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30 DE JANEIRO DE 1991 1217

Concertação Social em Portugal, que adquire agora, qualitativamente, uma nova dimensão. Igualmente a profundidade da discussão, que antecedeu a sua assinatura, os objectivos e princípios estabelecidos e o período de tempo previsto para a sua implementação são aspectos que importa realçar.
As soluções e os compromissos estabelecidos no acordo não deixaram de causar perplexidade pela dificuldades em negar muitas das suas virtualidades.
No entanto, o acordo peca por vir, talvez, demasiado tarde. Foram precisos três anos para que o Governo se decidisse pela concertação social. Três anos demasiado importantes para que o Governo se quedasse pelo silêncio e pela inacção.
Portugal está a perder o desafio europeu e o nível de vida dos portugueses está a ficar muito aquém do que teria sido já possível de atingir. Os reflexos desta situação são cada vez mais negativos em termos sociais e o falhanço da meta governamental de reduzir a inflação e a consequente perda de poder de compra dos portugueses só tem agravado as desigualdades sociais, curiosamente mais acentuadas nos distritos com maior índice de crescimento.
Escusado será falar da importância da reestruturação, quanto antes, do sector produtivo português. Não se pode, no entanto, deixar de insistir nas consequências do atraso dessa reestruturação que poderá levar ao encerramento, sem apelo e sem agravo, de centenas de pequenas e médias indústrias, nomeadamente as de trabalho intensiva
Escusado será também falar da importância de um acordo desta natureza, não só quanto a essa reestruturação como na superação do atraso com o mínimo possível de danos sociais. No entanto, é importante reafirmar que, não obstante o esforço de concertação. o Acordo Económico e Social padece de algumas limitações. A cabeça dessas limitações está o facto de o acordo incidir, quase exclusivamente, sobre as relações laborais.
É certo que esse é o factor mais importante, não só quanto ao processo de produção como em relevância social. Mas, precisamente por isso, nua se entende que se tenha praticamente excluído a possibilidade e o dever de as empresas realizarem projectos na área social, relevando tal esforço para efeitos riscais, pelo menos até se criar o hábito e se compreender que sai bem mais barato e eficaz às empresas dólar o seu trabalhador e família de estruturas, que não só garantam como elevem o seu nível de vida.
O acordo ficou, pois, em grande parte, reduzido aos encargos que as entidades empresariais e sindicais esforçadamente assumiram e a um conjunto bastante grande de importantes questões, por vezes decisivas para a concretização dos objectivos do acordo, ainda a realizar por meio de negociação colectiva, difícil e incerta quanto ao seu resultado.
Quanto ao Estado, a ideia que enquadra todo o acordo é, por um lado, a da desintervenção progressiva -a que corresponde o esforço de desregulamentação, por vezes excessivo e fazendo perigar conquistas importantes dos trabalhadores portugueses - e, por outro, a devolução e ou agravamento da responsabilidade do Estado na protecção social.
Ora, o acordo bem poderia ter ido mais longe e até noutro sentido. É para nós incompreensível que um acordo desta importância, denominado económico e social, pouco ou nada preveja acerca dos programas, apoios e facilidades à reconversão das empresas, à organização do processo produtivo e à modernização das técnicas de intervenção no mercado; pelo contrário, tudo é feito em função do factor de produção trabalho.
O mesmo se diga quanto à prevenção e resolução dos problemas sociais que, para o PRD, passa necessariamente por uma nova concepção de empresa e das relações laborais. Com efeito, é para nós claro que a resolução de inúmeros problemas sociais é bem mais eficaz sendo realizado pelas empresas do que pelo Estado.

nossa concepção e análise distancia-se, assim, das que serviram de base ao acordo, na medida em que não só não se conseguiu afastar o binómio capital/trabalho como se acentuou a tensão entre os mesmos. Obviamente, o consenso alcançado não prejudica essa tensão mas, pelo contrário, até a pressupõe e incentiva.
Todos os erros e suas funestas consequências, como os milhares de contratados a prazo - tanto no sector privado como, escandalosamente, no sector público- derivam dessa concepção, segundo a qual a segurança no emprego reduz-se ou depende, quase exclusivamente, da manutenção do vínculo laborai.
Todavia, avaliando o acordo pelos próprios parâmetros que o condicionaram, não podemos deixar de reconhecer que importantes objectivos foram atingidos e muitos mais estão agora em melhores condições de virem a sê-lo.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A negociação colectiva é um instrumento fundamental de progresso e de justiça social. Em matéria laborai não é por acaso que a Constituição e as leis actualmente em vigor estabelecem o direito de os trabalhadores participarem na elaboração da legislação que lhes diz directamente respeito.
Ao fim de três arrastados anos. o Governo parece, finalmente, ter-se apercebido disso! Mas, infelizmente, não o compreendeu totalmente, pois para o Governo todo o esforço de concertação parece ter começado com a negociação e terminado com a assinatura do Acordo Económico e Social (AES).
As recentes atitudes do Governo parecem, com efeito, dar razão àqueles que afirmam que com a lógica da flexibilização e da desregulamentação, que o Governo se esforçou por consagrar no acordo, o Governo mais não visa do que descartar-se, o mais possível, das suas responsabilidades. Por isso mesmo, em relação a muitos dos aspectos do acordo, alguns específicos outros muito genéricos, a única coisa que se estabeleceu foi a sua negociação futura, onde, naturalmente, as associações empresariais e as centrais sindicais jogarão o papel principal. É ainda à luz deste princípio que muitas das recentes conquistas são colocadas em causa no próprio texto do acordo.
Más o mais grave nem sequer é isso! O mais grave é o facto de o Governo, não obstante o ênfase do acordo na negociação colectiva, ter começado por não respeitar o princípio, por ele próprio reconhecido e assumido, de que o diálogo tem de ser constante não só em relação à implementação do acordo como também em relação a aspectos nele não contemplados.
A proposta de lei n.º 170/V surge na sequência do acordo; no entanto, o facto de o Governo ter apresentado um pedido de autorização legislativa, em vez de um projecto final, previamente discutido com os parceiros sociais, levanta-nos sérias preocupações acerca das intenções do Governo e do rumo futuro da negociação colectiva.
O Governo, provavelmente, não abandonou o escopo da negociação colectiva, mas parece pretender aparecer à mesa das negociações com um poder negociai acrescido, que lhe baliza as posições, sem poder ser imputado directamente a ele mas, sim. à Assembleia da República.