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11 DE MAIO DE 1989 3707

O que deve haver é justiça fiscal: aqueles que mais ganham mais impostos devem pagar. Aí é que a justiça era feita!

O Sr. Rui Machete (PSD): - Só aí?

O Orador: - Também fiquei a saber que o Sr. Deputado considerava que a Pastoral da Saúde era ignorante. Mas esse é um problema do Sr. Deputado e da Pastoral da Saúde!
Na verdade, o que nós defendemos é o seguinte: se hoje o direito à saúde já encontra muitos obstáculos, depois da Revisão Constitucional não os verá diminuídos, se esta norma vier a ser aprovada.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como temos a consciência tranquila em matéria de problemas de saúde, porque sempre fomos defensores da saúde para todos os portugueses, podemos falar sobre estes problemas com uma certa calma. Temos que reconhecer que neste debate que está a ser travado algumas coisas têm sido ditas com acerto e outras como produto de um pouco de exaltação e de defesa um tanto radical de certos princípios.
Quando criámos a Lei de Bases do Serviço Nacional de Saúde introduzimos a noção das taxas moderadoras para racionalizar os serviços e para evitar certos consumismos enquanto fosse necessário fazê-lo. Já nessa altura admitimos que o serviço não era totalmente gratuito, mas que caminharia para isso.
Falou-se aqui na primeira volta do debate na Comissão Eventual para a Revisão Constitucional. Já nessa altura eu disse o seguinte, a propósito dos custos: «De facto, ao dizer que queremos socializar, pretendemos que tal socialização incida sobre os custos, cuidados médicos e medicamentosos. Se defendemos a tendência para a gratuitidade destes cuidados, isto está totalmente de acordo com essa nossa afirmação.» Isto é para responder um pouco à ideia que hoje foi levantada no sentido de que teria havido uma certa contradição entra a nossa primeira e a nossa segunda intervenção, depois do acordo feito.
Não me custa nada repetir aquilo que tem sido dito pelos meus colegas de bancada e que tem conduzido à discussão e o debate sobre a revisão da Constituição. Naturalmente que a Constituição que vai sair desta revisão não será a do PS, mas é muito próxima daquilo que sempre desejámos e que propusemos.
Portanto, a Revisão Constitucional será feita por consenso de todos os partidos e há-de tentar traduzir a vontade da grande maioria dos portugueses, de tal modo que não impeça que qualquer partido que assuma o poder possa fazer cumprir os seus programas, desde que eles tenham sido votados e aprovados pela maioria do povo português.
Naturalmente que a introdução da frase «tendencialmente gratuito», que tem sido aqui objecto de tanta discussão, para nós tem apenas um significado: é que a tendência que já vinha sendo aplicada e reconhecida vai continuar sem retrocesso. Portanto, caminharemos para a gratuitidade do Serviço Nacional de Saúde.
Aliás, ninguém pode deixar de reconhecer que nesta Revisão Constitucional defendemos a manutenção do Serviço Nacional de Saúde. Inviabilizámos propostas que tenderiam a eliminar o Serviço Nacional de Saúde, deixando-o entregue a uma regulamentação a estabelecer por lei, o tal sistema nacional de saúde. Continuámos a defender o Serviço Nacional de Saúde universal, geral e com tendência para a gratuitidade, não havendo, pois, nenhuma incoerência da nossa parte. A nossa interpretação é esta e será sempre esta!
Quando se diz que é injusto os ricos terem os mesmos benefícios que os pobres, reconhecemos que seria injusto se isso fosse aplicado. Porém, o que é verdade é que, saindo o dinheiro para financiar o Serviço Nacional de Saúde dos impostos cobrados pelo Estado aos cidadãos, entendemos que, se houver necessidade de corrigir assimetrias ou distorções, é através da via fiscal que ela deve ser aplicada e não devem ser os cidadãos a pagar nos pontos de contacto, isto é, não deve ser nos locais onde lhes são prestados os cuidados médico-hospitalares que eles deverão fazer qualquer espécie de pagamento.
Também reconhecemos que a introdução da frase «de acordo com a capacidade económica de cada um» tem um significado bem claro. É que ela impedirá a aplicação indiscriminada das taxas moderadoras e permitirá, desde já, suprimir todas as taxas para certas classes que tenham menores rendimentos. Esta é a nossa interpretação e pareceu-nos ver por parte do PSD uma interpretação neste sentido.
Em relação aos problemas da medicina privada devo dizer que sempre advogámos a existência de uma medicina privada, pois nada temos contra ela. Porém, não concordámos e inviabilizámos que ficasse na Constituição, com os incentivos à medicina privada, porque receávamos que isso levasse o Estado a desobrigar-se nesta matéria. Isto é, o Serviço Nacional de Saúde tem o suporte do Estado e o facto de incentivar uma medicina privada poderia levar o Estado a refugiar-se numa prática que o libertasse dos seus encargos e das suas obrigações.
Aliás, no texto da Constituição que existe neste momento nada impede que se possa recorrer à medicina privada e nada impede que o próprio Governo, se o desejar, possa fazer com que os cidadãos paguem a medicina. Basta para isso reduzir os investimentos, basta deixar degradar os serviços de tal modo que as pessoas que têm dinheiro fujam desses serviços e vão cair na medicina privada.
O que continuamos a defender é a existência de um Serviço Nacional de Saúde eficaz, dotado de todos os meios para prestar aos cidadãos os cuidados médico-
-hospitalares mais sofisticados, mais modernos e mais eficientes. Porém, se além disso os cidadãos querem recorrer à medicina privada, são livres de o fazer. O que o Estado não deve é suportar esses encargos. Sempre defendemos isso é continuaremos a defendê-lo.
Contudo, também aceitamos que enquanto o Estado não tiver os serviços oficiais dotados de toda a capacidade de resposta para prestar esses cuidados, nada impede que o Governo faça acordos com algumas instituições privadas no sentido de que esses cuidados sejam prestados a todos os cidadãos. Só nessa altura
- e isso deve ser uma excepção - é que aceitaríamos que as verbas do Serviço Nacional de Saúde sejam transferidas para a iniciativa privada.
Pensamos que o texto, tal como irá ser aprovado - creio que obterá os votos necessários para ser aprovado
-, não vem, de forma alguma, colocar-nos numa situação de confronto com as atitudes que assumimos