12 DE MAIO DE 1990 2481
O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Secretário de Estado da Segurança Social: Entre os Governos de Portugal e do Brasil foi em devido tempo celebrado um acordo de previdência social, visando regular nesta sede as relações entre ambos os Estados e, assim, assegurar os direitos dos respectivos cidadãos beneficiários da Segurança Social.
Em conformidade com a outorga de tal acordo bilateral, tom os cidadãos portugueses beneficiários da Segurança Social brasileira vindo a receber, através de ordens de pagamento emitidas pelo Departamento de Relações Internacionais e Convenções de Segurança Social, as prestações de quo são legítimos titulares. Tais prestações, respeitando, nomeadamente, a pensões de aposentadoria ou reforma, suo remetidas para Portugal por via de transferência, através do Banco do Brasil, de ordem de pagamento emitida pelo Instituto Nacional de Previdência Social brasileiro.
É bem conhecido por V. Ex.ª, pelo Governo e mesmo pelo comum dos cidadãos que são em número de alguns milhares - cerca de 7000, ao que sabemos - os cidadãos e cidadãs portugueses actualmente residentes no nosso país que, tendo sido emigrantes no Brasil, são titulares de pleno direito de tais pensões de reforma. Sabe-se também que, na sua grande maioria, esses milhares de portugueses carecem imperiosamente dessas pensões para a sua própria sobrevivência e do seu agregado familiar.
Ora, sendo a remessa e recepção das pensões absolutamente indispensável para a garantia e satisfação das mais elementares necessidades dos beneficiários, impõe-se que tais pagamentos não conheçam interrupções ou suspensões e muito menos sofram incompreensíveis alterações no seu quantitativo. Em primeiro lugar, exige-se que as pensões de reforma que são atribuídas em mensalidades sejam pagas, sem qualquer interrupção ou suspensão, durante todos e cada um dos meses. Em segundo lugar, impõe-se que o quantitativo mensal de tais pensões, que legitimamente os seus beneficiários esperam ver periodicamente aumentadas, não seja inexplicavelmente diminuído por efeito de políticas financeiras, transacções cambiais ou outras quaisquer anormalidades que retirem aos beneficiários os montantes das pensões a que têm direito.
Acontece que, na sequência de uma orientação política financeira do Governo Brasileiro e por virtude de medidas restritivas à saída de divisas do Banco Central do Brasil, as transferências das prestações brasileiras para Portugal estiveram suspensas desde Abril de 1989 até ao passado mês de Abril de 1990, ou seja, durante um ano. Quer isto dizer que alguns milhares, cerca de 7000 cidadãos portugueses e pensionistas, estiveram durante 12 meses sem receber qualquer retribuição.
Sabendo-se, como se sabe, que a pensão de reforma constitui para a grande maioria desses cidadãos a única fonte permanente de rendimento e meio de sobrevivência de si próprios e dos seus agregados familiares, pode imaginar-se a situação de desespero e mesmo de miséria que tal bloqueamento provocou. Um ano é muito tempo e, quando se vive quase ou mesmo exclusivamente da pensão de reforma, é mesmo dramático. Muitos viram esgotar-se o seu pé-de-meia, outros foram forçados a recorrer ao crédito junto de amigos ou habituais fornecedores de bens essenciais.
Ao verem desde Abril de 1989 adiado, mês após mês, o recebimento das suas pensões, nunca deixaram, apesar de tudo, de acreditar que a situação se normalizaria e um dia haveria em que receberiam as pensões em atraso e seria retomado o seu normal pagamento.
Até que, no passado mês de Abril, vêem entrar pela porta dentro uma ordem de pagamento que já não recebiam nem viam havia exactamente 12 meses.
Acreditaram todos, certamente, que acabara de chegar às suas mãos a liquidação retroactiva das pensões e que tudo, apesar dos prejuízos sofridos, se normalizaria. Bem se engana quem cuida. Para espanto e desespero de todos, tal ordem de pagamento não respeitava às pensões em atraso, mas apenas ao mês de Maio de 1989.
Muito pior ainda: a pensão era de valor inferior, 30 a 40 vezes, ao da pensão habitualmente recebida, cujo último pagamento se reportava a Abril de 1989. É verdade, Sr. Presidente, Srs. Deputados, e V. Ex.ª, Sr. Secretário de Estado, bem o sabe.
Exemplifique-se: um beneficiário que recebia mensalmente 68 732$ recebeu no mês passado o mês de Maio de 1989, no montante de 2309$; outro que recebia 40 652$ recebeu 1413$; uma idosa pensionista que auferia 7040$ em Abril de 1989 recebeu agora a módica quantia de 324$, e assim por diante. E não se tratou de um qualquer clamoroso engano do homem ou do computador. É que esses mesmos pensionistas já receberam as suas pensões relativas ao mês de Junho de 1989 e os montantes são rigorosamente os mesmos, ou seja, aqueles ou idênticos aos acima exemplificados.
A que se deve tão insólita situação?
As prestações da Segurança Social são transferidas pelo Banco do Brasil para o Departamento de Relações Internacionais e Convenções em Portugal, transferências essas já convertidas em escudos, não tendo a instituição portuguesa qualquer interferência no câmbio utilizado.
Após o bloqueamento de tais transferências, a Previdência Social brasileira procedeu ao apuramento do montante final pelo câmbio actual sem qualquer correcção monetária.
É inadmissível que os beneficiários se vejam assim tão gravemente prejudicados e - diria mesmo e sem qualquer reserva - ofendidos pelas consequências devastadoras de tais operações cambiais nas suas pensões de reforma.
Sr. Secretário de Estado, V. Ex.ª está certamente de acordo connosco em considerar esta situação intolerável, mais ainda quando sabemos que a situação de facto contraria o espírito e a letra do Acordo Luso-Brasileiro de Segurança Social e vem provocando e continuará a provocar uma cada vez mais penosa situação a tais pensionistas.
Estamos francamente preocupados. Os milhares de cidadãos atingidos fazem-nos chegar o seu protesto. Impõem-se imediatas tomadas de posição e adequadas medidas para que lhes seja restituído o que legitimamente reclamam e de que são titulares.
A resposta incumbe, para já, a V. Ex.ª
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Segurança Social.
O Sr. Secretário de Estado da Segurança Social (Vieira de Castro): - Sr. Deputado Laurentino Dias, vou retomar a sua afirmação de que esta situação é intolerável. Penso exactamente como V. Ex.ª E é por pensar assim que o Governo Português - garanto à Câmara - tudo tem feito junto do Governo Brasileiro no sentido de resolvermos esta situação, que é da exclusiva responsabilidade do Governo Brasileiro e que tem a ver com dificuldades cambiais do Brasil, mas que não é justo se repercuta em dificuldades para os pensionistas brasileiros que residem em Portugal, quer sejam portugueses, quer brasileiros.