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1962 I SÉRIE - NÚMERO 56

Contudo, uma conclusão é possível, desde já, tirar: enquanto os partidos da Oposição tomam a iniciativa em assunto de tão grande relevância para o regime democrático e para as instituições democráticas, a bancada governamental mantém um prudente silêncio em matéria propositiva.
Com uma excepção: onde se trata de encarar a «dignificação» do ponto de vista de acréscimos financeiros (que parece ser a única preocupação da bancada dos deputados que apoiam o Governo), aí é apresentado um projecto de lei.
Só que, Srs. Deputados do PSD, a apresentação deste vosso projecto de lei em matéria de dedicação exclusiva dos deputados (figura sobre a qual, na altura própria, tivemos oportunidade de manifestar as nossas reservas e críticas) reforça a necessidade de, com urgência, encarar de frente o problema das incompatibilidades no exercício dos mandatos. Aliás, ninguém compreenderia que se legislasse sobre dedicação exclusiva, deixando de fora, sem uma correcta e mais apertada tipificação legal, as situações não contempladas por tal regime.
Srs. Deputados, factos bem recentes - já os temos estado aqui indirectamente a comentar -, como é, por exemplo, o caso do escândalo que envolve a actuação do Ministério da Saúde, vieram confirmar a necessidade da adopção de medidas que, de um ponto de vista legal, permitam pôr cobro à actuação daqueles que, da titularidade de cargos políticos, têm a noção de auto-serviço e autobenefício e não da função de interesse público.
A postura hoje assumida pela ministra da Saúde, em conferência de imprensa, em nada contribui para a necessária moralização da vida política. Não é tentando fugir ao apuramento da verdade, Srs. Deputados, silenciando os casos concretos, imputando a outros responsabilidades que não se querem ou não se podem assumir que podemos avançar no esclarecimento dos factos.
Esta tentativa de salto em frente não resulta! Bem pode o Primeiro-Ministro pôr-se em bicos de pés, bem pode declarar o que entender sobre a honorabilidade da sua equipa. O que está em causa é apurar a razão que leva o Governo a manter a atitude de sonegação do conhecimento desta Assembleia da República e da própria opinião pública dos resultados do inquérito realizado, dos atrasos no fornecimento à Procuradoria-Geral da República, designadamente do relatório da Inspecção-Geral de Finanças sobre as irregularidades praticadas na gestão do Ministério da Saúde.
Onde está, Srs. Deputados, a transparência na gestão dos assuntos públicos? Não está, Srs. Deputados do PSD, mas tem de passar a estar!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já aqui dissemos - mas é importante que reafirmemos - que o PCP participa neste debate com uma preocupação central: contribuir para a dignificação do exercício do mandato dos titulares de cargos políticos e, por esse modo, para a própria dignificação dos órgãos de soberania.
Pontos essenciais para que uma tal dignificação se torne possível são, naturalmente, a moralização do exercício dos cargos, a transparência da intervenção e a garantia da independência face aos poderes económicos.
O debate que ora travamos não esgota, contudo, todas as questões que se relacionam com um mais eficaz exercício dos mandatos, designadamente dos mandatos dos deputados. Há muito, muito mais para fazer: desde logo, importa dar uma resposta urgente e eficaz às precárias condições em que somos forçados a desenvolver a actividade nesta Casa; há que levar mais longe as capacidades de intervenção dos deputados reforçando, nomeadamente, os respectivos poderes e meios de contacto com os cidadãos; há que assegurar um efectivo acesso à informação, impedindo limitações e discriminações absolutamente arbitrárias que põem em causa o próprio poder de fiscalização da actividade do Governo e da administração; há que recriar, no fundo, as condições que permitam a realização de verdadeiros debates políticos, hoje tão limitados por obra do «regimento-rolha-laranja».
São temas e problemas que não poderemos descurar ou menosprezar e aos quais não deixaremos de voltar a curto prazo.
Mas cinjamo-nos, Srs. Deputados, neste momento, à problemática das incompatibilidades.

No projecto de lei comunista está devidamente tipificado um regime de incompatibilidades para o exercício do mandato de deputado que visa assegurar que ele não venha a estar sujeito a quaisquer pressões de carácter económico ou laborai as quais, por qualquer forma, poderiam impedir ou tolher a sua livre e consciente actividade.
Idênticas preocupações são a nota dominante dos demais projectos de lei dos partidos de Oposição hoje em análise, quer quanto ao exercício do mandato dos deputados, quer quanto ao dos membros do Governo.
O Grupo Parlamentar do PCP, mais uma vez manifesta a sua concordância, na generalidade com as soluções propostas, dado que todos têm como objectivo último moralizar, dar transparência e impedir abusos no exercício do mandato dos titulares de cargos políticos. Projectos de lei como os ora em debate dignificam os órgãos de soberania perante a opinião pública, reforçam a nossa democracia.
Aproveito esta oportunidade para relembrar que o meu partido, ciente da importância da matéria em apreciação, apresentou, em sede de revisão constitucional, uma proposta para que as características essenciais do regime de incompatibilidades dos membros do Governo viessem a constar do próprio texto da lei fundamental. É matéria a que, seguramente, voltaremos na altura própria, mas que não poderia deixar de ser trazida à colação no presente debate.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Importa recordar que se encontra pendente há meses, para apreciação, por esta Assembleia, uma proposta de iniciativa legislativa de Alta Autoridade contra a corrupção, nos termos da qual se prevê que os casos de aceitação de presentes ou donativos por parte de titulares de cargos políticos ou de funcionários da administração voltem a estar abrangidos por norma de legislação penal que os proíba e condene, como sucedia com o Código Penal de 1886.
Convirá, ainda, lembrar que a Alta Autoridade nos alertou - e já lá vão meses, Srs. Deputados! - «para formas subtis e de difícil detecção do fenómeno da corrupção» como sucede, por exemplo, em casos de «aproveitamento de ocasiões festivas para se oferecerem, sob o manto de usos e costumes e sob a forma disfarçada de ofertas desinteressadas, presentes - alguns de elevado valor - que têm subjacentes interesses não relevados mas que visam intervir no exercício do poder funcional de decisão».
Remeto os Srs. Deputados, designadamente os do PSD, para a leitura desta proposta do alto comissário, bem como para a vasta documentação anexa que