O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

3662 I SÉRIE-NÚMERO 103

Este envolvimento na linha da frente, antes de outros e mais do que muitos outros aliados, também coloca a necessidade de meditar sobre as formas de reacção que podem ter de ser enfrentadas e quem está envolvido não pode imaginar-se imune a essas reacções. A mão invisível da teologia do mercado, confortavelmente mergulhada esta na casuística dos ajustamentos estruturais do Terceiro Mundo, fez convergir todos em dotar o Iraque com as tecnologias com que ameaça a intervenção dos super desenvolvidos. É de salientar a indiferença moral com que governos ocidentais consentiram nas transferências das tecnologias químicas. Estas e as tecnologias balísticas elevaram decisivamente o risco das intervenções no Golfo, com o corolário de que o recurso ao químico pode levar ao uso do nuclear, contagiando o Mundo. É preciso muita confiança na providência para imaginar que não estamos num risco, de guerra!
Mas existe outra forma de guerra, que tem. tido a Europa como alvo e teatro,- que corresponde à tradição das potências do Golfo, e que é o terrorismo transnacional. As operações, neste caso, vão para longe do campo de batalha e uma chamada frente da recusa a soluções negociadas com Israel sustenta essa técnica: Iraque, Argélia, Síria e Líbia apoiam os duros que actuam.
O nosso envolvimento na linha da frente, antes e mais do que outros aliados, exige que esta defesa seja estruturada pelo Governo, empenhando os recursos necessários. É uma exigência que vem logo a seguir à de evitar a transformação do nosso poder funcional (o triângulo estratégico), numa simples situação geográfica.
O esforço exigido nestas áreas onde estamos notoriamente ameaçados de que se tome estrutural a situação de Estado exíguo, mais as consequências recessivas da economia, mais o risco de sofrer a estratégia indirecta, tudo aconselha a que não se envolva o discurso sobre uma maior participação no teatro de operações no mesmo tipo de debate que rodeou a presença em França, na I Guerra Mundial (são de reler, por exemplo, algumas páginas do Diário de João Chagas), nem parecem admissíveis argumentos emocionais sobre os riscos que sofreriam forcas portuguesas no teatro de operações, nem parecem aceitáveis apelos emocionais à presença, a lodo o custo, mesmo, que o custo seja sem resultado.
Faz parte da cultura europeia advertir contra a loucura de D. Quixote, que tomava os moinhos de vento por gigantes: há uma loucura mais perniciosa, que é a de tomar os gigantes por moinhos de vento. Não estamos a lidar com moinhos de vento. As frentes mencionadas .são inevitáveis e- podem exigir grandes sacrifícios, porque estamos envolvidos na linha da frente: aprovar a antecipação que o esforço comum dos aliados considere necessária e esteja ao nosso alcance. Mas só devemos assumir o necessário e deste o que esteja de facto ao nosso alcance.
Em resumo: primeiro, a participação na acção, dos EUA, com a cobertura posterior do Conselho de Segurança e com o comprometimento da UEO, é inteiramente justificada pelo interesse ocidental que se alia à defesa da ordem jurídica internacional, sendo esta um bem comum da Humanidade que a Carta da ONU consagra e manda defender, segundo, esta participação coloca Portugal na linha da frente, antes e mais do que muitos dos aliados na acção em causa, tomando efectivos riscos conhecidos da estratégia indirecta, que exigem um esforço imediato na defesa interna e das comunicações aéreas e marítimas; terceira, qualquer. outra participação não deve deixar de ser considerada com rigor logístico, com realismo, assumindo que um Estado, mantendo-se dentro do que deve fazer, não deve ultrapassar aquilo que pode fazer. As forças armadas são as que temos e a regra é a latina: ad impossibilita nemo tenetur.
Esta grave questão não podia deixar de exigir a intervenção do Parlamento nem desenvolver-se sem esclarecimento da opinião pública. É completamento errado, para salvaguarda de uma desejada confiança de investidores, tratar o eleitorado como se fosse uma assembleia de accionistas. A comunicação social acaba rapidamente com essa vazia prudência.
Todavia, a crise surgiu numa circunstância de lazer meridional tempo de férias- e parece ter sido gerida em termos de não perturbar merecidas tranquilidades dentro e fora do País. Vimos assim surgir a figura do Primeiro-Ministro em exercício, com a fácil verificação de que não está prevista em nenhum texto constitucional ou experiência prévia, mas dando a oportunidade de verificar que o Ministro da Defesa Nacional teve capacidade e modéstia para suprir a ausência de textos, de costumes e de responsáveis. Todavia, estamos a enfrentar a prova mais decisiva da nossa evolução para Estado exíguo e este ambiente institucional não é aceitável.
Alem dos riscos assumidos sem que se saiba exactamente quem assumiu as responsabilidades políticas, avultam subitamente as questões sempre adiadas da redefinição das forças armadas, da avaliação do valor e preservação do poder funcional do triângulo estratégico e, com extraordinária relevância, a necessidade de avaliar o Estado do aparelho diplomático, desde as chefias ao Tribunal de Contas. O regime jurídico das futuras eleições autárquicas tem certamente importância, mas esse problema pode esperar.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Lima.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Sr. Deputado Adriano Moreira, quero fazer, em nome da minha bancada, um curto pedido de esclarecimento, começando embora por transmitir-lhe o apreço e o agrado com que ouvi a intervenção e reflexão que trouxe a esta Câmara, com a autoridade com que todos nós lhe reconhecemos nesta matéria.
Gostaria de abordar um ponto em concreto, porque me parece haver aqui uma grande contradição entre aquilo que, por um lado, diz o CDS, criticando o Governo, e, por outro lado, o que dizem outras bancadas da oposição, embora eu esteja de acordo com aquilo que V. Ex.ª acabou por afirmar na sua intervenção.
O Sr. Deputado Adriano Moreira diz, e diz muito bem, que Portugal está envolvido na linha da frente, o que é a prova mais inequívoca de que a participação portuguesa "nesta crise e neste conflito não foi nem tão ténue, nem tão limitada, nem tão hesitante como algumas das oposições quiseram fazer crer.
Portugal, de resto, como já salientou b Sr. Primeiro-Ministro e também o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros hoje, fez aquilo que era determinante para a participação americana na travagem da escalada do conflito no Golfo, numa fase inicial, teve uma participação que foi reconhecida pelas autoridades americanas, que não pode ser subestimada e que resulta, no fundo, da importância estratégica da base dos Açores.