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2 DE FEVEREIRO DE 1990 1351

República. Enquanto o texto aprovado em Conselho de Ministros diz que será autorizada a intervenção em território português de autoridades judiciárias ou de polícia criminal estrangeira em actos de processo penal, possibilidade controversa em direito internacional, atento o princípio da soberania, o Sr. Secretário de Estado, angelicamente, diz: "Não, não! Não se preocupem! Não é nada disto! As autoridades policiais estrangeiras só entrarão em território português com autorização dos tribunais." Mas nós, que não pudemos sequer compulsar a proposta governamental, não sabemos.
Trata-se, pois, de um debate sem sentido e, por outro lado, trata-se de um debate em que o Governo não explicita a sua política, provavelmente porque não a tem ou não a pode confessar. E isto é que lamentamos, acima de tudo, e daí a nossa postura ferozmente contestatária e contrária a esta iniciativa governamental.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça: - Sr. Presidente, peço a palavra para um protesto e defesa da consideração.

O Sr. Presidente: - Dentro da letra e do espírito do Regimento, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado, para defesa da honra.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça: - O Sr. Deputado José Magalhães acabou de dizer que deixei no ar uma resposta a uma pergunta que fez há pouco. Devo dizer-lhe que assim não foi, porque respondi à pergunta que me foi formulada. Eu disse, muito claramente, que qualquer acto judiciário ou de instrução criminal a ter lugar no território nacional dependia de autorização judiciária do país requerente e do país requerido. Há, pois, uma cobertura de perfeita legalidade para qualquer intervenção instrutória que se faça em Portugal. Porque a autoridade judiciária tem de dar o seu assentimento prévio. Portanto, o que o Sr. Deputado voltou a repisar já linha tido a resposta adequada.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, há aqui, sobretudo, um problema de incompreensão congénita. O Governo, no seu relacionamento com a Assembleia da República, pura e simplesmente não percebe quais sejam os seus deveres e como não os percebe não os pode cumprir! Está impotente para cumprir o dever, porque, pura e simplesmente, não tem consciência de qual é esse dever!
Quando o Governo apresenta à Assembleia da República uma proposta de autorização legislativa, esta tem de definir concretamente quais são as alterações que quer imprimir à ordem jurídica.
Neste caso, apresenta V. Ex.ª uma autorização legislativa das mais melindrosas, pois toca em aspectos delicadíssimos, como a extradição, a intervenção de polícias estrangeiras em território nacional, e a exposição de motivos, que é muito longa mas muito nebulosa, diz uma coisa muito opaca: a de que será autorizada a intervenção de autoridades judiciárias ou de polícia criminal estrangeiras em actos de processo penal, em território nacional. E nada mais se diz!
Chega V. Ex.ª aqui, "rapa" do articulado -que só V. Ex.ª conhece- e diz-nos: "Tenham calma que tudo está resolvido! Está resolvido, porque na nossa proposta" - que os deputados não conhecem - "está assegurado um regime" - que os deputados não conhecem - "que permite que as forças policiais estrangeiras não possam intervir directamente, mas só mediante autorização." Diz ainda que devem os deputados aceitar este método de trabalho. Mas eu digo-lhe que não aceitamos!
Em primeiro lugar, não aceitamos que o Governo apresente propostas inconstitucionais, por não definirem o seu sentido - o n.º 2 do artigo 168.º da Constituição obriga-vos a isso!
Em segundo lugar, não aceitamos, porque apresentar, à última da hora, textos sem que os deputados os possam ler não é maneira de tratar com a Assembleia da República.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça: - Posso interrompê-lo, Sr. Deputado?

O Orador:-Faça favor, Sr. Secretario de Estado.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça: - Sr. Deputado, convido-o a ouvir esta parte da exposição de motivos e, depois, a lê-la até ao fim.
O parágrafo que está a referir diz o seguinte: "Possibilidade controversa em direito internacional, atento o princípio da soberania, ainda assim considera-se útil a sua consagração" -e depois acrescenta- "desde que rodeada das adequadas garantias." Quais são as adequadas garantias num Estado de direito?

O Orador: - Quais são, Sr. Secretário de Estado? Isso é uma formulação tardia, não há garantia nenhuma!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça: - Sr. Deputado, julgo que é liminar, é um dado adquirido que as garantias num Estado de direito se traduzem em a autoridade judiciária ter de decidir uma questão que é atinente aos direitos humanos!

O Orador: - Dir-se-ia que V. Ex.ª vem de outro mundo! É uma espécie de marciano simpático!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça: - Sr. Deputado, não venho de outro mundo!
Se na exposição de motivos se acautelam as garantias constitucionais, é óbvio que só a autoridade judiciária é a entidade responsável e competente para determinar medidas instrutórias. Julgo que não estou a dizer nada do outro mundo!

O Orador: - Está, Sr. Secretário de Estado!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça: - A não ser que o Sr. Deputado esteja a defender constitucionalmente outros princípios, que não os meus! Mas esse problema será seu e...

O Orador:-Não! V. Ex.ª está a dizer uma coisa...

O Sr. Presidente: - O diálogo não é permitido!

O Orador: - Sc o Sr. Secretário de Estado viesse directamente de um satélite, eu aceitava essa explicação.