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1782 I SÉRIE - NÚMERO 50

estende-se, sem critério aparente e bastante, a áreas problemáticas que transcendem a matéria em causa, tudo resultando em indisfarçados entorses.
O projecto de lei do PS deixa, em síntese, a impressão de uma invencível falta de orientação nas coordenadas da ordem jurídica portuguesa, pecado capital que o legislador não pode permitir-se.

Aplausos do PSD.

Mas é sobretudo no plano material do acerto político-legislativo das metas ideológicas a prosseguir e dos meios pré-ordenados à sua prossecução que mais notoriamente avultam os méritos da proposta de lei n.º 130/V.
Na impossibilidade de levar mais longe o nosso exame e a nossa demonstração, limitar-nos-emos ao enunciado de três tópicos que erigiremos em outros tantos argumentos.
Decisivo, a começar, o tratamento reservado pelo artigo 6.º aos fins da radiotelevisão. Um preceito que, demarcando o horizonte teleológico-axiológico do diploma, lhe empresta, ao mesmo tempo, a necessária e consistente legitimação material.
Neste plano há-de sobretudo enfatizar-se, pelo seu conteúdo e alcance normativo, o disposto na alínea b) do n.º 1, segundo o qual são fins da actividade de televisão «contribuir para a formação de uma consciência crítica, estimulando a criatividade e a livre expressão do pensamento».
Uma norma que tem o significado unívoco de proclamar o primado dos valores da pessoa e da liberdade improgramável, sobre os interesses da conformidade e os valores da racionalidade sistémico-funcional, que vale, em síntese, como enunciado do dogma da prevalência da ordem da autonomia sobre a ordem da heteronomia.
Ora é, por exemplo, em vão que na pletora dos fins autonomizados pelo projecto socialista se procura um preceito idêntico. Facto que há-de, também ele, levar-se à conta da tendência que inspira este projecto, de privilégio do transpersonalista e da ordem da heteronomia.
Marcante, em segundo lugar, o propósito de abrir a actividade de televisão à iniciativa privada, aspecto que, em definitivo, empresta ao texto a sua transcendente relevância e justifica, só por si, as expectativas que suscitou e as paixões que polarizou. E afirmamo-lo, de olhos postos no eminente significado filosófico-cultural e antropológico de que releva a ideia de comunicação e que começámos por tentar pôr a descoberto.
Pesem embora as garantias oferecidas pelo Estado de direito e pela independência dos jornalistas, televisão estatal é sempre o monólogo ancorado no horizonte estreito da construção oficial da realidade e das representações de valor que ela segrega e induz.
A abertura à iniciativa privada vai, pelo contrário, libertar as energias que pulsam na alma colectiva da nossa sociedade, densificando de alternativas e de polifonia o nosso ambiente cultural. E dizemo-lo, não tanto em nome do existente, mas, sobretudo, atentos aos ventos do futuro que se deixam adivinhar.
Somos, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, a geração privilegiada que atinge o promontório do fim do século e do fim do milénio com a experiência enriquecida do espanto e do milagre.

Aplausos do PSD.

Cada dia que alvorece é um renovado oitavo dia da criação que desloca, para níveis impensáveis, a fronteira do possível. Importa, por isso, estar despertos para o simbolismo e a eficácia do nosso gesto. Com ele antecipamos o futuro.
Deter-me-ei, em terceiro e último lugar, na proposta adiantada pelo Governo, no sentido de assegurar, de antemão, uma presença na comunicação televisiva às confissões religiosas, ajustada ao seu relevo e representatividade na história, na sociedade e na cultura portuguesas, o que redundará -importa afrontá-lo sem subterfúgios- na garantia de uma presença destacada e ímpar da Igreja Católica.

Aplausos do PSD.

Também esta inovação legislativa que a proposta de lei n.º 130/V anuncia se nos afigura inteiramente justificada, político-legislativamente adequada e a contar, por isso, com o nosso restrito aplauso.
Em ordem a uma melhor dilucidação das questões e para obviar ao perigo de nos perdermos e gastarmos no instrumental e no acessório, deixemos, por enquanto, de remissa as vias possíveis de concretização deste objectivo. Na certeza de que o desenho técnico das soluções há-de, em definitivo, encontrar-se a partir da plasticidade de soluções abertas pela lei fundamental e tendo em conta as múltiplas considerações de oportunidade que aqui não cabe recensear nem sindicar.

Aplausos do PSD.

Mais, para afrontar directamente o problema à luz dos princípios que informam a acção legislativa e das premissas que a condicionam, porei mesmo entre parênteses um aspecto que, para nós, sociais-democratas, é decisivo- o imperativo categórico de honrar compromissos e promessas.
Por razões de brevidade, a decisão de assegurar à Igreja Católica a possibilidade efectiva de comunicar através da televisão não está, necessariamente, vinculada a qualquer intromissão de representações teológicas no universo do político. Contra ela não valerão, por isso, os argumentos e as críticas que se louvam da separação entre o Estado e a Igreja e, nessa medida, do carácter laico e secularizado da República. Pelo contrário, aquela decisão releva directamente do discurso político-legislativo, decorre de forma impressiva e cogente da própria lógica auto-referente da acção política no horizonte da história e da sociedade portuguesas.
Para a assumir não será necessário recolhermo-nos ao silêncio e ascese de um convento. Podemos fazê-lo aqui, no fórum onde palpita o coração da República, hospedado - ironia das ironias! - também ele sob um tecto que ficámos a dever à Igreja.
Bastará, para o concluir, um olhar minimamente atento para a história que honramos, a sociedade e o povo que servimos, certo como é que a Igreja Católica está incindivelmente ligada a quase todos os nosso grandes projectos e realizações culturais. Por exemplo - e como não recordá-lo quando festejamos os 700 anos da Universidade de Coimbra, o mesmo é dizer da Universidade Portuguesa-, foi uma petição dirigida ao Papa por 27 bispos, abades e superiores de convento (reunidos em 12 de Novembro de 1288 em Montemor-o-Novo) que desencandeou a instauração dos Estudos Gerais em Lisboa. É outrossim sabido e relevante que aqueles eclesiásticos assumiram o encargo de fazer face às despesas com os professores das quatro faculdades.