20 I SÉRIE - NÚMERO 1
primeiro lugar, criou o problema dos inquéritos parlamentares foi a oposição, quando «desatou» a pedir, por tudo e por nada, inquéritos parlamentares sobre muitas matérias em que era inevitável que as conclusões não iriam dar razão às acusações.
O primeiro mecanismo de desvalorização dos inquéritos parlamentares foi a sua utilização para fins de propaganda política, como obviamente sucedeu desde o primeiro inquérito parlamentar desta legislatura, o inquérito sobre o não pagamento de verbas pelo Casino do Estoril. Logo, inevitavelmente, as conclusões foram as que tinham que ser! Portanto, o primeiro motivo de desvalorização dos inquéritos parlamentares foi o seu abuso para matérias que, em condições normais, não teriam nenhuma fundamentação fora do Parlamento e que desde o princípio foram utilizadas como mecanismo de acusação política ao Governo. Portanto, inevitavelmente, não é de surpreender algumas das conclusões desses inquéritos.
O segundo aspecto tem a ver com a acusação permanente, e penso que injusta, à maioria de utilizar instrumentos para monopolizar o inquérito parlamentar. Só chamo a atenção do seguinte: a grelha de tempos para os próximos debates parlamentares é sistematicamente desfavorável não só às relações entre a maioria e as oposições como à própria capacidade de intervenção dos deputados da maioria. Por exemplo, na grelha A de atribuição de tempos, o PSD e o Governo tom 120 minutos e a oposição 155. Qualquer outra grelha mantém uma desproporção considerável entre aquilo que é a percentagem de pessoas e a percentagem de resultados eleitorais e a sua capacidade de intervenção no Parlamento.
Por outro lado, na análise das fontes de dificuldades e de algum desprestígio da instituição parlamentar, o Sr. Deputado não foi tão longe como nós gostaríamos que fosse. Não é apenas o Governo, não somos apenas nós próprios que somos responsáveis por alguma desvalorização da instituição parlamentar. É também a forma como o sistema político se instituiu em Portugal, a forma como os partidos tiveram necessidade - por razões que, aliás, têm a ver com o mecanismo de implantação da própria democracia- de ler um papel na vida política portuguesa, papel esse que o funcionamento das instituições democráticas hoje talvez não justifique. Ou seja, há mecanismos de controlo da vida parlamentar, através da vida política e partidária - e isto é verdade para o Governo e para a oposição-, que hoje não são necessários nem correspondem ao desenvolvimento da vida da nossa democracia e que, portanto, poderão ser vistos, alterados e melhorados por nós.
O espírito da sua intervenção é aceitável. Pensamos que ela introduz um estilo de intervenção parlamentar para o qual estamos inteiramente abertos e queremos participar nesse debate político. Porém, gostaria de chamar a atenção para estas divergências particulares, visto que o tempo não me permite falar delas.
A Sr.ª Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sr. Deputado António Barreto, ouvi com muita atenção e até com muito interesse a reflexão que aqui fez para apresentar um conjunto de propostas de alteração ao funcionamento da Assembleia da República, por parte do Partido Socialista. Não tive ainda ocasião de ler as vossas propostas, mus, na verdade, a reflexão suscitou-me muito interesse.
Em todo o caso, quero colocar-lhe algumas questões.
Sem dúvida alguma que um dos pontos mais frágeis do actual Regimento da Assembleia da República é o que tem a ver com a área das competências fiscalizadora, e penso que isso é uma fragilidade do próprio regime democrático, como está presentemente configurado. Portanto, as relações entre a Assembleia da República e o Governo são pesadas, pouco ágeis e pouco adequadas a dar resposta aos acontecimentos da vida moderna.
O instituto das perguntas ao Governo, tal como o temos actualmente, é uma figura que não se presta a qualquer esclarecimento, que não resolve qualquer problema.
Bom, se o instituto das perguntas ao Governo fosse outro, a matéria que tem seguido para inquéritos parlamentares poderia muito bem ter sido dirimida, aqui, com o Governo. Isto é, poder-se-ia ter chamado o Governo para perguntas sobre essa matéria. Logo, as questões que se têm colocado, com premência, na opinião pública teriam sido resolvidas aqui com a facilidade e em cima dos acontecimentos, com grande proveito para o País e para o próprio regime democrático.
Por outro lado, as interpelações rápidas - uma outra ideia que tem sido discutida entre nós, não de uma maneira efectiva mas que tem sido levantada por vários deputados-, como todas as formas de fiscalização da acção governativa, parecem-me ser extremamente importantes. Mas penso, Sr. Deputado António Barreto, que se tem encontrado uma total indisponibilidade, por pane da maioria governamental, para dialogar e aprofundar estas questões, mesmo as que trazem notória vantagem para o Governo. E aqui refiro-me a um outro estatuto de perguntas ao Governo.
Em nenhum outro parlamento do mundo existe um instituto de perguntas ao Governo como o que temos entre nós. Portanto, quando os nossos colegas deputados cá vêm e lhes contamos como são feitas, em Portugal, as perguntas ao Governo, pasmam perante a ineficácia de tal sistema.
O Sr. Silva Marques (PSD): - E lá fora como é?!
O Orador: - Ora bem, o Governo e a maioria governamental têm mostrado uma total indisponibilidade para discutir e para aumentar os poderes de fiscalização da Assembleia da República. Tenho-me empenhado nessa questão, tenho-a suscitado várias vezes em conferência dos presidentes dos grupos parlamentares e o que encontro, do lado da maioria - e ainda agora, aqui, as primeiras reacções foram nesse sentido-, é uma total indisponibilidade para considerar tais ideias.
Como é que o Sr. Deputado António Barreto pensa que se pode viabilizar um debate que envolva a própria maioria parlamentar e que a leve a sair do imobilismo em que está colocada relativamente a esta questão?
Como sabe, estes problemas estiveram em discussão durante a revisão constitucional e creio que a revisão da Constituição não se saldou por um aumento das competências fiscalizadoras da Assembleia da República. Penso até que aconteceu o contrário, no que toca, por exemplo, ao instituto das ratificações, porque hoje ele está mais dificultado, ou seja, o Governo ganhou mais espaço, a Assembleia da República perdeu poder de intervenção. Creio que aí se perdeu uma grande oportunidade e que o Partido Socialista tem responsabilidades nisso. O Partido Socialista tem responsabilidades no facto de a revisão da