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1242 I SÉRIE - NÚMERO 34

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Está a confundir as questões! Essa não é a deslocação de que eu falei, mas sim à comarca!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: A primeira reflexão que me ocorre fazer neste momento é a do próprio regime das ratificações, consideração, a meu ver, tanto mais necessária quanto as últimas palavras do Sr. Deputado Coelho dos Santos, que me chamaram a atenção para a circunstância de estarmos, aqui, a travar o que classificou de um «diálogo inútil».
Face a isto, pergunto: que regime é este das ratificações, nos termos do qual uma ratificação suscitada em Junho de 1988 só vem a poder ser agendada em Fevereiro de 1989? Onde estará a inutilidade do processo? Na legitimidade da iniciativa ou, virtualmente, na ineficácia do sistema das ratificações tal como está a ser concebido? Se uma ratificação pressupõe que ela é ainda uma parte do próprio processo legislativo então o que todos deveríamos convir é que o processo legislativo deveria, com a maior urgência, ser complementado com as ratificações suscitadas.
Ora, não podemos, de modo algum, estar de acordo com esta dupla posição: por um lado, adiar ad nausean o momento de agendamento das ratificações e, por outro, vir criticar os grupos parlamentares que suscitaram essas mesmas ratificações. Fazer o mal e, simultaneamente, a caramunha é um hábito a que o Grupo Parlamentar do PSD já nos habituou, mas com o qual não desejamos continuar a pactuar.
Gostaria agora, Srs. Deputados, de fazer algumas considerações sobre o decreto-lei regulamentador da lei orgânica dos tribunais.
A primeira dessas considerações vai no sentido de entender que a organização territorial da administração da justiça, que se manifesta através deste decreto--lei regulamentar da lei orgânica dos tribunais, é reveladora de como os vários departamentos da Administração Pública continuam de costas voltadas uns para os outros, sem qualquer critério lógico ou lógica coerente, no que diz respeito à institucionalização de um programa de regionalização mínima dos serviços desconcentrados e descentralizados do Estado.
As situações são cada vez mais graves e mais caricatas no nosso país. Um qualquer cidadão, de um qualquer ponto do território nacional, para tratar de um interesse particular, mas que tem a ver com uma contrapartida de serviços públicos, encontra totalmente dispersas as sedes dos serviços desconcentrados da Administração Pública. E as situações repetem-se e complicam-se. Por exemplo: um habitante de Tomar faz parte do distrito administrativo de Santarém; por sua vez, Santarém faz parte do distrito judicial de Évora; Tomar faz parte do distrito judicial de Coimbra. E tudo isto com uma complexidade ainda pior no que diz respeito aos cruzamentos com vários outros serviços de outros departamentos do Estado.
A continuarmos por esta lógica, sem rei nem roque, estamos a prestar o pior serviço a qualquer ideia futura de uma descentralização coerente e de uma regionalização capaz para o nosso país.
Portanto, neste ponto, temos que criticar o Governo por não ter sabido utilizar os factores de estabilidade política e institucional de que disfruta para poder ponderar melhor estas exigências que são, também, exigências do ordenamento do território, do próprio ordenamento urbano e, em última análise, do próprio ordenamento dos serviços públicos.
Por outro lado, perante esta situação, é de lamentar que o Governo não tenha tido a ousadia de criar novos distritos judiciais porque, para além da temática dos círculos judiciais, se imporia, seguramente, num processo de descentralização da administração da justiça, aproveitar esta oportunidade para criar novos distritos judiciais, o que, infelizmente, não foi feito. E quanto aos círculos judiciais - e aproveito a oportunidade para corrigir, pontualmente, o Sr. Secretário de Estado, de que não são 45 mas 47 círculos criados pelo decreto--lei que regulamenta a lei orgânica dos tribunais -, verificamos que apenas 15 dos 47 tribunais do círculo estão, actualmente, instituídos e em condições de funcionamento.
Dir-se-á que não poderia ser doutro modo, na medida em que este decreto-lei regulamentar só deu entrada a partir de Junho do ano passado. Não creio que seja assim porque a lei orgânica tinha sido aprovada nos finais do ano de 1987 e o Governo dispunha de um prazo de 90 dias para regulamentar essa lei. Não o fez em três meses, levou seis meses a regulamentá-la e, portanto, entre o momento da entrada em vigor da lei orgânica e este preciso momento, em que estamos a apreciar o decreto-lei regulamentar, vai mais de um ano, tempo mais que suficiente para o Governo ter podido implementar, com mais eficácia, os tribunais de círculo, já que eles são a espinha dorsal desta reforma, no domínio de estrutura judiciária.
Por outro lado, se na perspectiva e no discurso governamental, os tribunais do círculo correspondem a uma lógica de descentralização da justiça, como já hoje aqui se verificou, eles estão, sim a corresponder a uma centralização da administração judicial. E isto é preocupante, porque essa centralização está a revelar graves distorções, sendo uma delas a do próprio regime de colocação dos juízes. Não há dúvida que, quando se pretendia ter juízes privativos nos tribunais de círculo e se acaba por ter juízes interinos, alguma coisa está, profundamente, errada em todo este processo. De igual modo, quando se pretendia dar aos juízes privativos um regime de comissão de serviço de três anos prorrogáveis desde que o juiz continuasse a manter o aproveitamento de bom com distinção, o que significa uma intenção de manter o juiz sediado no tribunal de círculo, o regime de interinidade vem pôr tudo isto em causa.
Há, porém, ainda uma outra questão legal, a meu ver preocupante, quanto ao problema da interinidade. É que este regime não foi previsto na lei orgânica dos tribunais. Trata-se, apenas, de uma previsão, por excepção, do decreto-lei que regulamenta aquela lei.
Ora, como se sabe, toda a matéria de organização dos tribunais e do estatuto dos juízes é da competência reservada da Assembleia da República e não tendo sido aprovada nenhuma norma, em sede da lei orgânica dos tribunais, visando a criação daquele regime, mas, apenas, no decreto-lei que a regulamenta, isso significa que o Governo procedeu a uma medida legislativa por violação das regras da competência reservada à Assembleia, no domínio da organização dos tribunais e do estatuto dos juízes.