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2086 I SÉRIE-NÚMERO 61

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (João de Deus Pinheiro): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desde a sua criação a Comunidade apresentou-se como um projecto de união entre Estados que partilhavam uma mesma matriz de valores assentes no respeito pelos direitos fundamentais, pela democracia pluralista, pela liberdade e responsabilidade dos cidadãos, pela economia de mercado e pela solidariedade social.
E também desde o início o projecto comunitário se pautou pelo pleno respeito pelas identidades e diversidades nacionais, delas fazendo a sua força e riqueza, mobilizando-as para objectivos comuns livremente aceites e delas retirando efeitos sinergéticos nos planos político, económico e social.
Procurou-se, assim, ao longo da sua construção, assegurar um justo equilíbrio entre os caminhos da supra-nacionalidade e a realidade da soberania dos seus Estados membros, equilíbrio hoje traduzido pelo chamado «princípio da subsidiariedade», contínua e irreversivelmente presente no quotidiano da Comunidade.
Aspecto marcante da construção comunitária tem sido, igualmente, o grande pragmatismo e flexibilidade que tem informado a aplicação das linhas mestras da integração e que são - a nosso ver - razão significativa (e nem sempre explicitada) para o seu inequívoco sucesso. É que tem sido precisamente essa postura pragmática e flexível que foi impedindo a fixação de modelos únicos, rígidos e definitivos, cerceadores do progresso e da indispensável adaptação da Comunidade a novas circunstâncias e a novos desafios.
Construção nunca tida por acabada, terá sido essa assumida imperfeição que lhe proporcionou a vitalidade e maleabilidade necessárias para ultrapassar com êxito as múltiplas crises que teve de enfrentar e para avançar no caminho da união europeia.
Nesse processo necessariamente gradualista deve destacar-se o Acto Único Europeu, verdadeira afirmação de confiança no devir da Comunidade e marco fundamental da nova Europa.
A evolução subsequente parece ter sido de molde a confirmar tal sentimento. A reforma institucional realizou-se, a cooperação política está a funcionar nos novos padrões em articulação com a vertente comunitária e as novas políticas foram lançadas, designadamente nos domínios do ambiente, das questões sociais e da investigação. No que toca aos objectivos mobilizadores do Mercado Interno e da coesão económica e social, os avanços na sua direcção tem sido significativos, mas ainda insuficientes, tudo concorrendo para a confirmação da expectativa de que 1992 venha a marcar efectivamente uma mudança de etapa no processo de integração europeia e no papel das Comunidades no mundo.
No que loca ao mercado interno, neste momento é já previsível que o programa do Livro Branco, apesar de certas dificuldades que poderão prolongar a negociação em domínios mais sensíveis (como a fiscalidade indirecta ou a livre circulação de pessoas), será cumprido sem grandes desvios de calendário.
Simultaneamente com a realização do mercado interno, a Comunidade estabeleceu a si própria o objectivo da coesão económica e social entre as suas várias regiões. A duplicação dos fundos estruturais, decidida em Fevereiro de 1988 no sentido da viabilização daquele, deverá ser concretizada até 1993, ano em que se realizará também a revisão do respectivo regulamento quadro. As perspectivas financeiras, porém, existem apenas até 1992 e terão de ser então negociadas para os anos seguintes. As condições políticas e o novo tipo de relacionamento internacional da Comunidade não ser elementos determinantes na negociação dos montantes em causa e o peso relativo das diferentes áreas geopolítica que compõem ou que interagem com a Comunidade poderá influenciar em sentidos diversos a distribuição dos recursos. Um conceito de coesão económica e social que - como Portugal tem defendido - não limite os mecanismos da sua realização a transferências financeiras poderá ser particularmente útil face a um acréscimo da concorrência pelos fundos comunitários.
Mas a concretização do Mercado Único não se circunscreve à visão meramente mercantilista, assumindo, em paralelo, uma dimensão social que importa sublinhar e que constitui pedra fundamental na construção do chamado «espaço social europeu».
A este respeito merece referência a recente adopção da Carta Comunitária dos Direitos Sociais Fundamentais dos Trabalhadores, cujos objectivos estão em sintonia com o Tratado de Roma, quando este fixa no seu preâmbulo como meta essencial «a melhoria constante das condições de vida e de trabalho dos seus povos».
Tendo como orientação política o texto da Carta Social e os princípios da subsidiariedade e da coesão económica e social, compete agora à Comissão a apresentação de um programa de acção que permita identificar claramente a dimensão social do Mercado Interno, tal como previsto no Acto Único.
A Comunidade não pára, porém, com o Acto Único. Partindo do compromisso genérico ali contido e tendo em conta os desenvolvimentos entretanto ocorridos - nomeadamente com a adopção da directiva de liberalização plena dos movimentos de capitais -, a questão da passagem à união económica e monetária coloca-se em concreto. Tratar-se-á do maior salto qualitativo a dar pela Comunidade em direcção à integração plena, com evidentes implicações institucionais e políticas. Assenta numa evolução paralela nos sectores económico e monetário, implicando um nível importante de transferência de soberania que será concretizada numa coordenação vinculativa das políticas macro económicas dos Estados membros (com especial incidência no domínio orçamental) numa política comum de desenvolvimento regional e numa política monetária geral definida por um órgão supranacional independente (Sistema Europeu dos Bancos Centrais).
A transformação das actuais economias nacionais em economias regionais do espaço comunitário poderá tender a agravar as disparidades actualmente existentes, tomando essencial o apoio às regiões menos desenvolvidas. Importará, portanto, garantir que no momento da passagem às etapas ulteriores da união económica e monetária existam as condições políticas e financeiras para a concretização do reforço do mecanismo da coesão económica e social.
O que parece certo é que a existência da união económica e monetária terá sempre como consequência, no plano externo, elevar o grau de exigência para eventuais adesões e permitir à Comunidade abordar os problemas de relações externas com a força acrescida que lhe advém desta consolidação interna.