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3474 I SÉRIE - NÚMERO 99

O Sr. Silva Marques (PSD): - Então faça a desburocratização!

O Orador: - Uma outra questão: a definição de padrões de produtividade no funcionamento dos tribunais e a adopção de soluções práticas para certos casos concretos. Sabemos que por vezes mais vale uma iniciativa tomada em relação a um caso concreto do que um grande labor legislativo ou uma grande filosofia sobre opções de natureza genérica. Por exemplo, por que é que os processos que estão parados há mais de três meses não são desaforados e a sua distribuição não é feita por juízes auxiliares a deslocar para cada distrito judicial? Por que e que, por esta via, não se tenta uma melhor articulação, não só interna no sistema judiciário, como uma melhor ocupação do próprio pessoal da justiça?
Outro aspecto - antes que o Sr. Deputado Silva Marques diga que não é novo, que o Governo está a trabalhar sobre ele, e concordamos que o faça - são os incentivos à arbitragem como forma de aliviar os tribunais judiciais do seu trabalho normal e natural.
Um outro ponto tem a ver com a revisão das carreiras na magistratura, e aí, pensamos nós, devia ser ponderada a necessidade de manter a duplicidade de magistraturas, ou seja a diferenciação entre Ministério Público e a carreira judicial.
Finalmente, o desenvolvimento de meios, principalmente no domínio da prova, que contribuam para uma maior certeza na aplicação da justiça. Pensamos que este aspecto tem particular sensibilidade em matérias de recurso e tem a ver com a admissibilidade da prova feita por meios audio-visuais, porque pensamos que a certeza na aplicação do direito é algo que nos preocupa a todos e tudo o que facilitar essa certeza, nomeadamente em instâncias de recurso, que são instâncias finais de decisão, e fundamentalmente em matéria penal, é matéria que nos deve preocupar e sobre a qual devíamos decidir.
Um outro sector a carecer de medidas urgentes é, em nosso entender, o sector prisional. As prisões encontram-se, de forma geral, em situação explosiva devido às más condições de funcionamento e à sobrelotação. Os suicídios nas prisões repetem-se com excessiva frequência devido à falia de acompanhamento dos presos e dos meios necessários à sua recuperação. O Sr. Secretário de Estado falava há pouco no que está feito em termos de hospitais psiquiátricos, só que isso não chega, não é suficiente, porque os suicídios tem muito a ver com uma falta de acompanhamento da vida quotidiana do preso e com o aspecto mais genérico da humanização das próprias cadeias. Isso tem a ver com outra matéria que é a formação do pessoal dos serviços prisionais, aspecto para nós extremamente importante. A formação desse pessoal deve ser muito cuidada não apenas no que toca à segurança - esse é um aspecto importante que não podemos descurar -, mas também em tudo aquilo que permita a humanização das prisões.
Por último -e deixo para o fim porque, em nosso entender, é o mais importante-, desejo referir o problema da droga nas prisões. Este é um flagelo que não pára de crescer, sendo indispensável uma acção eficaz no sentido de apurar responsabilidades quanto à sua introdução nas cadeias, bem como o auxílio, acompanhamento e recuperação dos presos drogados.
Quero dizer-vos, Sr. Ministro e Sr. Secretário de Estado, que ainda na semana passada um preso com vinte e poucos anos morreu numa cadeia com uma overdose.
As perguntas que se colocam à consciência dos Portugueses são: como é que esta droga entra nas cadeias? Com que facilidade circula nas cadeias? Quem são os responsáveis por esse facto? Penso que todos, mas sem excepção, temos de estar atentos e solidários com as medidas que visem intervir, de uma maneira drástica e eficaz, nessa matéria, a qual, como sabemos, e extremamente melindrosa, que toca com interesses muito variados, em que é extremamente difícil de apurar responsabilidades, mas não deve ser a dificuldade nem talvez a periculosidade do tema que nos deve impedir de encetar uma acção corajosa e rápida.
Quanto às polícias, temos de registar a luta e os atropelos verificados na Polícia Judiciária entre polícias e magistrados, a que urge pôr fim através de uma delimitação rigorosa das respectivas competências jurisdicionais e das áreas de actuação funcional, porque o que tem acontecido na Polícia Judiciária não prestigia nem a polícia nem os magistrados.
Igualmente se constata, com preocupação, a existência de polícias paralelas cujos estatutos, competências e formas de acção ganhavam, para segurança dos cidadãos e transparência do Estado democrático, em ser conhecidos. Esta é uma matéria também melindrosa, que se prende com a segurança, mas que não devemos escamotear. Hoje a existência de polícias paralelas mesmo quando não se vêem sentem-se e o conhecimento e a publicitação dos seus estatutos, das suas esferas de acção e das suas competências próprias pensamos ser matéria útil à transparência e ao funcionamento das instituições jurisdicionais.
Quanto aos serviços de registo e notariado o Sr. Secretário de Estado já respondeu a muito daquilo que aqui se iria dizer. No entanto, penso que carecem de uma reforma burocrática que os aliviem de muito trabalho inútil que continuam a praticar e que evite desnecessárias duplicações. Pensamos que a privatização cios notários e a criação dos chamados «partidos» notariais nas câmaras municipais em muito iria facilitar a eficiência e a rapidez de decisão dos respectivos serviços pelo descongestionamento que provocariam.
Finalmente, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, uma palavra sobre o desafio de 1992 na justiça portuguesa.
Pensamos que esta é uma matéria especialmente «querida» de V. Ex.ª, Sr. Ministro da Justiça.
Cada vez mais a justiça deve inspirar-se na ética e ser colocada ao serviço da defesa da pessoa humana enquanto destinatária final da concepção e da aplicação do direito. Assim - pensamos nós -, a justiça encarada nesta concepção é o mais importante alicerce do Estado de direito na medida em que se não esgota no campo do jurídico, antes se projecta no domínio da moral e da ética. E sem esta projecção da norma jurídica no domínio da moral e da ética podemos ter, quando muito, um Estado de legalidade, mas seguramente não teremos um Estado de direito.
Pensamos que o sector da justiça é um sector básico na construção do Estado de direito, cuja obra nunca se acaba mas cujo aperfeiçoamento é uma responsabilidade que a todos, mas a todos sem excepção, deve competir. Não chega ao Estado fazer normas jurídicas; é indispensável que essas normas sejam justas e possam ser aplicadas com eficiência e com segurança. Desse facto dependerá, em grande medida, a própria existência do Estado de direito cujo aperfeiçoamento é, em nosso entender, o grande desafio da justiça para 1992.