690 I SÉRIE - NÚMERO 21
O Sr. Duarte Lima (PSD): - O PCP não bate palmas?
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado António Barreto.
O Sr. António Barreto (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de fazer duas observações prévias e de carácter técnico. A primeira consiste na penitência, que já exprimi há pouco, quanto a algumas gralhas que, por razões técnicas, o nosso projecto inclui, nomeadamente quando menciona saneamento dado a consulta jurídica» - evidentemente que isso não faz sentido, mas verificar-se-á rapidamente que se trata de gralhas.
Em segundo lugar, no nosso projecto não incluímos nenhuma questão relativa a pessoal, ou questões relativas à administração, a Finanças, etc., que outros projectos incluem e que consideramos evidentemente úteis. Simplesmente, o nosso projecto não se preocupou com algumas matérias desse tipo.
Devo dizer que os socialistas, mau grado algum clima polémico que existe (e felizmente que existe), gostariam de partilhar com todas as bancadas uma certa alegria e um certo orgulho pelo momento que vivemos e que talvez vá produzir um acto legislativo útil e interessante para o País, para a sociedade e para todos nós.
De facto, está a dar-se uma ajuda a que terminem as «histórias oficiais» - nunca houve só uma, houve sempre várias - e com o arrumo, com o arranjo da questão dos arquivos, contribuímos para que isso aconteça.
Em segundo lugar, vamos permitir que um período importante da nossa vida recentíssima comece a ter fontes. É dramático o esforço de muitos investigadores, estudiosos, analistas, etc., para tentar fazer a história dos últimos 60 ou 70 anos, tendo enormes dificuldades no acesso a fontes que permitam estudar com bases científicas.
Todos nós estamos recordados de que há muito pouco tempo... sou testemunha pessoal de um caso: uma parte do meu dossier da PIDE foi-me oferecido para compra em 1978, já longe do processo revolucionário propriamente dito. Um senhor veio vender-me, aliás por um preço reduzido, o dossier. Inclusivamente mostrou-me duas fotocópias para me provar que tinha realmente a mercadoria em mão.
Finalmente, devemos também estar recordados que diversos arquivos relativos a Presidentes do Conselho de Ministros, os arquivos da PIDE, da Legião, da Mocidade Portuguesa, etc., foram delapidados por variadíssimas pessoas e variadíssimos grupos e, em princípio, esse período pode estar em vias de terminar definitivamente.
Em resumo, o que é que os socialistas pretendem com este projecto? Em primeiro lugar, abrir tudo; acabar com os fantasmas, como diziam certos deputados, e iluminar a história recente, iluminar a luta pela liberdade, iluminar toda a história recente de Portugal. Mas pretendemos também preservar tudo, porque abrir tudo sem regras, sem sistema, sem um esforço real de preservação e catalogação, significa não preservar o que é necessário.
Mas, ao contrário de praticamente todos os Srs. Deputados ou de todos os grupos parlamentares aqui presentes, também queremos acabar com o particularismo, que é denominador comum dos diferentes projectos de lei que lemos presentes. Define-se um regime particularista para um certo tipo de documentos, esquecendo-se ainda que, de carácter político recente e moderno, há outros documentos que também deveriam ter uma regra geral e esquecendo também que há um problema geral dos
documentos do Estado Português, que devem ter, a nosso ver, uma regra universal. E, Sr. Deputado Silva Marques, o senhor foi quem mais falou de fantasmas. Ora, a única maneira de acabar com os fantasmas é acabar com as despensas e com os sótãos! É aí que há fantasmas! Se o senhor acabar com os sótãos e as despensas, deixa de haver fantasmas.
Queremos, essencialmente, que se possa fazer história, livre e seriamente, sem vergonha e também sem exclusivos e sem privilégios. Nos últimos quinze anos, contrariamente ao que ocorreu antes, houve exclusivos e privilégios no acesso a fontes e na possibilidade de poder estudar e redigir livremente a história de Portugal.
No nosso projecto, apresentámos e privilegiámos algumas bases gerais e não problemas de regulamentação. Estes são numerosos e já no decurso da discussão se viu que há diferentes tipos de documentos que necessitarão ulteriormente, com o trabalho da Torre do Tombo, o trabalho do Instituto Português de Arquivos e a regulamentação do Governo... Aliás, o Governo já deveria ter apresentado uma proposta de lei, à Assembleia, ou um decreto-lei de regulamentação dos arquivos e nós queremos incentivar isso.
Srs. Deputados, verificarão pelo nosso projecto que estabelecemos um período geral para todos os documentos do Estado português, designadamente a regra de 30 anos. Se os deputados dos grupos parlamentares quiserem discutir que não devem ser 30 anos, mas, sim, 25 anos, podemos ver isso. A regra de 30 anos está actualmente em vigor em muitos países europeus relativamente a todos os documentos do Estado e curiosamente foi a regra adoptada pela Comunidade Económica Europeia. De facto, ela já começou a enviar para o Instituto Universitário Internacional de Florença todos os seus documentos e todos os anos, no dia 1 de Janeiro, são abertos todos os documentos de há 30 anos, o que quer dizer que em qualquer altura se sabe que são acessíveis a todo o público os documentos com mais de 30 anos.
Alguns dos Srs. Deputados sugeriram que esse período fosse de 25 anos. Da nossa parte, não vemos inconveniente em que, em vez de 30 anos, seja de 25 anos esse período, mas que não se aponte o ano de 1994 ou de 1999, porque esse período é fantasmagórico, Srs. Deputados Silva Marques e Pacheco Pereira e Srs. Deputados do Partido Comunista, que também propuseram 1999.
De facto, vão pôr no mesmo pé de igualdade um documento de 1929 e um documento de 1974. Não faz sentido que documentos importantes para a história portuguesa de 1930, de 1940, de 1950 e de 1960 estejam ainda vedados ao público até 1994 ou 1999. Por que é que esses documentos com mais de 25 anos não são, desde já, acessíveis a todos os interessados, historiadores, investigadores, etc.?
Por outro lado, pegando, por exemplo, na regra de 1994, que contemplará apenas 20 anos relativamente a 1973, vamos cair no absurdo de ser excessivamente liberais para os documentos da PIDE (cm 1994 já estarão acessíveis documentos de 1974) e, contudo, documentos da Direcção-Geral dos Produtos Pecuários não poderão ainda estar acessíveis, o que é simplesmente ridículo.
Creio, Srs. Deputados, que não se está a olhar para este assunto da maneira que traduziria as preocupações enunciadas aqui, nomeadamente uma preocupação de isenção do Estado, de imparcialidade perante o carácter e a natureza dos documentos. E devo dizer-lhes que há documentos de carácter social, técnico, económico, cultural