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15 DE FEVEREIRO DE 1989 1351

O Sr. Carneiro dos Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - A debilidade do desenvolvimento português em relação aos restantes Estados membros da CEE é facilmente ilustrado pelos seguintes números: se atribuirmos o índice 100 do produto interno per capita médio da CEE, no fundo da escala fica o nosso país com o índice de 61; a Grécia tem mais ou menos a mesma posição; a Espanha tem 83; no alto da escala situam-se o Luxemburgo com 147, a Dinamarca com 134 e a RFA com 133.
Bem pode o Sr. Primeiro-Ministro repetir que já não estamos na cauda da Europa, a ilustre Grécia já teria ficado para trás. Na verdade, aquilo que os portugueses experimentam são preços de nível europeu e salários de nível asiático.

O Sr. Carneiro dos Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - O «milagre económico» de que o chefe do Governo se arroga só pode ser invocado por ironia. Ou, então, esse «milagre» não foi confiscado por uma minoria que ostenta uma riqueza tão fácil como surpreendente?
Em segundo lugar, as desigualdades derivadas de uma injusta distribuição de riqueza produzida no País, entre os diversos grupos sociais: não será verdade que o factor trabalho é contemplado com uma magna fatia de apenas 47% do rendimento nacional?
O salário médio português representa um terço ou um quarto dos países mais prósperos da CEE, sendo esse desfasamento ainda mais pronunciado do que o verificado no produto per capita.
E não é verdade ainda que cerca de 30% da população portuguesa vive abaixo do limiar da pobreza? Está em emergência mesmo uma nova pobreza, com incidência mais aguda nas grandes áreas urbanas, constituída por desempregados de longa duração, idosos e outros grupos marginalizados.
Em terceiro lugar, as desigualdades derivadas de uma incorrecta distribuição de riqueza no território nacional, causadora de profundas assimetrias regionais. Este tipo de desigualdades cruzam-se com as desigualdades sociais anteriormente referidas e agravam-nas dramaticamente.
Vale a pena, no contexto deste debate, repisar, mais uma vez, o dualismo de desenvolvimento entre um litoral densamente povoado, desarrumado, caracterizado por uma industrialização destruidora dos seus melhores solos e de uma urbanização desordenada, e um interior deprimido, com a sua população envelhecida e uma estrutura económica arcaica.
Vale a pena neste ponto repisar o contraste entre a macrocefalia das nossas duas áreas metropolitanas, em particular da capital que há séculos concentra a pouca riqueza do País e muito poder.
Vale ainda a pena referir que pela fronteira das nossas regiões encostadas à Espanha, passa a fronteira do subdesenvolvimento europeu, e ficam as regiões mais pobres da CEE.
Tudo isto são dados adquiridos. Muito embora na última década a situação das regiões mais desfavorecidas tenha melhorado, continua a verificar-se um profundo desequilíbrio na distribuição do rendimento entre, por exemplo, o Norte do País globalmente considerado em que, em 1985, o produto bruto per capita era apenas de 60% da região de Lisboa e Vale do Tejo.
Todavia, não é aquele espaço económico regional que origina mais de metade das nossas exportações e onde a criatividade económica é mais acentuada?
Em rigor poder-se-á sustentar que este Governo tem uma estratégia de desenvolvimento do País destinada a recuperar o terreno perdido face à Europa e susceptível de potenciar os inegáveis efeitos positivos da integração Comunitária? Em rigor, poder-se-á dizer que o Executivo tem uma política de rendimentos e uma política social suavizadora das injustiças sociais, inspirada em valores humanos e éticos nobres?
Em rigor, poder-se-á dizer que este Governo tem uma política regional e municipal dirigida à correcção das gritantes disparidades regionais e a promover as regiões portuguesas mais desfavorecidas?
Ninguém, com um mínimo de espírito de isenção, pode dizer que sim. O Governo só tem uma atenuante: o problema vem de muito longe e outros não fizeram melhor do que ele. Mas têm circunstâncias agravantes: nenhum governo nas últimas décadas teve uma conjunção dos astros tão favorável. O Governo não soube aproveitar a boa estrela e, por isso, merece uma severa censura, bem traduzida na actual generalização de um descontentamento multiforme que ignora as compartimentações sociais tradicionais e as filiações partidárias.

O Sr. Carneiro dos Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Parece até que, contentes, apenas restam aqueles que, na lógica da pura partidarização, enxameiam o aparelho do Estado.
Debrucemo-nos agora exclusivamente sobre o desenvolvimento regional e a regionalização, porventura o ponto forte deste debate. De facto, o desenvolvimento regional e local são considerados hoje em dia enfoques estratégicos privilegiados do desenvolvimento económico, social e cultural.
Todavia, não temos uma política de desenvolvimento regional. Nem de cima para baixo, porque o Estado não a tem, nem de baixo para cima, porque não há regiões. E no entanto, quem recusará a sua necessidade?
Trata-se de fixar a população no interior, trata-se de ordenar e descongestionar as áreas metropolitanas, trata-se de modernizar o tecido produtivo de certas zonas, trata-se da política agrícola ou da industrial, trata-se ainda da defesa do ambiente? Em qualquer dos casos, o enquadramento regional é indispensável. É uma evidência que se mete pelos olhos dentro.

O Sr. Carneiro dos Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Pois bem, parece-me ser axiomático que sem regionalização jamais teremos essa política de desenvolvimento regionalizada que o País e a CEE, recomendam, aliás o Sr. Primeiro-Ministro no seu interessantíssimo discurso - por que é a alegação mais sistemática feita por fontes governamentais contra a regionalização - chega a defender uma coisa que é perfeitamente contraditória nos seus termos; um processo de regionalização o Sr. Primeiro-Ministro não gosta. Ele nasceu em Boliqueime, logo no Algarve, não morre de amores pela região algarvia e, muito menos, claro está, pelas restantes regiões portuguesas. E porquê?

O Sr. Mendes Bota (PSD): - Isso não é verdade!