29 DE JUNHO DE 1990 3147
especialistas em finanças públicas presentes nas bancadas do Governo, dos grupos parlamentares, da comunicação social ou entre o público. Que tem complexidade técnica não temos dúvidas, mas nada mais falso quanto a pensar-se que a matéria apenas àqueles interessa.
É que sem um quadro legal correcto para o Orçamento e para o tesouro não é possível sanear profundamente os dinheiros do Estado. E esse saneamento financeiro é condição sine quo non para se baixar ainda mais os impostos sobre os rendimentos, apresentar melhor serviço nas escolas, nos hospitais, na segurança social, melhorar as infra-estruturas rodoviárias, ferroviárias, aéreas, portuárias, de comunicações, pagar melhor prestações sociais aos reformados e incapacitados e dar melhores condições aos funcionários, libertar recursos financeiros para actividades produtivas e para a sociedade civil, em geral.
Enfim, esse quadro correcto é condição indispensável ao desenvolvimento do País e à transparência real na gestão da Administração Pública.
Por outro lado, não basta aprovar leis tecnicamente bem feitas sobre finanças públicas, como parecem ser os casos em apreciação, numa abordagem geral. É preciso que elas possam ser cumpridas. É preciso que os destinatários das mesmas as absorvam em todas as suas potencialidades.
Quantas leis bem feitas «morreram», total ou parcialmente, no dia em que foram publicadas no Diário da Republica.
E até em matéria orçamental temos, infelizmente, elucidativos exemplos, num passado já com alguns anos. «Quando confrontamos certas normas inseridas nas duas anteriores leis de enquadramento, por isto ou por aquilo (sempre por razões «ponderosas» ou de força maior) deixava-se sempre o cumprimento desta ou daquela norma para o ano que vem...». Mas a situação foi radicalmente alterada nos últimos anos.
Então, como evitar que não se fique no «reino das boas intenções», como aconteceu no tal passado, já um pouco longínquo? 
Actuando como têm actuado os governos presididos pelo Primeiro-Ministro Cavaco Silva desde finais de 1985, em política económica, definem-se os objectivos face à envolvente interna e externa; avaliam-se as potencial idades da legislação financeira que vigora e dos meios ao dispor; apura-se a realidade; traçam-se as estratégias; decidem-se as medidas; altera-se o que está mal ou está obsoleto; cxecuta-se; controlam-se os resultados e corrige-se o que for caso disso. Parece demasiado complexo? Parece demasiado teórico? Complexo não será, porque qualquer aluno de economia tem obrigação de isso saber. Teórico, é natural que o seja, mas é bom quando 6 levado à prática. E qual foi a prática em finanças públicas? Muito sumariamente, pela recondução do Estado ao papel supletivo na economia do mercado envolvendo uma nova disciplina nas finanças públicas, contendo-se o excessivo financiamento do sector público que sufocava a sociedade civil através da redução do peso do défice orçamental (mesmo aparentemente aumentado pela eliminação dos défices ocultos dos fundos dos serviços autónomos e das empresas públicas) na economia, ao mesmo tempo que ia preparando o caminho para uma nova gestão orçamental, susceptível de garantir um melhor e mais leve serviço público de modo a vencermos o desafio da nossa entrada na CEE, com menos custos e com mais proveitos para Portugal.
Para isso, vem-se utilizando todo o instrumental que a Constituição da República Portuguesa permita em matéria de Orçamento do Estado e incutiu-se, ao longo destes cinco anos, nos funcionários públicos e nos dirigentes da Administração mais em contacto com as contas públicas, o espírito de que era preciso mudar e que se ia mudar. Pela sua carga negativa uma atenção especial foi dada, por um lado, ao subsector dos fundos e serviços autónomos, verdadeiro contra exemplo da regra de plenitude orçamental, por outro lado, ao modo enviesado como o Estado se financiava no Banco de Portugal e no mercado financeiro, corrigindo-se este aspecto (ainda agora o Governo acaba de aprovar uma nova lei orgânica do Banco de Portugal, que removerá as dúvidas que ainda subsistem nos mais sépticos).
E foi assim que o défice do sector público alargado, que era de 20% do PIB em 1985, passou para os 8% do PIB em 1989, e devemo-nos sentir ainda insatisfeitos, como muito bem vem frisando o Sr. Ministro das Finanças.
No domínio legislativo, propriamente dito, e como muito bem se lê na exposição de motivos, a segunda revisão constitucional, de 1989, em matéria orçamental e a Lei de Bases da Contabilidade Pública (a que acrescentaria a reforma do Tribunal de Contas), que antecedem a nova Lei de Enquadramento do Orçamento, servem de base à proposta de lei do Governo. Mas esta seria dificilmente exequível se nos últimos cinco anos não se tivesse alterado o universo das finanças do Estado, quer por via de legislação ordinária Géis anuais do Orçamento do Estado; novos classificadores para as despesas e para as receitas orçamentais; reforma fiscal, IVA, IRS, IRC; fim do regime de privilégio fiscal dos títulos de dívida pública, passando a ser igual aos dos restantes títulos; integração da conta de segurança social na Conta Geral do Estado; eliminação de numerosos fundos e serviços autónomos ou a sua gradual integração no orçamento propriamente dito e obrigatoriedade de elaboração de contas patrimoniais; o novo estatuto dos dirigentes da função pública conferindo competências gestionárias aos directores-gerais, que em anteriores governos nunca tinham tido coragem de dar), quer por decisões da mais variada natureza de que destacarei a apresentação pontual das contas a ajustar no Parlamento, a recuperação das contas do Estado atrasadas, a introdução de novas técnicas na elaboração e no controlo orçamental, a que não é estranha a total informatização do processo, a eliminação de numerosas peias burocráticas, o vasto programa de formação, reciclagem e rejuvenescimento dos quadros da contabilidade pública (com redução de efectivos), o reforço dos meios humanos e materiais do Tribunal de Contas-é bom que também não se esqueça!
Tudo isto, enfim, tem a ver com um princípio indispensável à credibilidade e à coerência de qualquer medida legislativa da importância das que estão agora em debate. E quer a proposta da Lei do Enquadramento do Orçamento do Estado, apresentada pelo Governo, quer as duas propostas de lei sobre operações de tesouraria têm credibilidade porque, sublinho:
Em primeiro lugar, decorrem de um fluxo coerente e bem sucedido da política económica e financeira do Governo social-democrata, que admite aperfeiçoar ou ajustar medidas em curso quando a conjuntura o aconselhar (e aí está o novo quadro de ajustamento nacional para a transição para a união económica e monetária na se-