia política, base fundamental dos direitos humanos, possui um valor intrínseco, um valor conhecido do povo português porque foi privado da liberdade durante 48 anos de ditadura fascista, porque a conquistou e passou a vivê-la com o 25 de Abril.
A liberdade é um elemento básico essencial dá democracia avançada que o PCP no seu programa propõe ao povo português para o limiar do século XXI, tendo no horizonte o socialismo.
Mas a democracia tem de ser simultaneamente política, económica, social e cultural para a realização plena da Declaração Universal dos Direitos do Homem.
Só nessa altura será possível decretar como nos Estatutos do Homem de Tiago de Melo,
Agora vale á verdade
Agora vale a vida.

Aplausos do PCP, de os Verdes e do Deputado Independente João Corregedor da. Fonseca.

O Sr. Presidente: - Em representação do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Sampaio.