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21 DE FEVEREIRO DE 1990 1629

Partido Socialista é desde já uma excelente base de trabalho, complementada, num ou noutro ponto, pelo do Partido Comunista Português e pelos contributos que em comissão virão por certo a ser carreados.
Mais vale começar, e depois corrigir, num diálogo tanto quanto possível descomprometido do que nada fazer. Há que lançar mãos à obra, que a causa é justa e estimulante.

Aplausos do PSD. do PS e do PRD.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, estamos a cinco minutos das 19 horas e 30 minutos, hora prevista para as votações, pelo que podemos fazer uma de duas coisas: ou proceder às votações de imediato, ou continuar o debate até à hora prevista para as votações.
Penso que a última hipótese é talvez a melhor, uma vez que 6 provável que alguns Srs. Deputados estejam presentes na Câmara apenas às 19 horas e 30 minutos.
Por isso, concedo a palavra para uma intervenção ao Sr. Deputado Marques Júnior.

O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Em boa verdade, depois das intervenções que acabei de ouvir, não deveria ter a veleidade de meter-me neste assunto... No entanto, se me é permitido, gostaria de tecer algumas considerações sobre a matéria em discussão.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostaria de saudar o Partido Socialista por esta iniciativa e, se me é permitido, gostaria também de sublinhar a humildade com que se reconhece que ela não é mais do que o início de um processo a suscitar a colaboração de todos neste trabalho, que, reconhecidamente, não só se justifica como se impõe.
É de realçar também a preocupação do PCP, que, relativamente a esta matéria, já na I Legislatura apresentou um projecto de lei que visava dar expressão legal adequada ao direito de acção popular constitucionalmente consagrado e que agora volta a apresentar um novo projecto, na sequência da segunda revisão constitucional.
E inegável a importância política do instituto da acção popular como meio ou instrumento de participação e de intervenção democrática dos cidadãos na vida pública, da fiscalização da legalidade, da defesa dos interesses das colectividades e da educação e formação cívica de todos.
Com a acção popular pretendeu-se evitar que a defesa do interesse público ficasse exclusivamente dependente da acção pública a cargo do Ministério Público.
Pretendeu-se - e bem - dar aos cidadãos a hipótese de intervirem, directa e activamente, no controlo da legalidade dos actos administrativos.
Pensamos que os projectos de lei em análise, ao quererem regulamentar a acção popular, a vêm tornar viável, efectiva e crível, dotando o cidadão do mecanismo jurídico aclame, de real importância na sindicabilidade dos actos do poder.
Age bem o legislador ao declarar pretender avançar com cautela e paulatinamente na regulamentação da acção popular. É que, apesar do longo período em que o direito de acção popular já está consagrado na lei fundamental, nunca o legislador ordinário teve a coragem de proceder à sua regulamentação, visando a sua prática efectiva; antes pelo contrário, notou-se uma acentuada vontade, manifestada por parte dos órgãos do poder através de uma falta de regulamentação e de um obseuro, propositado e deficiente enquadramento da acção popular, no sentido de ela não ser, habitualmente, utilizada pelo administrado.
Sc tal omissão foi compreensível durante longo período da nossa recente história político-jurídica, em que as liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos foram postas em causa, hoje não era facilmente aceitável que a acção popular não pudesse ser, de facto, um instrumento actuante nas mãos dos cidadãos e suas associações!
Temos agora a oportunidade de garantir a efectivação do direito de acção popular. É uma oportunidade que não podemos perder, visto tratar-se de um direito fundamental, que, do nosso ponto de vista e do de todos os Srs. Deputados- penso-, é hoje indissociável da própria definição de democracia.
Com efeito, é já um dado adquirido, uma afirmação constitucional, que a realização da democracia plena, seja nas vertentes política, económica, social ou cultural, é impensável sem uma democracia participativa e participada como principal garantia da efectivação dos direitos e liberdades fundamentais.
A bondade ou a generosidade dos dispositivos constitucionais, respeitantes aos direitos, liberdades e garantias, não tem, até hoje, acolhido os necessários e desejáveis instrumentos e mecanismos de garantia.
O homem, no seu percurso histórico, foi reconhecendo, a pouco e pouco, a necessidade de assegurar a defesa e a conservação da «coisa pública», que, sendo património de todos, não pertencia a ninguém em particular. Por isso mesmo, qualquer pessoa do povo linha legitimidade para intentar a acção popular. Constituía, pois, um direito, uma forma muito peculiar de participação dos indivíduos na defesa e na preservação dos valores essenciais e das tradições de uma dada comunidade, ditada tanto por um instinto de sobrevivência como por um instinto de pertença a essa mesma comunidade.
E esta a matriz essencial do direito de acção popular que nos dias de hoje, com os acontecimentos que convulsionam o mundo, permanece inteiramente actual.
De facto, com o tempo, a configuração base do direito de acção popular não se alterou, antes se aprofundou e se alargou a outros fundamentos, à medida que as realidades sociais, económicas, culturais e políticas se tornaram cada vez mais complexas. As profundas e rápidas mudanças da sociedade exigem cada vez mais mecanismos de garantia simplificados, clarificados, sistematizados e, quiçá, codificados.
Não se trata já de preservar a comunidade apenas como um todo, mas também de assegurar os direitos e garantias fundamentais do indivíduo em relação ao lodo, nomeadamente quando este, sob qualquer pretexto, se transformou numa autoridade opressora.
Falamos dos direitos fundamentais como o direito à liberdade, cuja maior garantia é ainda hoje o Habeas corpus, que tem lugar quando exista abuso de poder por virtude de prisão ou de detenção ilegal. Esta providência, a interpor perante os tribunais, pode ser requerida pelo próprio ou por qualquer cidadão de pleno gozo dos seus direitos políticos.
Trata-se de uma figura típica, estabelecida por um determinado caso, é certo, mas mostra-nos a outra face de Janus: a acção popular não é apenas útil para a defesa do que é comum mas também para a defesa dos direitos fundamentais contra o abuso do poder pelos mais fortes, sejam eles uma entidade política, económica, social ou cultural.