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I SÉRIE - NÚMERO 44

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: É com algum desapontamento que vemos, neste momento, esta questão ser trazida a Plenário. Liminarmente porque a conjuntura política em que esta proposta foi elaborada evoluiu e evoluiu de forma decisiva, por um lado, no sentido do estabelecimento no mundo de possíveis lideranças regionais e, por outro lado, no sentido de que a Leste, Sr. Presidente e Srs. Deputados, as grandes e generosas esperanças nascidas com a perestroika e com a glasnost continuam a ser grandes mas permanecem ainda, claramente, focos de tensão nos nossos limites orientais da Europa.
Nesse sentido, interrogamo-nos sobre se e em que medida certos actos de desarmamento unilateral, ou melhor, certos actos que com eles podem ser aparentados, para sermos totalmente rigorosos, terão cabimento neste momento e nesta conjuntura.
A proposta de lei não coloca directamente em causa o princípio do serviço militar obrigatório, que é instituticional e constitucional. Para quem, neste momento, fala tanto em princípios republicanos, em democracia e em liberdade importa sublinhar que nasceu na esteira de Revolução de 1789 e foi teorizado na base do princípio da defesa da Nação - a Nação que aí se considerava momento ou acto do nascimento pelas armas - e tem, sobretudo, um dos momentos mais altos na Batalha de Valmy quando a república e o general Kellermann incitam os cidadãos a defender as jovens instituições da democracia francesa nascente.
Na sua formulação, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a proposta de lei define dois pontos essenciais: o serviço militar obrigatório e o serviço militar voluntário. E neste serviço militar voluntário desde logo, coloca-se-nos uma questão, que é a de saber se existe uma forma de serviço militar voluntário, que é o serviço militar contratado, que pode, em circunstâncias que não estão claras, evoluir para uma entrada para os quadros permanentes. Em que sentido e de que forma? Não iríamos causar um novo problema, aliás, semelhante àquele que há 15 anos foi discutido?
É no serviço militar obrigatório que se concretiza a redução do cumprimento que o Governo propõe, não esquecendo o artigo 27.º e a possibilidade de, por meras razões circunstanciais e não estruturais, por meras razões de não existência do voluntariado conveniente, esse serviço militar ser prolongado num ano e de ser diminuído no outro. Vamos ter, Sr. Presidente e Srs. Deputados, umas Forças Armadas em que vão ou em que podem coexistir dois tipos de soldados, com os inconvenientes certos e as vantagens incertas de tudo isso.
A proposta de lei prevê ainda uma série de incentivos ao voluntariado que, neste momento, deixarei entre parêntesis por não me parecer uma parte essencial. Simplesmente, não se prevêem, nem estão enunciadas, medidas destinadas a corrigir e a aumentar a capacidade e a prontidão das nossas Forças Armadas e, concomitantemente, de acordo com essas medidas, a diminuir o tempo de serviço.
Importaria, desde logo, e como se propõe no projecto de lei apresentado pelo do PS, definir as modalidades do serviço efectivo normal, porque é obrigatório todo o serviço militar executado por conscrição, isto é, por chamada vinculativa às fileiras pelo Estado. Daí, afigurar-se inexacta a terminologia que distingue serviço militar obrigatório de serviço militar voluntário, uma vez que, nos termos constitucionais, o serviço militar voluntário, na terminologia usada nesta proposta de lei, ainda é uma forma de cumprimento do serviço militar obrigatório.
Este carácter de ambiguidade está, de resto, presente em toda a proposta de lei. Assentes estes princípios, importaria saber quais as medidas que o Governo vai tomar para compensar em efectividade a redução do tempo de instrução.
Quando queremos as premissas queremos a conclusão e as conclusões são muito simples: se é admissível que quatro meses bastem ou possam bastar para uma boa instrução geral básica, já é duvidoso, e é o mínimo que pode dizer-se, que se possa fazer coincidir nesse período uma instrução geral básica com uma clara especialidade e a permanência nas fileiras é impossível.
A primeira questão que pode colocar-se é a seguinte: pensa o Governo acabar, no serviço militar obrigatório, com a existência de oficiais milicianos ou promover o oficial miliciano, um cidadão com quatro meses de instrução e sem passagem pelas fileiras? Em que medida é que o quadro de oficiais milicianos não vai ficar nas mãos dos oficiais voluntários ou do pessoal contratado?
Estas são questões absolutamente definitivas e cruciais.
Em segundo lugar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, importa dizer uma consabida frase: soldado com quatro meses de instrução terá necessariamente quatro horas de vida em combate real.
Uma redução do serviço militar obrigatório não pode escamotear estes problemas, nomeadamente o da modificação completa das fichas de instrução, no sentido da sua maior intensificação e da sua melhor definição de objectivos.
O problema de encarar um serviço militar de curta e média duração, como propusemos, poderia permitir manter o necessário grau de prontidão das Forças Armadas, com a também necessária forma de corresponder a certas vozes que se levantam.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pretendi ser, de certa forma, telegráfico e enunciar problemas, pois o tempo de que dispomos não permite responder a todas as questões que aqui se deixam enunciadas. No entanto, vou responder a algumas.
Em primeiro lugar, parece-me claro que ninguém pode enviar para combate, mesmo para defender as fronteiras nacionais, soldados com quatro meses de instrução. Terá que haver, antes, alguma preparação especial para o combate.
Existe uma experiência histórica terrível que se concretiza no momento em que, na guerra das ilhas Falkland, são lançados para frente contingentes de soldados de serviço militar obrigatório com seis meses de instrução e que, por falta dessa mesma instrução, têm dificuldades terríveis em combater com as experientes tropas inglesas.
Em segundo lugar, «quem quer as premissas quer as consequências». Ora, isto vai implicar ter de encarar a necessidade de profissionalizar pelo menos alguns segmentos das Forças Armadas para manter uma força credível, operacional e dotada de elevado grau de prontidão.
Quem quer uma diminuição radical do serviço militar obrigatório não pode fugir às consequências. E, aqui, Srs. Deputados, surge a questão de saber qual vai ser a composição das nossas Forças Armadas no futuro, qual será a percentagem dos oriundos do serviço militar obrigatório restrito, ou dos voluntários, ou dos contratados ou, quem sabe, até dos profissionais. Enfim, a moderna tecnologia não se compadece com uma instrução de quatro meses e, como é necessário sublinhar, até a própria formação do combatente, que continua a ser o elemento essencial num exército ou numas Forças Armadas, dificilmente se compadece também com essa formação.