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1956 I SÉRIE - NÚMERO 56

superintende, ao respeito pelos princípios da justiça e imparcialidade. Não será necessário invocar interpretação idónea para concluir, desde logo, que «a imparcialidade dos membros do Governo impõe-lhes o dever de abstenção de apreciar e decidir em matéria em que tenham interesse pessoal directo ou indirecto e é reforçado com um sistema de incompatibilidades próprio e um estatuto remuneratório especial, onde se acentua que aqueles não podem optar pela remuneração que auferiam pelo exercício dos cargos, público ou privado, que desempenhassem até à tomada de posse das funções governativas».
As iniciativas legislativas que apresentamos, e agora apreciamos, inserem-se neste âmbito e sequência e, por isso, visam no seu escopo essencial a criação de condições à realização da justiça imparcialidade e dedicação as funções no exercício dos cargos políticos e, noutra vertente, à consagração do princípio da igualdade dos cidadãos face à administração pública e aos órgãos de soberania.
É uma exigência da democracia, à qual a crítica social pode dar um contributo decisivo, obviar a que o epicentro do poder se localize num número limitado de decisões executivas que canalizem a sua influência em todas as direcções da política aos negócios ao desporto, aos media e, até, à cultura.
A democracia é policêntrica e é, sobretudo um regime transparente em que a informação clara dos comportamentos e das suas regras não pode conter obscuridades.
É ainda nesse sentido que o projecto de lei, sobre incompatibilidades dos membros do Governo prescreve um período de incompatibilidade temporário, ou impedimento, após a saída de funções de Governo para o exercício de determinadas funções privadas que se situam no âmbito do ministério a que se pertencera.
Tal solução, que não é inovadora na tradição legislativa portuguesa e no direito comparado, visa evitar o trânsito rápido de um ministério do Estado para as empresas que este tutela ou que com ele negoceiem, abrindo assim um inaceitável circuito rápido de favores e negócios encadeados ou, pelo menos, de suspeições legítimas.
Evidentemente que a salvaguarda dos princípios da independência e imparcialidade que constituem restrições explícitas do texto constitucional não podem denegrar o princípio da livre escolha da profissão e acesso à função pública, também ela consagrada na Constituição da República, mas tão-só condicioná-la em medida proporcionada à manutenção do conteúdo essencial desse direito.
Do que se trata de apreciar no diálogo é a conflitualidade entre bens jurídicos constitucionalmente protegidos, é a sua prioridade, ponderação de valores, adequação de soluções aos fins que se visam proteger. Não se diga, por isso que o decurso de um prazo, sem perda de funções, para regressar a certo tipo de actividade privada com as adequadas contrapartidas, corresponde a um limite desmesurado do direito ao livro exercício profissional.
Sem prejuízo de nos disponibilizarmos desde já, para os acertos de especialidade que os projectos apresentados possam merecer, consideramos que eles, no seu todo, sobre esta matéria correspondem a uma exigência fundamental de transparência e verdade do Estado democrático. Verdade esta que não pode continuar a ser comprometida dia-a-dia, quando não seriamente subvertida por uma acção governativa que consiste não em clarificar mas em ocultar, como tem ocorrido com o caso do Ministério da Saúde, o qual vem dificultando os princípios de transparência e as regras de isenção. Os factos demonstram-no, como o demonstra a nota hoje divulgada pela Procuradoria-Geral da República. Dela resulta que informações e resultados de inquéritos vêm sendo sonegados, quer ao conhecimento dos órgãos de controlo político, mas, igualmente, tem sido dificultado o seu acesso aos órgãos encarregados do controlo da legalidade democrática e até do exercício da acção penal, como é o caso do Ministério Público.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Não é possível a visibilidade dos actos dos governantes e dos titulares dos cargos públicos se não existirem regras precisas quanto ao conflito entre a representação do interesse público e do interesse privado.

Um titular de um órgão de soberania serve, e representa, por definição, o interesse público.
Nesta matéria não há meios caminhos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Deputado Alberto Martins, o primeiro problema que se levanta nesta repartição do debate sobre o Estatuto dos Deputados é que a Assembleia da República, desde o último debate sobre esses mesmos projectos que voltam hoje aqui para discussão deixou-os exactamente no mesmíssimo estado em que se encontravam quando transitaram daqui para a comissão. Isto é, a Assembleia esteve durante quatro meses sem adoptar qualquer acção no mandato que lhe tinha sido outorgado, para fundir ou fazer um estudo preliminar sobre todos esses projectos de modo a obter um consenso.
Toda a gente está lembrada de a bancada da maioria ter dito, pela voz do Sr. Deputado Carlos Encarnação, que faria o melhor para obter esse consenso e que na comissão especializada haveria de se chegar a um desiderato que fosse aceite por todos. Porém, a maioria, impávida e serena, vem hoje sem esse consenso, sem nunca o ter tentado sequer, apresentar e repor, outra vez, debaixo dos olhos dos deputados, os projectos de lei sem que tivesse havido qualquer alteração.
Todavia, os projectos de lei sobem novamente a Plenário numa altura particularmente azada, isto porque estamos a assistir como é que o tráfico de influências entre empresas e membros do Governo, o seu vaivém e rodopio, chamam mais a atenção para a instante necessidade deste problema e também para a necessidade de legislar sobre ele com a maior urgência possível.
Portanto, pergunto ao Sr. Deputado Alberto Martins, como é que justifica esta inércia dos dois grandes partidos. Ou seja, como é que a um, que é o autor da proposta e a outro, cujo concurso é absolutamente necessário para haver a aprovação ou a obtenção dos consensos, foi possível deixar cair no esquecimento todos estes meses, para hoje se apresentarem estes projectos de lei no mesmo estado virginal em que estavam.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Alberto Martins, há outros pedidos de esclarecimento, deseja responder já ou no fim?