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11 DE JANEIRO DE 1989 959

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Lello.

O Sr. José Lello (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As questões de cariz fiscal estão hoje na ordem do dia quando o País despertou para a dura realidade que o espera neste 1989 do nosso descontentamento de contribuintes.
Não venho, entretanto, falar aqui no problema na sua dimensão global antes venho focar um dos aspectos da sua incidência sectorial: a fiscalidade no desporto.
Ora, esta questão, se não fosse glosada nos múltiplos aspectos das implicações fiscais que impenderão sobre os agentes e os clubes desportivos, poderia vir a ser apenas apreciada pelos seus contornos marginais, e na base de argumentos demagógicos, emocionais e, por isso, imprecisos.
Vejamos: ninguém questionará a afirmação de que grande número dos atletas' de alta competição aufere, como é publicamente conhecido, verdadeiras fortunas, gozando dum estatuto de excepção que passava por uma completa impunidade fiscal!
Daí que se entenda a preocupação do legislador no sentido de alargar aos profissionais de futebol e outros atletas de alta competição, um conjunto de obrigações de carácter fiscal. Isto, tendo em conta as condicionantes de uma carreira de muita curta duração, dependente de imprevistos, sujeita a um intenso desgaste físico e psicológico e revestindo características de certa pericolosidade, a ponto de a cada momento poder ser prematuramente interrompida. Os exemplos seriam numerosos a corroborar esta tese.
Assim, quanto ao problema dos jogadores nada haverá a dizer, senão o de sublinhar que neste caso os argumentos dos benefícios da previdência e da pensão de reforma compaginados com declarações mais reais de rendimentos, revestem-se de um carácter falacioso. Com efeito, a assistência médica e medicamentosa sempre foi assumida pelos clubes de alta competição, bem como o pagamento dos dias de baixa que, neste caso particular, se referem maioritariamente a períodos de paragem de actividade em função de lesões ou de abaixamento de forma física.
Por outro lado, tão pouco a questão das pensões de reforma tem aqui uma acuidade, tanto mais que o seu cálculo será feito sendo o ex-jogador já sexagenário e com base nos proventos resultantes dos cinco melhores anos dos últimos dez duma actividade que não será, positivamente, aquela mesma que, na idade dos 20/30 anos, proporcionou os altos rendimentos de que agora falamos.
Pelas razões aduzidas, entende-se e apoia-se que para o caso dos atletas de alta competição exista um estatuto legal próprio, prevendo hipótese de se consagrarem deduções específicas resultantes de seguros de poupança e de pensões de reforma e instrumentos semelhantes que lhes garantam estabilidade social no fim da sua curta carreira.
Enfim, pôr-se-á termo a uma situação conhecida de todos de existência de contratos declarados que serviam de base de tributação e dos contratos paralelos que serviam de remuneração.
Vejamos a outra face do problema, ou seja, a que se reporta às imposições de carácter fiscal a que «as entidades utilizadoras dos agentes desportivos» se ficam obrigadas a assumir.
Era manifesta a necessidade de se legislar quanto a esta área, de molde a que o sector pudesse funcionar segundo moldes mais criteriosos, mais claros e transparentes. Aliás, cientes desse interesse, os próprios clubes tinham, em devido tempo, levantado a questão ao Governo.
Assim, pelo Decreto n.º 452/88, de 13 de Dezembro, «as entidades regularmente constituídas que se dediquem à prática do desporto federado, incluindo as respectivas associações e federações, ficam obrigadas a possuir», conforme os níveis da «receita líquida do exercício anterior» tiverem sido ou não superiores a 25 000 contos, contabilidade regularmente organizada. Por outro lado, a imposição alarga-se à obrigatoriedade de possuírem livros de registo das operações efectuadas.
Ora, antes de outras quaisquer considerações, desde logo aqui surgem as contradições.
Com efeito, tais livros de registo ainda não estão acessíveis aos clubes, daí decorrendo que se isso compromete a corrente escrituração de 1989 ainda dificulta a prévia descrição do inventário de 31 de Dezembro de 1988. Por outro lado, à míngua de portaria regulamentar, as entidades visadas irão escriturar os livros selados em multa, por demora de publicação de documentos estruturantes do plano da própria escrituração.
Aliás, a problemática da fiscalidade incidindo sobre os agentes e entidades desportivas tinha sido objecto de uma primeira abordagem através da publicação do Decreto-Lei n.º 413/87. Este pressupunha já a obrigatoriedade da estruturação de uma contabilidade regularmente organizada por parte das citadas entidades.
Logo então o referido diploma seria contestado em alguns aspectos, designadamente por prever multas demasiado pesadas e penalizações como agora acontece, que chegam à responsabilização criminal incidindo sobre quem anda nas lides desportivas sem qualquer interesse de ordem material, antes se entrega a essa causa, com prejuízo pessoal, pela devoção ao fomento do desporto, do seu ideário e dos valores sublimes que o mesmo deve consubstanciar.
Assim, o desfasamento temporal e desajustado entre regulamentação, definição e informação com as obrigações prescritas será manifestamente intolerável quando na generalidade dos clubes e associações tais funções não são assumidas por técnicos especialistas, mas sim «por agentes benévolos, sem remuneração, e nos seus tempos livres».
Outra das questões que o próprio associativismo desportivo levanta é a de que estando para breve a aprovação pelo Parlamento da lei de bases do sistema desportivo mais ajustado seria que fosse esta lei a definir com objectividade e rigor quais são os agentes desportivos profissionais e amadores, não deixando o caso à consideraçâo discricionária da Administração Fiscal.
Importará aqui situar o papel insubstituível dos clubes desportivos na sua exacta e específica dimensão.
Ninguém contestará a manifesta inexistência de instrumentos de apoio à valorização física dos cidadãos da responsabilidade e iniciativa do Estado.
Com efeito, o desporto escolar não tem entre nós qualquer significado e o enquadramento desportivo de âmbito comunitário ou regional é coisa que oficialmente também não existe.
Assim, o desporto de recreação ou de manutenção pratica-se entre nós, essencialmente, nos clubes desportivos.