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9 DE MARÇO DE 1990 1773

Por outro lado, o Sr. Ministro disse que o PSD se honra de respeitar os seus compromissos. Com certeza que penso que isso fica muito bem ao PSD, mas o que V. Ex.ª não precisava de ter dito é que a honra do PSD, relativamente aos seus compromissos, se estabelece ao contrário daquilo que o PS faz. Qual foi, Sr. Ministro, o compromisso que o PS não cumpriu na matéria a que o Sr. Ministro aludiu?

Protestos do PSD.

Finalmente, o Sr. Ministro admitiu que, na discussão na especialidade da matéria da proposta, se poderia vir a encontrar, certamente por iniciativa do seu grupo parlamentar, um outro quadro de referência para o direito de preferência. Ora, lembrei-me das recentes declarações do Sr. Primeiro-Ministro quando afirmava, nas jornadas parlamentares do PSD, que «o Grupo Parlamentar do PSD não tinha estratégia própria». Terá hoje o Sr. Ministro desautorizado o Sr. Primeiro-Ministro ao admitir que, futuramente, o Grupo Parlamentar do PSD pode vir a ter uma estratégia diferente daquela que a proposta do Governo, neste momento, nos apresenta, definindo um critério diverso para as preferências?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Membros do Governo: A proposta governamental, ao contrário do que o Sr. Ministro afirmou, não é nem transparente, nem precisa, nem cabalmente constitucional.
Não é transparente nem precisa, porque, desde logo, refugiando-se numa extrema generalidade, remete para o conforto do Conselho de Ministros decisões em áreas absolutamente fundamentais, que, a nenhum título, podem ser subtraídas à consideração dos deputados.
É assim em matéria de concurso público, do regime de titularidade dos meios de transporte e difusão do sinal, em quanto respeita aos actuais arquivos da RTP, em tudo o que tem a ver com o plano técnico de frequências, no que se prende directamente com as televisões regionais e locais, para só enumerar alguns dos múltiplos aspectos sobre os quais o Governo, desta feita, se não pronuncia.
Não é cabalmente constitucional porque, apesar da pirueta que fez do alto da tribuna, fica por responder a questão central: a de saber se, sim ou não, a postura do Governo, ao pretender privilegiar a Igreja Católica, contende com o artigo 38.º da lei fundamental do País e com o que aí, de uma forma expressa, se estabelece.
Penso mesmo que releva de um acto de estrito farisaísmo político afirmar, como afirmou, que o Executivo tem uma posição clara, adiantar um passo em relação ao que estava previsto na proposta de lei e, depois, incitando à co-autoria de uma inconstitucionalidade, devolver aos agentes parlamentares o ónus da decisão final, convocando a acção da sociedade civil para arrematar e decidir numa área em que o PSD, manietado, constrangido por dilacerações várias, não é capaz de assumir, com dignidade e coerência, aquilo que pensa.
Lembrar-lhe-ei, Sr. Ministro, o que diz o artigo 9.º, no seu n.º l, que rapidamente passo a ler: «O regulamento a que se refere poderá fixar, num dos novos canais a licenciar, um período de emissão especial destinado à
Igreja Católica e demais confissões religiosas, a atribuir nos termos do número seguinte.»
Ora, o que o Sr. Ministro aqui disse foi alguma coisa que, na lógica da preferência legal, pretende, desde já, dar como estabelecido que a Igreja Católica deterá um espaço com outorga de alvará, violando, assim, de uma forma iniludível, o princípio do concurso público e as normas constitucionais aplicáveis.
Gostaria que respondesse a estas questões.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Sr. Ministro, em 19 de Dezembro de 1985, o primeiro governo de Cavaco Silva, na exposição de motivos da proposta de lei n.º 5/IV, escrevia aquilo que, com muito agrado, vou ler: «Sem embargo do respeito escrupuloso pelo princípio da separação das igrejas e outras comunidades religiosas do Estado, a prática constitucional revelou um tratamento específico devido à Igreja Católica, em vários domínios da vida colectiva e também no da comunicação social.
Assim se explica o relevo concedido à Igreja Católica na programação televisiva, e muito especialmente no caso particular da emissora de radiodifusão Rádio Renascença.
Nenhum governo constitucional pôs em causa este estatuto diferenciado, o que se compreende sem dificuldade devido à vigência da Concordata, celebrada entre o Estado Português e a Santa Sé, cuja constitucionalidade e plena eficácia jurídica nunca foi contestada por nenhum partido político com assento na Assembleia da República.
O artigo 41.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa consagra o direito das diferentes confissões religiosas à utilização dos meios de comunicação social próprios para o prosseguimento das suas actividades.
E continua, dizendo: «O princípio da igualdade» e isto é muito importante, «constante do artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa, implicando a ideia de proporcionalidade, supõe que o regime legal de efectivação do direito acima mencionado seja diverso para a Igreja Católica, atendendo ao regime concordatário e à consequente prática constitucional. De facto, o aludido princípio implica o mesmo tratamento para situações idênticas e diverso regime para situações diferentes.
A particular relevância da Igreja Católica na sociedade portuguesa explica, assim, a especificidade do seu tratamento também no que respeita ao acesso à actividade da radiotelevisão.»
Aquilo que o Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho vem dizer agora às emissoras, aquilo que o presidente do Grupo Parlamentar do PSD vem dizer ao público e aquilo que V. Ex.ª disse no Telejornal, no sentido de que o Governo ia dar um privilégio à Igreja Católica, não se harmoniza com aquilo que foi considerado, em 1987, pelo governo de Cavaco Silva «de que não era um privilégio», mas simplesmente a aplicação do «princípio do mesmo tratamento para situações idênticas e de diverso regime para situações diferentes». Isto, como sabe, já vem de Aristóteles: as coisas semelhantes em direito tem tratamento semelhante, as coisas dissemelhantes tem de ter tratamento diferenciado. Assim nos ensinaram no liceu - como diria o meu amigo Pacheco Pereira- na Filosofia, e depois os nossos mestres de Direito.