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11 DE MAIO DE 1989 3719

memória colectiva, que é importante e foi fundamental para a sobrevivência de milhares de portugueses e que continua a sê-lo, infelizmente, em muitos casos, basicamente porque o Serviço Nacional de Saúde, coitado, não chega a todo o lado nem tem pernas para andar. Ou seja, não tem verbas e, sobretudo, não tem vontade política que o ponha a mexer.
Por isso, se hoje em dia ainda se vai à bruxa, se ainda se faz o chá de tília com mais frequência do que era necessário a culpa não é só das pessoas que acreditam em crendices, mas talvez de quem tem a obrigação de implementar o Serviço Nacional de Saúde e o não faz.
Eram estas brevíssimas referências que queria fazer a propósito das nossas propostas em relação ao artigo 64.º

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Do que gosto é da infusão do eucalipto!

Risos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Raul Castro (Indep): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A discussão em torno do artigo 64.º implica, necessariamente, a concepção que tem deste mesmo preceito constitucional a política que vem sendo desenvolvida pelo Governo Cavaco Silva, através da Sr.ª Ministra da Saúde, Leonor Beleza, com o apoio e o aplauso, naturalmente, do Chefe do Governo e dos seus pares, que com ela concordam.
Ora, a política que tem vindo a ser feita pelo PSD, em matéria de saúde, é caracteristicamente mercantilista, mais própria de um Ministério do Comércio do que de um Ministério da Saúde, caracterizada pela preocupação essencial de aumentar as receitas e diminuir as despesas. Deste modo, a Ministra Beleza, do Governo Cavaco Silva, retira comparticipações e muitíssimos medicamentos, desmantela o sanatório ortopédico de Vila Nova de Gaia com a ideia de vender os valiosos terrenos que o integram, para o que chegou a apresentar um plano de urbanização nessa Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia; procura, até vender o Hospital Júlio de Matos pondo fim à sua existência; encerra diversos serviços hospitalares, nomeadamente urgências, e nomeia administradores com a habilitação especial de serem da cor «laranja».

O Sr. José Magalhães (PCP): - Coincidência!

O Orador: - Com esta habilitação especial os administradores podem, o que naturalmente nos causa espanto, chegar ao ponto de dizer, como aconteceu com o administrador do Hospital de São João do Porto, que, desde que iniciou funções, já realizou uma importante economia. Em quê? No papel higiénico que se gastava no Hospital de São João do Porto.
Isto significa que a política seguida, mesmo na vigência do artigo 64.º, é naturalmente inconstitucional, porque despreza a característica do Serviço Nacional de Saúde e pratica aquilo que, no fundo, o PSD defende no seu projecto. Isto é, um sistema de saúde que seria um puro sistema mercantilista.
Como é natural, isto tem provocado críticas de todos os sectores, e hoje de manhã foi até aqui referido que numa Pastoral da Igreja se manifestou a maior preocupação com as alterações introduzidas no artigo 54 o
Estranhamente, o Sr. Deputado Rui Macheie surpreendeu-me ao afirmar que a Igreja sabia pouco ou nada de finanças. Bom, devo dizer ao Sr. Deputado que se a Igreja não sabe o exemplo vem do alto, porque, como dizia Fernando Pessoa, Jesus Cristo não sabia nada de finanças.

Vozes do PCP: - Bem focado!

O Orador: - De qualquer modo, o curioso é que esta política, paralelamente às privatizações a 49%, que é a política que o Governo para já pode fazer com a norma constitucional, conduz a este resultado: é que, em anúncios de uma página - e com isto respondo também à defesa do preceito que o PSD e o PS pretendem introduzir, quanto a um sistema tendencialmente gratuito que teria em vista objectivos de justiça social - constava «e se o hospital, a clínica, os médicos de que precisamos não estão ao alcance dos nossos recursos económicos?» Perante esta pergunta a respectiva seguradora afirma «há o seguro de saúde e o seguro de despesas de hospitalização».
Numa revista publicada o mês passado, uma directora de uma seguradora afirmou, chamando ao Serviço Nacional de Saúde, sintomaticamente, com a linguagem do PSD, o Sistema Nacional de Saúde, que para este ano se previa que o seguro de despesas de hospitalização atingisse um volume de negócios que se cifrará em um milhão e oitocentos mil contos. E porquê? Por causa da ineficácia do Serviço, diz ela, do Sistema Nacional de Saúde. Isto é, o Governo PSD, através do Ministério da Saúde, criou uma tal política de saúde que as próprias seguradoras já estão a beneficiar e estão largamente esperançadas em que no futuro esses benefícios venham ainda a ser maiores.
De tudo isto podemos concluir que se com o actual artigo 64.º o Serviço Nacional de Saúde, é o que se vê, em que as seguradoras já falam num movimento de um milhão e oitocentos mil contos, o que será depois da alteração do artigo 64.º com a introdução da expressão «tendencialmente gratuito».
Num fórum de defesa da Constituição, um conceituado médico de Lisboa classificou bem o problema da expressão «tendencialmente gratuito», dizendo que, no fundo, o que se deveria dizer é que o Serviço Nacional de Saúde passaria a ser um serviço tendencialmente pago. No fundo, é isso que resulta da disposição da lei. Esta poderá eventualmente não ser a interpretação que mais agrada ou que defende o PS, mas é aquela que consta do acordo que fez nesta matéria. Isto é, numa matéria que é das mais importantes da Revisão Constitucional e que irá ainda abrir o campo a mais uma descarada violação dos próprios termos constitucionais.
Por isso, o que está em causa é o interesse de milhares e milhares de portugueses, que já estão a ser prejudicados com a política de saúde do Governo Cavaco Silva e da Ministra Beleza, que procura, naturalmente, encobrir os malefícios reais da sua política atirando as culpas e perseguindo os médicos, o que é, efectivamente, um expediente fácil para grangear a simpatia