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3466 I SÉRIE - NÚMERO 99

Como explica, então, que o número de processos entrados, por magistrado, tenha vindo a diminuir e, não obstante, o saldo entre os processos pendentes e entrados tenha voltado a ser negativo, depois de 1987, e que, pela primeira vez desde 1980, o número de processos entrados tenha sido superior ao dos pendentes? Por que é que, então, a duração média dos processos continua a ser de 18 meses, tendo até aumentado em certos casos? Serão os processos mais complicados? Ou os juízes continuam a não ter condições? Ou um processo exige, demasiadas vezes, a intervenção de vários juízes?
Mas não é só ao nível das condições materiais que o Governo tem sistematicamente falhado em prover os tribunais e as instituições de justiça do mínimo de condições dignas de trabalho.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Temos dificuldade em avaliar se o Sr. Ministro aqui presente, nos seus escassos dois meses de ministério, começou bem ou mal. Com efeito, em nosso entendimento, começa bem, porque faz sistematicamente uma profissão de fé - aliás, ele tem o nosso aplauso. A sua medida mais significativa, o lançamento do Programa «O Cidadão e a Justiça», não é mais do que uma profissão de fé, e o tempo demonstrará se é real, objectiva e eficaz nas soluções. Esperámos bem que sim!...
No entanto, começa mal, porque, ao insistir no Programa do Governo, o considera com suficientes méritos, contraditoriamente com o reconhecimento tácito que essa insistência representa. Praticamente no fim da legislatura muito ainda está por fazer!
Propunha-se o Governo fazer o reexame da legislação produzida desde 1974, no âmbito da justiça, com o objectivo de - e citamos - reconstituir valores perdidos, como os da sistematização, coerência global e correcção formal, garantindo assim a unidade e a coerência do sistema jurídico».
Propunha-se fazê-lo, mas não com o Ministério da Justiça. Daí que, já no anterior governo, o Gabinete de Apoio Técnico Legislativo (GATL) tenha passado para a dependência da Presidência do Conselho.
Porém, as consequências estão à vista: mantém-se ainda uma autêntica manta de retalhos de leis, nomeadamente na área económica. Com tecnocratas mais sabedores de economia do que de direito, o Governo não poderia assim, de maneira alguma, ir mais longe.
Como podia ser de outra maneira se nem sequer se procedeu à revisão total ou parcial do Código de Processo Civil uma codificação que se pretendia «nova» e que visasse «objectivos de simplificação e celeridade que permitam um efectivo e equitativo acesso à justiça cível».
O projecto continua na gaveta, donde não se sabe quando saíra. A simplificação do processo cível será uma das vias para assegurar uma maior celeridade dos processos, mas não através dos pesados «científicos» e, já por si, demoradíssimos trabalhos do «novo» Código de Processo Civil.
Quanto ao Código Penal, o Governo limitou-se a apresentar um pedido de autorização legislativa; no sentido de rever os artigos 132.º e 386.º Continuamos à espera, já há quase três anos, da publicação do correspondente decreto-lei...
Mas continuamos, lambem, à espera da prometida revisão do Código Penal, nomeadamente, quanto aos objectivos de «optimizar vias de reinserção social com um mais amplo recurso a medidas não detentivas». Como o conseguir, de resto, se, na prática, com o novo Código de Processo Penal, se voltou ao período dos crimes incaucionáveis, apesar de o tristemente célebre Decreto-Lei n.º 477/82 ter sido finalmente revogado?
Nem podia ser de outra maneira, quando o artigo 209.º do Código de Processo Penal exige ao juiz, atolado de trabalho, que fundamente o despacho de não prender. Para quê o trabalho? É mais fácil justificar a prisão com base não em factos, não em concreto, mas com a afirmação «abstracta» (comum, de resto, a todas as situações) e lacónica de que existe o perigo de fuga. Quer dizer, em vez da fundamentação em concreto da existência de um perigo, tal como o exige o artigo 204.º, em vez de uma medida de excepção, a prisão preventiva continua a ser a regra.
Dos 7960 reclusos existentes em 1988, 2583. eram presos preventivos e apenas 5377 condenados. O Sr. Ministro virá, com certeza, aqui apresentar as estatísticas mais recentes, demonstrando que a situação melhorou? Não acreditamos, porque quem convive diariamente com a organização judicial e prisional sabe bem que não é isso que se passa.
Continua, pois, a haver um número anormal de presos preventivos, na sua grande maioria jovens. Existe, na prática, o incumprimento das normas constitucionais, nomeadamente, do artigo 28.º, n.º 2, que refere: «A prisão preventiva não se mantém sempre que possa ser substituída por caução ou por qualquer outra medida mais favorável prevista na lei.»
E tudo isto porque em 70% ou 80% dos casos não se faz a distinção entre delinquentes primários e reincidentes, como é de lei, nem tão-pouco entre os delinquentes ocasionais e perigosos, quer ao nível da decisão, quer ao nível da execução das penas de prisão.
É certo que foi publicada a nova Lei Orgânica dos Tribunais, mas também é verdade que, ainda recentemente, se concluiu pela necessidade de a alterar, nomeadamente, quanto às competências dos tribunais de círculo. que, ainda hoje, não se percebe muito bem o, que vão ser e o que se pretende com eles. Tudo indica, no entanto, que os objectivos da desburocratização, da simplificação, da celeridade e da justiça à porta de casa, estão, em nosso entender, cada vez mais longe.
É certo, ainda, que foi publicado o regime de acesso ao direito e aos tribunais judiciais. Mas se e verdade que a componente «Apoio judiciário» tem tido uma aplicação real -e assumimos isso!-, embora insuficiente, e apenas quanto à «Assistência judiciária», também e verdade que praticamente nada se avançou nas componentes «Informação» e «Consulta jurídica», sem talar num mais eficaz e sério «Patrocínio judiciário».
De entre muitos outros diplomas, cuja publicação foi prometida pelo Governo e em que se regista o seu implemento, poderíamos falar ainda - mas registaremos de passagem, apenas - da considerada, há três anos, «urgente» revisão do processo administrativo e do processo de trabalho (já hoje aqui prometida pelo Sr. Ministro), assim como do modo de funcionamento dos respectivos tribunais.
A propósito de justiça laboral, e surpreendente que continue a ser a parente pobre da justiça no nosso país. Onde está a regulação da atribuição cie prioridade de tramitação e julgamento dos processos nos quais estejam em causa condições mínimas de sobrevivência, nomeadamente indemnizações por acidentes? Alguém duvida de que é precisamente na área laboral que situações destas acontecem? Que se vejam e se consultem as estatísticas!