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694 I SÉRIE - NÚMERO 21

problemas: há um problema de investigação histórica e há um problema político e, portanto, a discussão tem de focar os dois e não apenas um deles.
O problema histórico diz respeito à necessidade de preservar, conservar e, eventualmente, vir a abrir ao público esse acervo de materiais. Sobre esse ponto de vista devo, desde já, dizer-lhe que não é materialmente possível fazer separações no conjunto do arquivo, separando eventuais fichas individuais de outro tipo de materiais, pois isso significaria uma muito perigosa manipulação sobre o conjunto do arquivo, em que, pela própria forma como está organizado, é impossível fazer essa separação.
Depois do 25 de Abril de 1974, eu próprio tentei recuperar os materiais que a polícia unha apreendido em minha casa e assisti às recuperações mais estranhas - desde a senhora, que, na altura, presidia à extinção, arrancar cartas e outra correspondência privada de um dossier e entregar umas partes, truncando, provavelmente, o ficheiro, o documento ou o dossier original.
Ora, é completamente impossível fazer essa distinção e tentar encontrar critérios de diferenciação entre aquilo que são as informações constantes de fichas pessoais, por exemplo, e as informações de informadores ou outro tipo de relatórios policiais, e abriria um princípio de manipulação sobre os arquivos que é historicamente muito perigoso.
Do ponto de vista histórico, penso que não temos grandes divergências a não ser chamar a atenção para este ponto.
Quanto ao ponto de vista político é que discordo do Sr. Deputado António Barreto. Penso que a grande discordância de fundo deste debate - tudo o resto é pouco importante-é sobre quem quer abrir estes arquivos o mais cedo possível, em condições de acesso e de conservação, e sobre quem - neste caso, devo dizer-lhe, a pretexto de tentar encontrar uma regra geral - pretende adiar essa abertura, em tempo útil de as gerações (e isso é que é o aspecto político) que são contemporâneas do funcionamento da PIDE/DGS terem possibilidade de ter acesso a esse arquivo.
Se o adiamento da abertura do arquivo se faz para o princípio do próximo século ou para o final deste, as últimas gerações que são contemporâneas do arquivo deixam de ter aquilo que penso ser um direito seu, porque o arquivo da PIDE/DGS não é um arquivo normal do Estado, ou seja, temos de distinguir entre o arquivo da Direcção-Geral de Pecuária e o arquivo da PIDE/DGS, porque este diz respeito ao funcionamento de um regime autoritário e os outros arquivos do Estado dizem respeito, embora também tenham traços desse carácter do regime, ao funcionamento normal das instituições do Estado.
A tentativa de misturar o problema do arquivo da PIDE/DGS com o problema geral dos arquivos, quanto a mim, destina-se a iludir - isto sem sentido valorativo - o carácter específico do arquivo e dos problemas que ele levanta. É um arquivo excepcional, levanta problemas excepcionais e deve ser tratado excepcionalmente. Não deve ser incluído numa regra geral dos arquivos do Estado.
É por isso que penso que é necessária a abertura, em relação aos arquivos que traduzem o funcionamento de um regime autoritário e iníquo, não pela necessidade de denunciar o seu regime autoritário e iníquo, como pretendia a Comissão do Livro Negro, mas no sentido de os portugueses terem possibilidade de ter acesso a uma história que não seja mítica, porque os regimes autoritários geram uma história mítica, uma história oficial. Aliás, é tão mítica a história oficial do regime como o é a história oficial da oposição.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Exacto! Muito bem!

O Orador: - Essa abertura é no sentido de acabar com o papel da mitologia, com a sua necessidade e com a chantagem afectiva, moral, psicológica e política de arquivos que foram devassados com objectivos que não são de historiadores, mas, sim, políticos. Os arquivos da PIDE/DGS foram sistematicamente devassados imediatamente a seguir ao 25 de Abril de 1974 e, por isso, podem, inclusive, estar a ser motivo de chantagem.
Portanto, penso que o tratamento do arquivo da PIDE/DGS deve ser excepcional. E quando propomos a data de 1994 é no sentido de garantir um tempo mínimo para o seu tratamento e para a sua abertura, o mais depressa possível, para que haja uma reconciliação dos portugueses com uma parte do seu passado, que, sem a abertura desses arquivos, não pode ser feita, e para que se acabe com a chantagem implícita que existe na sua utilização.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Alexandre Manuel.

O Sr. Alexandre Manuel (PRD): - Sr. Deputado António Barreto, lamento não dispor de tempo suficiente para comentar algumas das suas afirmações, que considero muito importantes, designadamente a questão agora mesmo levantada pelo Sr. Deputado Pacheco Pereira. Quero crer. a propósito, que a questão não está suficientemente acautelada no projecto de lei do PSD. Mas isso é outra coisa...
O segundo ponto a sublinhar diz respeito à defesa feita por V. Ex.ª da gradação no tempo da consulta dos arquivos. Considero isso importante: Aliás, foi essa a questão que coloquei ao Sr. Deputado Silva Marques.
De qualquer modo, gostaria de saber muito concretamente se o Sr. Deputado António Barreto considera a comissão interministerial, estabelecida no artigo 5.º do projecto de lei do PS, absolutamente indispensável. Não considera, por exemplo, que o Instituto Nacional de Arquivos, com a publicação da lei dos acessos aos arquivos, seria mais do que suficiente, tornando-se assim desnecessária a criação de mais uma comissão?

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Deputado António Barreto, começo por salientar que não nego os méritos da iniciativa do PS, embora lamente que esta iniciativa tenha surgido para além do âmbito que estava fixado para este debate e que, por isso mesmo, apareça desta forma solitária, pois é sabido, e foi anunciado, que o meu grupo parlamentar pretendia também apresentar, e tem intenção disso, um projecto de lei para o tratamento geral da questão do acesso do público aos arquivos oficiais.
Devo dizer-lhe também que não me parece muito adequada a ideia do Sr. Deputado de que os outros partidos, e no caso concreto o PSD e o PCP, fazem o pequeno trabalho de acabar de extinguir o Serviço de Coordenação da extinção da ex-PIDE/DGS, de dar encaminhamento aos arquivos, de açodar a sua utilização, enquanto o PS faz os grandes trabalhos.