3 OE NOVEMBRO DE 1989 279
... V. Ex.ª disse-me que não era partido quando o general Eanes era anterior inquilino de Belém. Penso que ouvi bem. Sendo assim, que sentido tem esta sua objecção, perante a maneira como acabou, e muito bem, o seu discurso, de que esta alteração deve ser introduzida em função do Presidente da República, órgão de soberania, qualquer que seja o seu ocupante real, e não em função da concreta personalidade que, em qualquer momento, se senta nos cadeirais de Belém.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.
O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr. Deputado Carlos Encarnação, é evidente que, ao nível do discurso - e uma coisa é o discurso, outra coisa são as acções em concreto -, não faria, naturalmente, a injúria ao Sr. Deputado nem ao PSD, como partido político maioritário que é, de dizer que, em termos da afirmação, pretendem, de qualquer modo, toldar o relacionamento institucional dos vários órgãos de soberania. Mas uma coisa, de facto, é a teoria e outra coisa é a prática. E quer o Sr. Deputado Carlos Encarnação queira quer não, é evidente que admito que pode haver, como, aliás, deixámos entender na nossa primeira intervenção sobre esta matéria, objecções sob o ponto de vista técnico relativamente ao texto e, portanto, passível de, naturalmente, ser reformulado em sede de comissão.
Mas, Sr. Deputado Carlos Encarnação, de facto, do seu discurso não transcrevi nada. Peço imensa desculpa, mas não transcrevi nada daquilo que V. Ex.ª disse. Repito, da parte do seu discurso não transcrevi nada. Transcrevi, sim, e só na parte final, a intervenção do Sr. Deputado Almeida Santos.
Porém, Sr. Deputado Carlos Encarnação, devo dizer-lhe que o que fiz, e que proeuro fazer sempre nas minhas intervenções, foi ler, com muita atenção, aquilo que os vários intervenientes sobre esta matéria disseram. E, de facto, também li, com a mesma atenção, tudo aquilo que o Sr. Deputado Carlos Encarnação tem produzido sobre a mesma matéria. Aliás, também li o que disse o Sr. Deputado Adriano Moreira, que, inclusivamente, me ajuda a dizer o seguinte: que -r- parafraseando, como o Sr. Deputado Adriano Moreira parafraseou, o general De Gaulle - relativamente às questões de intendência, parece objectivamente que o PSD, neste aspecto, está a colocar as questões de intendência à frente das questões de princípio. Até porque nós ainda nos não entendemos, se calhar, relativamente àquilo em que estamos de acordo, relativamente ao princípio. Assim, em termos constitucionais, estamos de acordo que o Presidente da República é um órgão de soberania, é um órgão que deve ser dignificado. Isso também ninguém contesta. Mas o problema é saber como é que nós vamos fazer, que elementos é que vamos carrear para dignificar, neste aspecto, o órgão de soberania.
Relativamente a esta mesma questão, os elementos práticos que têm vindo da parte do Partido Social-Democrata, embora muito bem rodeados de floreados, são, um pouco, na minha perspectiva e em termos políticos, a questionar e a adiar a solução deste problema. E, tal como o Sr. Deputado Carlos Encarnação pretende, nós não queremos dizer que se está a empolar uma questão que não tem razão de ser; que do ponto de vista político todos nós estamos de acordo com a dignificação do Presidente da República; que isto são questões de mera ordem técnica.
Ora, isso não é verdade, Sr. Deputado Carlos Encarnação. E creio que, de uma forma lapidar, o Sr. Deputado Almeida Santos, subscritor número um do projecto, quer hoje, quer na sua primeira intervenção, quer ao nível dá discussão, quer ao nível da constitucionalização deste princípio aquando da discussão da revisão da Constituição, foi suficientemente claro no sentido de entender que este elemento é, de facto, um elemento importante de dignificação do órgão de soberania Presidente da República, o que também nós subscrevemos.
Não é, portanto, uma questão técnica. Do ponto de vista técnico, posso dizer ao Sr. Deputado Carlos Encarnação que há que fazer correcções, compatibilizar princípios, não aprovando coisas que estejam à revelia de outras, etc. Mas isso é feito em sede de comissão de especialidade. É evidente que houve uma evolução no Partido Social-Democrata relativamente à posição anterior, pois já deixou que vá à comissão. Mas do que nós temos dúvidas é sobre o verdadeiro significado e resultado disto tudo. Creio que sobre isto estamos esclarecidos.
Em relação à intervenção do Sr. Deputado Almeida Santos, agradeço, naturalmente, as palavras iniciais, que, é evidente, não mereço, mas queria dizer o seguinte: talvez eu não tenha sido suficientemente claro naquilo que disse porque é evidente que eu subscrevo, em absoluto, totalmente, as suas palavras quando em termos de princípio defende -o que nós naturalmente também defendemos- que devemos encontrar todos os meios para dignificar o órgão de soberania Presidência da República, o que é perfeitamente independente do utente que tiver a cada momento. E creio que isto trespassa do conjunto da minha intervenção, que é o que, aliás, sempre tenho dito sobre esta matéria.
Quando disse, ainda há bocado, que, efectivamente, quando o partido teve maior expressão e actividade parlamentar, o "inquilino" de Belém não era o general Eanes, que era para o PRD, enquanto Presidente da República, uma referência do ponto de vista do seu comportamento político. Pese embora os problemas que tem surgido, não deixa de o ser por esse facto, isto é, do nosso ponto de vista, continua a ser, enquanto foi Presidente da República, uma referência para a actividade política que subscrevemos inteiramente e que queremos continuar a manter. Portanto, fica também clarificado este pequeno quiproquó.
De facto, Sr. Deputado, a questão que se põe é outra, e era precisamente este aspecto que queria sublinhar na minha intervenção. É que quando viemos para a Assembleia da República, ainda durante o mandato do general Eanes - sabendo, inclusivamente, que ia sair de Belém, pois estava-se em campanha eleitoral -, fizemos uma afirmação de fé em todos os nossos documentos, pois procurámos concretizar aquilo que seria o reforço dos poderes do Presidente da República.
Isso não poderia, por conseguinte, ser imputável ao PRD numa relação directa com o general Eanes, mas com o Presidente da República enquanto órgão. Na realidade, fizemo-lo por uma questão de princípio que sempre tínhamos defendido. Aliás, creio que em todas as nossas intervenções, proferidas nos mais variados domínios e aos mais variados níveis, temos defendido essa posição, que é a que, em absoluto, subscrevemos.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - Faça favor.