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1624 I SÉRIE - NÚMERO 46

efeito, extremamente complexa, uma vez que somou aos casos clássicos do direito de acção popular, em que um cidadão, qual pequeno David contra o poder do Estado, defende o interesse público, seja o interesse da autarquia local, seja outro interesse público qualificado e reconhecido pela lei, a ideia mais moderna das acções de grupo, em que um cidadão, ou grupos intermédios, associações e outras estruturas intervêm para defenderem interesses difusos, difíceis de determinar quanto à pluralidade de titulares e quanto aos próprios contornos ou direitos colectivos e exige-nos a nós, legisladores, que separemos essas situações. É esse esforço que o projecto de lei do Partido Socialista procura fazer, com êxito desigual nas suas diversas normas.
Por um lado, o PS funde várias figuras de acção popular, contidas em vários diplomas, num só diploma, o que pode ser vantajoso ou desvantajoso. Há quem, francamente, prefira que seja a Lei do Ambiente a definir em pormenor o regime de intervenção junto da Administração ou dos tribunais para defesa desse tipo de meios e de valores. O mesmo sucedendo em relação aos consumidores.
Por outro lado, o PS define algumas regras processuais específicas, matéria de grande melindre e que envolve - se se quiser fazer num único diploma - questões de direito processual civil, de direito processual penal, de direito processual administrativo, questões estas que têm de ser separadas e distintamente tratadas para evitar regimes que sejam puramente confusos.
Em terceiro lugar, define os efeitos do caso julgado em condições que têm também de ser diferenciadas. Não é a mesma coisa definir os efeitos de uma acção popular em defesa de um bem que uma autarquia local perdeu unanimemente e quiçá estultamente, ou defender os interesses dos moradores de uma zona atingida por uma catástrofe ecológica. A lei tem de ser diferente!
Por outro lado, procura esboçar um regime indemnizatório, coisa de complexa construção. De complexa construção mas de construção necessária. E a esse esforço, em nosso entender, devemos lançar mãos. Como será o nascituro? Devo dizer, também francamente, que não sei, a minha bancada não sabe. Mas propomos que se faça, a tempo, uma ecografia legislativa que evite que, em vez de criarmos não uma bela adormecida mas uma boa criatura jurídica, criemos um aberrante monstro frankenstaniano. E estamos perfeitamente a tempo de o evitar.
Pela nossa parte, Srs. Deputados, entendemos que, para que proliferem as iniciativas cívicas a que por esta via a Constituição apela, é necessário muito mais do que uma lei que proclame e delimite o direito de acção popular.
É necessário, desde logo, inventar novas formas de diálogo entre a Administração Pública e os cidadãos, canais de participação e intervenção em situações de emergência, tanto sanitária como ambiental ou outras relacionadas com os direitos dos consumidores.
É necessário, por outro lado, que se concretizem reformas das leis de processo civil, administrativo e penal; acções, por exemplo, de suspensão de obras ilegais; acções de intimação para reparar ou proteger bens ameaçados; acções destinadas a obter a destruição de obras ilegalmente efectuadas atentórias do património cultural; mandados e injunções tendentes a proibir actos de poluição ou a quebrar a inércia das autoridades perante a sua prática.
É necessário, também, um regime de isenções de preparos e custas e de apoio judiciário gratuito que encoraje, e não desincentive, os esforços privados em defesa do interesse público.
É indispensável, por outro lado ainda, a cooperação e não o boicote das entidades públicas. E, para isso, será de importância fundamental, por exemplo, que se aprove, finalmente tantos anos depois da entrada em vigor da Constituição da República, o código de procedimento administrativo para que a Constituição aponta e que é, de facto, um instrumento imprescindível para definir as regras de conduta pelas quais a Administração se deve pautar e com as quais os cidadãos devem poder contar para se dirigirem à Administração e verem, em prazo certo e condições previsíveis, respondidas as suas pretensões.
É necessário, também, instituir, como a Constituição agora manda expressamente, a Administração aberta.
E é necessário, Srs. Deputados, definir o regime de indemnização por danos emergentes de infracções contra a saúde pública, o ambiente, o património cultural ou o domínio público. São coisas extremamente distintas.
Definidos que sejam os diversos regimes, haverá que imaginar os caminhos processuais para que as reparações devidas sejam atribuídas a quem de direito. E muitas são as formas pensáveis: acções colectivas para ressarcimento de danos colectivos; acções colectivas para ressarcimento de danos individuais; acções padrão, como há em outros sistemas jurídicos, que dêem solução aplicável a todos os processos singulares de indemnização das vítimas de uma mesma infracção.
E, a acrescer a isto, melhor seria - dizemos nós - que a Administração Pública por força de lei organizasse, por sua iniciativa própria, procedimentos indemnizatórios eficazes e equânimes ainda antes da intervenção dos próprios tribunais.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Com o debate de hoje está dado o sinal de partida.
Tenhamos consciência, porém, de que, nesta corrida, nem tudo depende da Assembleia da República.
Num vasto número de autarquias locais fervilha hoje um movimento criador de novos mecanismos de relacionamento com os munícipes. Os eleitos da CDU, por exemplo, assumiram, em Dezembro de 1989, o compromisso de respeitar no mandato em curso uma carta de garantia dos direitos dos cidadãos perante o poder local, na qual se prevê, precisamente, a obrigação de criar mecanismos expeditos para dar resposta a situações em que também tem cabimento a acção popular. Em Lisboa prepara-se uma verdadeira revolução administrativa, na base inspirada nos princípios constitucionais.
Quem não agir nesta matéria, evidentemente perderá, e perderá perante os portugueses.
Uma questão e uma coisa são certas: creio que será seguro dizer que vem aí a acção popular! E já não era sem tempo. É que todos sabemos, Srs. Deputados, como é o País sem acção popular, tanto na lei como na vida!
Mas o grande desafio é imaginar o que o País pode ser com a acção popular.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, encontram-se na tribuna do corpo diplomático deputados da Comissão Parlamentar de Trabalho da RFA, que tiveram um encontro de trabalho com a nossa Comissão, para os quais peço uma saudação.

Aplausos gerais.