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1216 I SÉRIE - NÚMERO 35

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgo que o melhor contributo para o prestígio de um organismo como a Alta Autoridade para a Comunicação Social passa agora pela sua institucionalização de forma consensual, designadamente quanto às suas atribuições, competências e composição.
Separam-nos, nestas matérias da proposta do Governo, análises muito distintas, designadamente em relação a três questões: em primeiro lugar, o projecto do PS - não provo a extinção do Conselho de Imprensa.
Em segundo lugar, ele atribui à Alta Autoridade um número bem mais amplo de competências.
Em último lugar, assegura uma composição mais plural e independente.

O Sr. António Guterres (PS): - Muito bem!

O Orador: - Comecemos pela questão do Conselho de Imprensa.
Invoco nesta matéria algum conhecimento. Não só porque fui membro do Conselho de Imprensa, em duas épocas distintas, mas, sobretudo, porque tive a oportunidade de estudar, detalhadamente, o seu vasto e rico conjunto de deliberações e pareceres, a ponto de ter escrito um estudo sobre este organismo, aliás já aqui suficientemente lido e, volto a frisar, manifestamente deturpado. Por via disso, aproveito até a ocasião para entregar ao Sr. Secretário de Estado um exemplar desse livro, devidamente endereçado.

Aplausos do PS.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Tem de ser em banda desenhada.

O Orador: - O PS e eu próprio sempre defendemos a existência do Conselho de Imprensa e a sua continuidade. O Conselho de Imprensa tem uma origem que nada tem a ver com a da Alta Autoridade ou com a dos organismos que o antecederam.
Apesar de criado pela lei, ao contrário dos seus congéneres de outros países, o Conselho de Imprensa português surge associado à tradição europeia de institucionalização de órgãos representativos da imprensa e da opinião pública -«expressão dos interesses profissionais e da opinião pública» -, como sintetizava o relatório da comissão que elaborou a Lei de Imprensa de Fevereiro de 1975.
Esta espécie de «tribunal moral e de influência», cuja eficácia reside, afinal, na persuasão através da publicidade dos seus pareceres e deliberações, é, por outro lado, simultaneamente, um organismo de autodefesa - visto que visa proteger a liberdade da imprensa -, e de auto-controlo - já que procura eliminar os seus abusos.
Neste quadro, o Conselho de Imprensa tem tido um papel insubstituível na apreciação de casos relativos à ética e à deontologia profissional dos jornalistas; como instância de apelo de cidadãos, face ao comportamento da imprensa, na formulação de doutrina sobre a protecção do direito à intimidade da vida privada e outros direitos da personalidade e na consagração adequada do direito de resposta, inclusive em casos onde se verificam evidentes lacunas na lei.

O Sr. António Guterres (PS): - Muito bem!

O Orador: - O conjunto de cerca de 600 deliberações sobre queixas apresentadas com as mais diversas origens, desde o anónimo cidadão até à autarquia local, o sindicato ou a empresa, e os cerca de 150 pareceres sobre os temas mais diversos constituem um invulgar património e um inestimável capital de experiência e conhecimentos sobre a liberdade de imprensa em Portugal.

O Sr. António Guterres (PS): - Muito bem!

O Orador: - Nem o património nem a experiência poderão ser herdados pela Alta Autoridade. Muito menos todas as suas competências.
A apreciação do comportamento deontológico da imprensa e dos jornalistas, que marca, de forma bem visível, a actividade predominante do Conselho, não poderá ser transferida, já que a Alta Autoridade tem na sua composição uma fortíssima componente emanada do poder político.
Duvido que a Alta Autoridade, a quem estão destinadas as complexas missões de garantir o pluralismo no sector público e de participar no licenciamento dos canais privados da televisão, pudesse vir a desempenhar um papel equivalente ao do Conselho de Imprensa na formulação doutrinária ou na espécie de «jurisprudência paralela» criada ao longo de 15 anos.
Apresento-vos um terceiro argumento. A proposta de lei do Governo não atribui à Alta Autoridade várias das competências do Conselho de Imprensa, votadas assim a um misterioso destino: a verificação da alteração de orientação das publicações periódicas, indispensável para o reconhecimento da cláusula de consciência, deliberações, como entidade de recurso, em matéria de atribuição da carteira profissional dos jornalistas, a classificação das publicações periódicas e a apreciação de queixas de cidadãos ou pessoas colectivas, além da já citada matéria relativa à deontologia profissional.
É óbvio que a Alta Autoridade não está vocacionada para este tipo de competências.
Impõe-se, assim, permitir a continuação da tarefa notável que o Conselho de Imprensa vem prosseguindo e que se estende à organização de campanhas pedagógicas e de seminários especializados com participação de organismos estrangeiros ou à publicação de importante bibliografia para o estudo da comunicação social desde 1974.
Dirijo, pois, um apelo ao Governo para que pondere os argumentos de todos - e são muitos e das mais diversas origens - os que têm visto no Conselho de Imprensa um pilar importante e uma referencia obrigatória na liberdade de imprensa em Portugal.
Permito-me citar o jornalista Oscar Mascarenhas, num texto exemplar publicado anteontem no Diário de Notícias: «O prestigiado orgão de consenso que reúne todos os protagonistas da comunicação social portuguesa, produtores e receptores, patrões e jornalistas, políticos e gráficos, especialistas e cidadãos comuns, presididos por um magistrado, pode finar-se inexoravelmente de morte precoce, sentenciado por um acto de leviandade e teimosia, se não se perceber, a tempo, que ele tem sido, moderada e discretamente, a trave mestra da pedagogia da liberdade de informação em Portugal.»
O segundo ponto inaceitável na proposta governamental diz respeito ao âmbito de competências atribuído à Alta Autoridade. A sua extrema timidez é ainda mais visível se a compararmos com a do seu congénere francês.