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8 DE MARÇO DE 1991 1655

sidente da câmara o poder (que é da câmara) de propor o número de vereadores a tempo inteiro; transforma em competências próprias do presidente da câmara as competências que lhe eram entregues por delegação tácita da câmara, o que era, portanto, sempre derrogável; atribui-lhe ainda o poder próprio de realizar despesas de elevado valor, também ao contrário do que hoje acontece.
Este conjunto de alterações implica a entrega de 16 poderes da câmara municipal ao presidente da câmara e incluiu poderes tão importantes como os de direcção de pessoal, administração de património, revogação dos actos dos funcionários, promover empreitadas e obras por administração directa, conceder licenças para habitação, embargar e ordenar a demolição de obras e conceder licenças policiais e fiscais.
Mas, não satisfeito com isto, o Governo ainda pretende conceder a possibilidade de praticar actos da competência da câmara em situações que o presidente da câmara considere não poderem aguardar pela realização de uma sessão normal ou extraordinária da câmara municipal. Digamos que alguns presidentes de câmara poderão considerar que a sua câmara está em permanente estado de sítio e, portanto, nunca levar à câmara as decisões que esta deve tomar, o que é inadmissível.
Ora, todas estas alterações não só ferem, profundamente, a democracia e o pluralismo da câmara municipal como põem em causa o princípio da colegialidade, expresso no artigo 252.º da Constituição da República, quando afirma expressamente: «[...] a câmara municipal é o órgão executivo colegial».
Impõe-se, pois, que no debate na especialidade o Governo e o PSD (neste caso, só o PSD da Assembleia da República, não o PSD do Governo, pois esse não está presente) revejam as alterações e malfeitorias contidas na proposta de lei n.º 166/V, no respeito pelos órgãos municipais (câmara e assembleia municipais) e na defesa de um efectivo reforço do poder local.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr.ª Presidente, começo por chamar a atenção desta Câmara para a circunstância singular de estarmos, por imperativo constitucional, a fazer um debate que vai preceder um conjunto de votações na especialidade sem o acompanhamento de um relatório identificador da matéria que vamos votar. Isto é a degradação funcional evidente do modo como se trabalha na Assembleia da República! Nós não podemos presumir que três ou quatro deputados, na primeira fila de cada bancada, assumam inteiramente, relativamente a deputados que não têm formação suficiente, a responsabilidade da votação na especialidade que vai realizar-se.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Quero, Srs. Deputados, salientar que esta proposta de lei n.º 166/V, da autoria do Governo - que aqui não aparece para sustentá-la! -, é uma das propaladas grandes reformas do poder local, avançadas no Verão do ano passado pelo Sr. Primeiro-Ministro.
É caso para perguntar: que credibilidade dá o Governo às grandes propostas reformistas avançadas por si próprio para o poder local quando, no momento da votação, peca por ausência e perde por falta de comparência na defesa das suas próprias iniciativas?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, o que de essencial nos é proposto é o seguinte: em nome do alegado reforço das competências funcionais do presidente da câmara, trata-se de instituir no poder local um regime completo de presidencialismo. É caso para perguntar sendo o poder local uma das instâncias democráticas que, por maioria de razão, deve favorecer a máxima participação dos cidadãos na vida pública, como é possível que a orientação do Governo seja a do máximo presidencialismo na gestão das responsabilidades municipais? Acontece, todavia, que o chamado reforço das competências do presidente da câmara não resulta de novas competências atribuídas aos municípios, mas, isso sim, muito simplesmente -o que é grave! -, do esvaziamento das competências da assembleia municipal e da própria câmara municipal, enquanto organismo colegial.
Acontece, todavia, que nos termos da Constituição da República Portuguesa os órgãos do município são a câmara municipal, como órgão executivo, e a assembleia municipal, como órgão deliberativo.
Ora, o que aqui agora se pretende é que o presidente da câmara, que é cargo e função no plano institucional, passe a ser órgão por verdadeira usurpação de poderes do órgão executivo câmara municipal, como tal dignificado na Constituição da República Portuguesa.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado ainda, afirmou-se que se pretendia dar reforço às atribuições da assembleia municipal. Pasme-se, Srs. Deputados! Fomos à procura das medidas de reforma que concretizassem o reforço do papel da assembleia municipal e aquilo que, no essencial, encontrámos foi a chamada moção de censura. E o que é a moção de censura? É, nos termos da proposta do Governo, uma moção que permitirá formular e divulgar pela assembleia municipal juízos negativos e reprovativos da actuação da câmara municipal ou da actuação individual de qualquer dos seus membros.
Imaginem os Srs. Deputados que a Assembleia da República tinha a atribuição de poder aprovar, contra o Governo, moções de censura política que, todavia, não tivessem qualquer consequência política e que, ao nível da Assembleia da República, poderíamos aprovar moções de censura individualizadas aos ministros deste ou de qualquer outro governo, sem que daí resultasse qualquer consequência institucional para o ministro censurado!...
Ou seja, teríamos, ao nível da Assembleia da República, institucionalizado, pura e simplesmente, o regime da chicana parlamentar e contribuído para potenciar a situação do conflito institucional entre o Parlamento e o Governo, sem qualquer responsabilização nem para quem censurava nem para quem era censurado.
Então, pergunto: o que é que é diferente ao nível das instituições municipais? Como é admissível pensar-se que, ao nível das instituições municipais, seja legítimo aprovar actos de censura que não responsabilizam politicamente nem a maioria censurante nem os alvos dessa mesma censura, seja o colectivo câmara municipal, sejam, individualmente, os vereadores dessas câmaras municipais?