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1550 I SÉRIE - NÚMERO 44

do seu mandato, irão ser alvo da tal inspecção ordinária que o seu partido defende.
Sr. Deputado João Amaral, eram estas as questões que lhe queria colocar e gostaria também dizer-lhe que, mais uma vez, V. Ex.ª apenas aproveitou a oportunidade deste debate para desferir ataques infundados ao Governo.
É que, face à realidade que nos últimos anos tem sido a questão da tutela inspectiva administrativa das autarquias, penso que algo teria que ser feito. E isso não é meramente o exercício da inspecção sem que, depois, se preveja o seu carácter sancionatório em termos reais, concretos e de funcionalidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o PCP ainda dispõe de quatro minutos.
Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Deputado Mendes Bota, como ainda quero guardar algum tempo para fazer pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Luís Martins, serei sintético na resposta.
Sr. Deputado, pensei que iria utilizar o seu tempo para responder ao desafio concreto que lhe fiz, de saber se, na especialidade, vamos estar dispostos a configurar a proposta de lei de uma forma totalmente diferente. Mas não, o Sr. Deputado resolveu utilizar o seu tempo apenas para o gastar. E, efectivamente, gastou-o, só que não acrescentou nada, salvo num ponto, que agradeço e que foi o ter confirmado, com a sua pergunta, que a decisão que o Governo se propõe levar por diante, com o sistema que congeminou, implica decisões de oportunidade, isto é, arbitrárias. Agradeço tê-lo confirmado e já que o faz, criticando-me por ter dito que todas as autarquias devem ser inspeccionadas e que isso implica um critério de oportunidade em relação às que são inspeccionadas no primeiro, segundo, terceiro e quarto anos, permita-me que lhe sugira que, em conjunto, subscrevamos uma proposta de alteração para que essa indicação seja objecto de sorteio público, evitando qualquer questão de oportunidade.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Oliveira e Silva.

O Sr. Oliveira e Silva (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Mais uma vez é a Assembleia da República confrontada com iniciativas que visam estabelecer, a nível da lei ordinária, o regime da tutela administrativa à luz do preceito fundamental que contempla a matéria e que é, como se sabe, o artigo 243.º da Constituição.
Se o tema é, por sua natureza, melindroso, ao pôr em questão o conteúdo e limites da autonomia local, há que reconhecer, ao menos em princípio, que a primeira revisão constitucional consagrou directivas neste domínio que favorecem uma aproximação entre as soluções preconizadas pelas diferentes forças políticas com assento nesta Assembleia.
Com efeito, enquanto o texto primitivo da Constituição prescrevia apenas que a tutela sobre as autarquias locais seria exercida segundo as formas e nos casos previstos na lei, competindo no continente ao Governo e nos Açores e na Madeira aos respectivos órgãos regionais, após aquela revisão o artigo 243.º n.º l passou a estatuir expressamente que a referida tutela consiste na verificação do cumprimento da lei por parte dos órgãos autárquicos.
Ficou, assim, claramente estabelecido que só é possível impor um regime de tutela que se destine apenas a fiscalizar à posteriori o cumprimento da lei por parte dos órgãos do Poder Local.

Deu-se, assim, consagração constitucional a um princípio, que já inspirava o legislador ordinário ao estatuir no artigo 91.º n.º 2 da Lei n.º 79/77, de 25 de Outubro, que a tutela inspectiva é superintendida pelos Ministérios da Administração Interna e das Finanças e tem exclusivamente por objecto averiguar se são cumpridas as obrigações impostas por lei.
E há-de convir-se que esta disciplina é a que melhor se conjuga com a autonomia das autarquias locais, que o artigo 6.º da Constituição erige mesmo num dos princípios fundamentais do nosso ordenamento jurídico.
Essa autonomia, porém, não é irrestrita, já que, nos termos do artigo 237.º n.º 1 da lei fundamental, as autarquias locais integram a organização do Estado e este, por imperativo do artigo 3.º n.º 2, subordina-se à Constituição e funda-se na legalidade democrática.
Tal como a administração central, também a autárquica está, assim, submetida, como não podia deixar de ser, ao império da lei.
Mesmo em regimes não democráticos, que por norma desprezam, anulam, mitigam ou cerceiam a autonomia local e em que, por isso, as autarquias são apenas ou, sobretudo, meros instrumentos da administração indirecta do Estado, proclama-se, também aí, a vinculação dos seus órgãos à legalidade e institui-se, para a garantir, diferentes formas de tutela.

No que respeita ao nosso país, pode mesmo dizer-se que com o 25 de Abril não se processaram diferenças de fundo quanto ao regime da chamada tutela jurisdicional. Antes da Revolução, como depois e agora, as leis garantiam formalmente ao cidadão lesado o direito de requerer, mediante recurso, a anulação do acto da administração, central ou autárquica, que pudesse ser arguido de incompetência, usurpação ou desvio d poder, vício de forma ou violação de lei.
Onde a diferença avulta é justamente, na organiza cão da tutela administrativa.
Na verdade, nos regimes antidemocráticos é sempre assegurada ver ampla ingerência do Governo na esfera das atribuições das autarquias e na competência do seus órgãos, que lhe permite controlar e dirigir a administração local, ao sabor não só dos seus critérios de interpretação da legalidade, como dos seus juízos sobre a oportunidade ou conveniência do próprio acto administrativo.
Ao invés, em democracia, esta última apreciação cabe exclusivamente aos eleitores locais e a tutela tende a cingir-se a uma simples verificação da legalidade da acção administrativa, garantida por sanções cada vez mais jurisdiscionalizadas.
É que a democracia tem de assegurar não só o Poder Local, mas também a autonomia desse poder, precisamente expressa na independência dos órgãos autárquicos perante o Governo quanto à oportunidade ou conveniência do acto administrativo, de que só presta contas aos cidadãos locais.