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11 DE MAIO DE 1989 3721

o aparecimento destes esquemas, produto da iniciativa privada e da solidariedade social destinados a assegurar a protecção da saúde, não deve ser o produto de um encarecimento ou de uma diminuição da qualidade do serviço público.
O pagamento de importâncias contra a prestação de serviços no serviço público de saúde, devem, em nosso entender, desempenhar apenas um papel de moderador da utilização desses serviços, quando isso se mostre efectivamente necessário.
Foi na base desta concepção que apresentámos a nossa proposta, que prevê apenas a existência de um serviço público, sem qualificativos, e a existência de esquemas privados de resposta à necessidade de protecção da saúde. Foi esta a intenção da nossa proposta e é com este espírito que votaremos, porventura, as alterações e aquilo que acabou por ser assumido como proposta da CERC. Entendemos que alguma coisa nessa proposta se encaminha nesse sentido, e isso será decisivo na ponderação do nosso voto.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não só a bancada do PSD como também a do PS insistiram em não deixar inteiramente transparente qual seja o alcance desta mudança do texto constitucional, em relação à questão da gratuitidade.
O debate da parte da manhã permitiu, até que o Sr. Deputado Rui Machete procurasse, pelo caminho, ver na nova alusão constante vossa versão no texto constitucional, «à socialização dos custos dos cuidados médicos», a «instauração de condições de igualdade, de vivência competitiva que acabariam com o carácter residual da medicina privada», que consagrariam a igualdade de oportunidades», etc.

O Sr. Rui Machete (PSD): - Essa agora!

O Orador: - São tudo conceitos, porventura, simpáticos, dado o tom gentil com que o Sr. Deputado Rui Machete os pronunciou, mas que não têm arrimo nenhum no texto constitucional, tal qual ele resultou, designadamente do debate da CERC. Há já da parte do PSD, aparentemente, uma tentativa de fazer duas coisas: em primeiro lugar, confundir e tresler o conteúdo da norma atinente à cláusula da gratuitidade; em segundo lugar, ler já, em, normas constitucionais, cujo significado, apesar da mutação, não se confunde com o que decorreria dos projectos do PSD, objectivos e conquistas que o PSD sonharia ter e não tem.
A cláusula relacionada com a socialização dos custos médicos é um bom exemplo disso. A medicina privada, no texto actual ou mesmo na redacção indiciada, tem, entre nós, uma função social. Há uma imposição constitucional de limitação da liberdade de empresa nos sectores da medicina e das indústrias farmacêuticas e outras. Isto consta da alínea competente do texto constitucional, que não sofre a mínima alteração. Portanto, todas as interpretações jubilantes, de foguete ao ar, assentes no facto de a «socialização da medicina», (esse
fantasma negro, que perturbava as noites dos deputados do PSD), ser substituída pela expressão «socialização dos custos dos cuidados médicos», não tem razão de ser.
Mas a questão fundamental é a atinente à famosa cláusula misteriosa sobre a gratuitidade tendencial. Isso coloca, de facto, a necessidade de algumas pesquisas.
Trocámos aqui impressões na nossa bancada e fizemos, há poucos minutos, uma rápida passagem por alguns dos dicionários da biblioteca da Assembleia da República, porque um dicionário sempre ajuda, sobretudo quando nalgumas mentes os conceitos andam confusos.
Quanto ao que seja «gratuito», toda a gente sabe o que é. O Dicionário de Morais é muito preciso: «gratuito - concedido ou feito de graça sem pagar; grátis»; o Cândido Figueiredo não diz outra coisa: «concedido ou feito de graça».
Quanto ao «tendencial», o que é isto de «tendencialmente gratuito»? Para já «tendencial» é um adjectivo galicista, não existe nos dicionários portugueses e a Revisão Constitucional fará galicismo grosso com a sua introdução da Constituição. Admitamos que o francês, informa o Larousse, «tendencial» quer dizer «o que marca uma tendência, uma orientação da evolução de um fenómeno». Diz-se, por exemplo, «lei tendencial».
Então, aqui haveria uma gratuitidade tendencial. O Serviço Nacional de Saúde (SNS) terá uma tendência, uma orientação para a gratuitidade. Será isto? Mas em português o que é «tender»? Dizer-se que o SNS é «tendente», significa o quê? «Tender» é, segundo nos informa a Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, «dirigir-se, encaminhar-se, propender». «Todos os corpos tendem para o centro da terra» ou, noutra versão, «a máquina da governação tende e domina a civilização, mas não civiliza ela», dizia o grande Garrett nos discursos parlamentares, pp. 408. É isto? O Serviço Nacional de Saúde tende para a gratuitidade, no sentido em que o grande Garrett falava da máquina da governação que caminha para a civilização? Ou será antes o «tendente» no sentido em que falava o grande Fernão Lopes? O SNS tende à gratuitidade como no dicionário se fala em «meios tendentes à ruína da sua saúde; ventos ou monções tendentes que levarão ao porto destinado e são tesos e contínuos».

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Tesos são!

O Orador: - Será isto o que devemos ver no «tendentes à gratuitidade»? Ou será ainda, outro o significado, este: «ter tendência, inclinação, disposição para alguma coisa». «No seu movimento ascensional as línguas tendem a tornar-se cada vez mais sintéticas», e o SNS «tende» a tornar-se cada vez mais gratuito (esta é a tese do Sr. Deputado Ferraz de Abreu, aparentemente!)
Perguntamos, Srs. Deputados: em que é que ficamos? No Dicionário de Morais, na Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, no Larrouse de bolso, no Dr. Ferraz de Abreu, no Dr. Vitorino, no Dr. Almeida Santos ou no, agora ausente, Dr. Luís Filipe Menezes, que também terá de fazer o seu dicionário sobre «gratuitidade tendencial» ou sobre o conceito de «tendencialmente gratuito»?
É uma solução, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que não nos pode satisfazer. Hão-de VV. Ex.ªs ter de se