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1270 I SÉRIE - NÚMERO 37

Conselho Nacional para as Ciências da Vida, recordando que «há uma ética na criação de um Conselho Nacional para as Ciências da Vida e que essa ética é a do maior consenso possível no que se refere à instituição, à composição e aos fins do órgão a criar».
Passados quase três meses sobre esse debate, e confrontados agora com a proposta de lei do Governo de criação de um Conselho Nacional de Bioética, é nesse mesmo espírito que o Grupo Parlamentar Socialista se debruça sobre a proposta de lei em causa.
Em matérias como esta, acreditamos no consenso, desejamos o consenso e tudo faremos para que a versão final, que resultará da análise na especialidade dos dois textos legais, reflicta, de facto, o maior consenso possível entre todos nós.
Estamos, pois, dispostos a acolher da proposta de lei do Governo todos os contributos que ela nos possa trazer. Reconhecemos, em devido tempo, o mérito do trabalho desenvolvido pela Comissão para o Enquadramento Legislativo das Novas Tecnologias, criada, em 1986, pelo então Ministro da Justiça, deputado Mário Raposo. Congratulámo-mos, sem fazer qualquer excepção, com a qualidade do debate aqui travado aquando da apresentação do projecto de lei do Partido Socialista, debate que o Sr. Secretário de Estado, lamentavelmente, e eu quase diria escandalosamente, ignorou.
Mas, precisamente porque é a busca não só do maior, mas do melhor consenso possível que nos guia, não podemos deixar de manifestar o nosso profundo desapontamento com aspectos, para nós fundamentais, do entendimento que o Governo revela do que deverá representar, na sociedade portuguesa, um órgão como o Conselho Nacional de Bioética.
Em primeiro lugar, a questão do enquadramento institucional do Conselho: todos concordámos, aquando do debate do projecto de lei do PS, em que, estando em causa uma matéria de tão amplo e profundo significado para a vida dos cidadãos, o Conselho, responsável por se pronunciar sobre as suas referências éticas, deveria revestir a maior dignidade democrática. Ora, que outro enquadramento é melhor expressão e garante dessa dignidade do que a Assembleia da República?
Surpreende-nos, pois (ou já não deveria surpreender-nos?), a inesperada governamentalização do Conselho Nacional de Bioética, agora instituído junto do Primeiro-Ministro.
O Grupo Parlamentar Socialista continuará a defender a posição contida no seu projecto de lei. Não por teimosia, mas por convicção. Porque acreditamos que só funcionando junto da Assembleia da República o Conselho cumprirá a função para que é criado: a de reflectir todas as correntes de conhecimento, de pensamento e de sensibilidade presentes na sociedade portuguesa.
A mesma argumentação vale para um segundo aspecto da proposta do Governo: o da nomeação do Presidente do Conselho Nacional de Bioética por despacho do Primeiro-Ministro. A solução preconizada pelo PS de «um presidente designado pelo Presidente da República de entre cidadãos de reconhecido mérito» parece-nos incontestavelmente mais digna e mais adequada.
Esperamos, por isso, que também este ponto venha a ser reconsiderado pelo partido do Governo em sede de discussão na especialidade. Da mesma ordem é ainda a questão (já aqui amplamente referida) da composição prevista para o Conselho.
A proposta do Governo privilegia nessa composição as componentes científica e técnica, ignorando totalmente a representação das correntes éticas e religiosas de maior peso na sociedade portuguesa - tal como o projecto do grupo parlamentar socialista, à semelhança de outros projectos congéneres em outros países, a preconizara.
È uma lacuna grave, que, a ser considerada intencional, representa da parte do Governo um divórcio em relação às referências espirituais da sociedade civil, que as próprias instituições religiosas acolherão certamente com surpresa.
Num Conselho de 18 membros é manifestamente insuficiente a inclusão de «quatro personalidades de reconhecida qualificação técnica e idoneidade moral». Idoneidade moral esperamos que a tenham todos os membros do Conselho. O que está em causa é, como estipula o projecto de lei do Grupo Parlamentar Socialista, a garantia de que um terço dos membros do Conselho sejam escolhidos «tendo em conta as principais correntes de sensibilidade ética» presentes no nosso país.
Acresce que, segundo a proposta do Governo, a designação desses cidadãos ou cidadãs será feita segundo o sistema proporcional da representação dos partidos na Assembleia da República. E, sem dúvida, um método democraticamente legítimo. Mas não será ele mais uma prova de que, para o Governo, este Conselho permanece, como o Sr. Secretário de Estado há pouco aqui referiu, uma comissão meramente técnica e não uma alta autoridade moral, totalmente suprapartidária? Não será o Presidente da República, por aquilo que representa, a instância democrática mais indicada para proceder à designação em causa qualquer que seja a tradição jurídica evocada pelo Sr. Secretário de Estado?
Na lista das entidades referidas como responsáveis pela designação das personalidades a que se refere a alínea a) do n.º 1 da proposta do Governo, congratulamo-nos por ver mencionada a Comissão da Condição Feminina. Experiências passadas alertam-nos, porém, para o facto de disposições como esta poderem vir, intencional ou inadvertidamente, a servir de álibi para que a composição do Conselho seja, como a de tantos outros, quase exclusivamente masculina.
Como diz um manifesto elaborado por mulheres cientistas, actualmente em circulação, é de justiça que «as mulheres e as utentes tenham assento prioritário e maioritário nesse Conselho, de molde a não continuarem a ser afastadas, como até aqui, das escolhas ético-jurídicas sobre questões que, em primeiro lugar, lhes dizem respeito».
Recorde-se que são as mulheres as principais utentes das experiências clínicas em biomedicina no campo da reprodução humana, e recorde-se também que, há quase dez anos, o grau de licenciatura das universidades portuguesas vem sendo atribuído, maioritariamente (54 %), ao sector feminino da população escolar. O argumento da menor competência não colhe, portanto.
Esperamos que neste Conselho a experiência científica, humana e filosófica do sector feminino da população seja devidamente reconhecida e valorizada.
Resta-me referir, como último ponto, o modo de exercício das competências do Conselho previsto na proposta de lei do Governo. Diz-se, no artigo Srs., que o Conselho Nacional de Bioética «pode delegar, no todo ou em parte, as suas competências» numa comissão coordenadora a seguir definida.
Ora, essa comissão não é senão um «miniconselho» a quem são atribuídos todos os poderes. O critério que