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28 DF, ABRIL DE 1990 2339

Por outro lado. Sr. Secretário de Estado, há igualmente fontes que denunciam esta visão pessimista da situação e que a contraditam, negando quaisquer instabilidades ou situações de insegurança para a comunidade portuguesa.
Nesse sentido, o que pretendemos saber é, de facto, em que ponto se encontra a situação, neste momento.
Com efeito, nós sabemos, por um lado, que os emigrantes portugueses se queixam da falta ou precariedade do apoio consular e, por outro, sabemos lambem que o consulado se tem confrontado, nos últimos meses, com um pedido anormal de renovação de passaportes.
Estas São, portanto, notas que nós deixamos e de que o Sr. Secretário de Estado deve já ter conhecimento.
Gostaríamos igualmente de saber o que é que corresponde à realidade: apenas as afirmações bombásticas que o Sr. Secretário de Estado fez e ou se, para além delas, foram tomadas algumas medidas para fazer uma real avaliação da situação. Há ou não insegurança, instabilidade e motivos para alarme em relação à comunidade portuguesa na África do Sul? O Sr. Secretário de Estado tem ou não conhecimento -e dessa forma possa justificar as suas preocupações - de algum afluxo anormal de emigrantes portugueses de retorno a Portugal? O Governo prevê ou não esse afluxo nos tempos mais próximos?
No fundo, Sr. Secretário de Estado, gostaria de saber se há ou não motivo de preocupação com a comunidade portuguesa e se tudo o que tem vindo a publicar-se, até agora, sobre esta matéria corresponde ou não à realidade.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas.

O Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas (Correia de Jesus): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Isabel Espada: Quando fui avisado de que viria à Assembleia da República, tomei a sério esta sua questão, porque estava convencido de que a Sr.ª Deputada iria, efectivamente, inquirir-me sobre a real situação dos portugueses na África do Sul, e preparei o melhor possível esta minha intervenção no Parlamento para poder esclarecer a Câmara.
De facto, não estava à espera, embora conheça o método e o estilo, porque vivi muitos anos nesta Casa, que a Sr.º Deputada fizesse em relação a mim processos de intenção e me atribuísse declarações que nunca fiz.
Se a Sr.ª Deputada puder provar que alguma vez eu disse que havia um plano de emergência ou de evacuação para os portugueses residentes na África do Sul, gostaria que o fizesse. Na verdade, gostaria de saber onde e quando é que eu produzi essas afirmações, pois estou em condições de provar o contrário, isto é, que o Ministério dos Negócios Estrangeiros e eu próprio negámos a existência desse plano.
Vir aqui fazer essa afirmação e ainda por cima falar de afirmações bombásticas do Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas parece-me totalmente inadequado relativamente a uma questão que, penso, deve ser seriamente abordada.
Tentarei, de uma forma sistemática e com base nos elementos credíveis de que dispomos, responder à questão de fundo que a Sr.ª Deputada colocou, que é a de saber qual a situação actual da comunidade portuguesa na África do Sul e, através da resposta global a essa questão, irei também respondendo às questões pontuais que colocou.
As medidas recentemente tomadas por iniciativa do presidente De Klerk, visando uma transição gradual para uma sociedade multirracial, sem discriminação de grupos étnicos, na África do Sul, acompanhadas pela libertação de alguns líderes históricos da oposição ao regime, provocaram, como seria natural, reacções de apreensão na comunidade branca em geral.
Os primeiros discursos de Nelson Mandela após a libertação, ainda que em tom moderado, contêm referências que despertam inquietação e ansiedade na grande maioria da população branca: prosseguimento da luta armada contra o apartheid e eventuais nacionalizações em sectores chave da economia, tais como grandes bancos, empresas mineiras e seguradoras.
Composta por, aproximadamente, 600 000 pessoas, na sua grande maioria socialmente bem integradas na classe média sul-africana, ocupando, por vezes, posição de relevo em sectores económicos importantes -agricultura, pescas, construção civil, pequenas e médias empresas industriais e comerciais, profissões liberais-, e contando com alguns destacados industriais e comerciantes, a comunidade portuguesa não poderia naturalmente ficar alheia ao processo de transformação que opera no regime e na sociedade sul-africana.
Tradicionalmente apoiantes do Partido Nacionalista, no Poder, a grande maioria dos portugueses apoia as medidas que De Klerk tem procurado implementar.
Habituados a uma convivência multirracial, característica da sociedade portuguesa desde há séculos -até porque muitos chegaram à República da África do Sul nos últimos 15 anos provenientes das ex-colónias-, os portugueses não temem a partilha com os negros nem do Poder nem dos benefícios que agora são apenas acessíveis aos brancos e tem acolhido favoravelmente as indicações acerca da posição de Portugal sobre o problema, que lhes vêm sendo transmitidas pelos nossos canais diplomáticos e consulares.
A posição do Governo Português é, em síntese, a seguinte: apoio às medidas reformistas preconizadas pelo presidente De Klerk; confiança na transição pacífica do regime; estabelecimento, a breve prazo, do princípio "um homem, um voto".
Não obstante existirem pequenos grupos de expressão minoritária no seio da comunidade que apoiam o partido conservador e os radicais de extrema direita que se opõem ao fim do apartheid e às reformas de De Klerk, a sua influencia no seio da comunidade portuguesa é escassa.
É natural e compreensível que entre os portugueses radicados na África do Sul, muitos dos quais já sofreram um processo traumático aquando da independência de Angola e Moçambique, se registem agora reacções de ansiedade em relação ao futuro, que surge ainda com contornos indefinidos. E uma reacção sociológica típica de processos de transição.
Nunca se registaram, porém, quaisquer situações de alarme ou pânico. Em todos os contactos mantidos directamente através das missões diplomáticas e consulares se manifestou apreensão, mas igualmente se demonstrou existir uma expectativa de confiança na evolução pacífica dos acontecimentos, sem dramatismo.
De acordo com os elementos disponíveis, não é razoável, neste momento, encarar como possível um cenário de regresso generalizado.
Os serviços consulares registaram, de facto, nos primeiros meses - e ainda registam -, um afluxo significativo de pessoas que procuravam regularizar a sua