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3536 I SÉRIE - NÚMERO 74

É que me parece que a Constituição passa a conceder a todos nós o direito de nos queixarmos. Não regula o nível do nosso clamor, não diz se nos podemos queixar baixinho ou em altos gritos ou rasgando as vestes, mas diz, sim, que nos podemos queixar sempre e quando quisermos, podendo até exercer o nosso direito de acção popular. Mais ainda: que podemos requerer, pedir, solicitar e implorar que o lesado - que podemos ser nós ou outros - tenha direito à correspondente indemnização.
Mas, Sr. Deputado Vera Jardim, não será isto um direito aberto, - passe o termo - um direito que, depois, não tem consumação prática? Que decorre, afinal, disto? É certo que nos podemos queixar, é certo que podemos requer, é certo que podemos implorar... E depois? Onde está a consagração do dever de quem tem que positivar, na prática, o exercício deste direito.
Na tentativa de procurar dar resposta a estas questões, é que no nosso projecto pretendíamos consagrar o dever de os órgãos de soberania e das autoridades darem resposta em tempo útil às petições que lhes sejam dirigidas. Porque, caso isto não fique consagrado, como parece não vir a acontecer, o que é que decorre deste novo direito que tão alargado foi? Fica, enfim, alargado no sentido de podermos requerer, mas fica, também, com a mesma estreiteza quanto à possibilidade de os cidadãos requerentes poderem vir a obter aquilo que, de facto, eventualmente possam vir a ter direito.
Não lhe parece, Sr. Deputado, que falta aqui qualquer coisa, ou melhor, que falta fechar este circuito? Até porque isto já acontece um pouco, hoje em dia, com o nosso direito, enquanto deputados, de dirigir requerimentos a todas as entidades. Mas se essas entidades não nos responderem e nos «mandarem às favas» - o que sucede com frequência -, o que é que lhes acontece? Pura e simplesmente sucede que esse facto vem publicado de seis em seis meses no Diário da Assembleia. Mas quem é que lê o Diário da Assembleia? Será isso castigo para essas entidades que sistematicamente se recusam a cumprir essa obrigação?
Portanto, não seria melhor consagrarmos numa norma a obrigação de as entidades requeridas darem resposta e em tempo útil, pois, como todos sabemos, nestas coisas o tempo também conta. Não seria melhor terem os partidos votado favoravelmente e não terem-se abstido em comissão, nomeadamente o Partido Socialista, a propósito da nossa proposta de aditamento de um n.º 3, que consagrava, de facto, a obrigação de as entidades darem resposta, em tempo útil, aos peticionários.

A Sr.ª Presidente: - O Sr. Deputado Vera Jardim deseja responder já ou no final?

O Sr. Vera Jardim (PS): - No fim, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado Vera Jardim, registo a importância que V. Ex.ª atribuiu às modificações propostas para o artigo 52.º, que versa o direito de petição e acção popular, e aos resultados dessas modificações, que V. Ex.ª sublinhou.
Nesse sentido, pergunto-lhe se no que respeita ao direito de petição e representação dirigido à Assembleia da República, que foi proposto pelo Partido Socialista, em tempos que considero bastante diferentes daqueles que acabaram por ser consagrados na Comissão Eventual para a Revisão Constitucional, V. Ex.ª não entende que os termos da proposta da CERC descaracterizam, fundamentalmente, aquilo que foi proposto pelo Partido Socialista. Isto é, onde o Partido Socialista cometia à lei a fixação dos requisitos mínimos de responsabilidade, a CERC comete à lei em geral a fixação das condições em que a Assembleia da República apreciará as petições e representações populares.
Não acha, portanto, V. Ex.ª que para a importância que acabou de atribuir a este direito instrumental, como muito bem sublinhou, esta diferença não é, efectivamente, uma diferença descaracterizadora?

A Sr.ª Presidente: - Para responder, se o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Vera Jardim.

O Sr. Vera Jardim (PS): - Começarei pelo Sr. Deputado Nogueira de Brito, não por ter sido o último mas porque levantou uma questão, porventura, de âmbito mais vasto.
Sr. Deputado Nogueira de Brito, frisei na minha intervenção que a proposta final oriunda da CERC não corresponde inteiramente àquilo que era o nosso projecto inicial.
Contudo, também estamos dispostos a aceitar que o nosso projecto, cheio de boa vontade como era, poderia ter, em termos da própria interpretação do texto constitucional, algumas dificuldades. Desde logo, nos tais requisitos mínimos de representatividade que teríamos de deixar para a lei. Esses que V. Ex.ª citou já eram deixados no nosso projecto - e não podemos esquecê-lo - para a lei regulamentadora. Não é, naturalmente, na Constituição que se vai dizer quais são os requisitos mínimos de representatividade.
Por outro lado, tínhamos pensado numa comissão especializada da Assembleia que apreciasse, numa primeira fase, esse direito de petição.
Pensamos que a proposta final da CERC, ao deixar para a lei, não amputou, apesar de tudo, substancialmente, o nosso projecto porque - repito - no que diz respeito à representatividade não encontramos outra forma, nem supomos que seja facilmente encontrável, de incluir no texto constitucional esses requisitos mínimos. No que diz respeito à comissão especializada, na parte respeitante às funções da Assembleia da República, num artigo, lá mais para diante, vem fixada essa comissão especializada para análise das petições.
Sr. Deputado Herculano Pombo, o direito nem sempre se compadece com todas as nossas boas intenções. Poderá V. Ex.ª encher os códigos e também as constituições de frases que podem parecer muito eficazes, dizendo que se terá de dar uma decisão em tempo útil, que as autoridades terão que em tempo útil ou rapidamente, etc, não é por aí, Sr. Deputado, infelizmente, que se resolvem os problemas.
Os nossos códigos estão cheios de frases desse tipo e só quem anda pelos tribunais sabe que as medidas urgentes se transformam rapidamente em medidas de muitos meses ou anos.