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1922 I SÉRIE -NÚMERO 59

O Governo e o PSD fogem do debate público e do confronto de ideias como «o diabo foge da cruz». Têm má consciência! Por isso, persistem, de forma obstinada, em violar o texto constitucional. Mas melhor andariam em retirarem do agendamento esta proposta e submetê-la à discussão pública para não terem outro dissabor.
Antes de passarmos às questões materiais, é preciso esclarecer o Sr. Secretário de Estado da Alimentação - é bom que fique claro -, ao contrário daquilo que respondeu ao meu camarada Rogério de Brito, está a legislar em causa própria e tem, de facto, interesses directos nesta matéria, o que pode colocar em causa a ética de toda esta discussão. Basta dizer que ainda ontem um familiar seu, o próprio pai, recebeu, como rendeiro, uma reserva na Cooperativa de Aguiar; basta ler as queixas que chegaram a esta Assembleia de outros reservatórios a acusar o Sr. Secretário de Estado de, com outros familiares, a propósito de uma reserva, que foi polémica, terem invadido a Herdade da Defesa numa carrinha de caixa aberta, levando todas as vacas bravas e as respectivas crias, 2 touros, 15 novilhos e 11 éguas que se encontravam a pastar em duas cercas da Herdade da Defesa, de um outro reservatário que se vem queixar.

Vozes do PSD: - Isso não é verdade!

O Orador: - Sr. Secretário de Estado, está escrito, com nomes.
Portanto, é preciso que fique claro que há interesses materiais e pessoais nesta legislação, o que, de algum modo, não abona a uma discussão séria e isenta do membro do Governo que, hoje, veio aqui aprofundar uma matéria de tanta importância.

Vozes do PCP: - É um escândalo!

O Sr. Vasco Miguel (PSD): - E se isso for mentira, Sr. Deputado!?

O Orador: - Mas vamos às questões materiais.
Em recente entrevista, o Sr. Secretário de Estado da Alimentação afirmava que a área expropriada, arrendada pelo Estado, com contrato, a pequenos agricultores e cooperativas, ronda os SÓ 000 ha e que é a essa área que esta proposta de lei diz respeito.
Este número, confessado pelo Governo, vem confirmar que, ao longo dos últimos anos de Governo PSD, cooperativas e centenas de pequenos agricultores têm sido empurrados para fora da terra, que, no caso particular dos pequenos agricultores, o próprio PSD lhes tinha entregue, quando os quis instrumentalizar para dividir as cooperativas e mais facilmente abrir caminho para a posterior entrega de toda a terra aos grandes proprietários, como, aliás, acabou de confessar o Sr. Deputado Basílio Horta.
Ao Sr. Ministro, que gosta de afirmar que isto são fantasias do PCP, aconselhamos a que se reveja nas afirmações produzidas este fim de semana pela direcção da CAP, quando esta afirma que «há 12 anos a criação de novos agricultores tinha um objectivo político: dividir as unidades colectivas de produção». Nós tínhamos razão e hoje o Sr. Deputado Basílio Horta, que conhece bem esta matéria, porque foi nessa altura Ministro da Agricultura, veio confirmar. Hoje já o pode dizer. Há 12 anos não dizia isto, dizia outra coisa, como a de criar novos agricultores, a de querer entregar terras a pequenos agricultores, mas, hoje, já veio revelar o que é a real verdade. O que se procurou com isto foi criar, em cada fase do processo, algumas nuvens para esconder o real objectivo, que é a privatização e a reconstrução completa da grande propriedade.
Comparemos, portanto, alguns números.
O Sr. Secretário de Estado diz que esta proposta de autorização legislativa diz respeito a 50 000 ha, mas, em Abril de 1988, o governo PSD informava esta Assembleia que dentro do «sector estatal, no domínio da entrega para exploração a pequenos e médios agricultores, estima-se hoje [...]» - nessa altura - «[...] em 170 000 ha a área expropriada entregue a título de arrendamento, concessão de exploração ou licença de uso privativo a cerca de 4290 pequenos e médios agricultores, o que a somar-se a 25 000 ha, que estão hoje legitimados por vínculo contratual de arrendamento entre o Estado e as cooperativas, totaliza cerca de 19S 000 ha de terra neste sector».
Se o Sr. Secretário de Estado Luís Capoulas afirma agora que nestas condições, como disse à imprensa, só restam cerca de SÓ 000 ha, sabendo-se que cerca de IS 000 ha estão ainda hoje arrendados a cooperativas, então confirma-se que durante o actual governo de Cavaco Silva 135 000 ha de terra passaram das mãos dos pequenos agricultores para os reservatários, o que corresponde a 80 % da área que lhes tinha sido distribuída pelo PSD, o mesmo se tendo passado em mais de 40 % da área arrendada às cooperativas. Costuma dizer-se que o tempo é o melhor mestre. E o tempo e a vida estão a provar que tínhamos razão quando dizíamos que o que se estava a preparar para o Alentejo não era qualquer política de criação de explorações familiares mas, a partir da instrumentalização dos pequenos agricultores, reconstituir-se por completo a grande propriedade, atirando-os, a certa altura do processo, contra as cooperativas quando ainda não havia força política para liquidar e assumir, claramente, o objectivo da reconstituição dos grandes interesses fundiários.
Afinal, quando em Junho do ano passado, durante a discussão da nova lei de bases contra a Reforma Agrária, o Sr. Ministro afirmava aqui que careciam de qualquer fundamento sério as acusações do PCP quanto são pretenso desalojamento dos pequenos e médios agricultores», prova-se que são as afirmações do Sr. Ministro, do Governo, essas sim, que carecem de qualquer fundamento, que procuram escamotear a verdade.
Mas mais, é que este pedido de autorização legislativa vai exactamente no mesmo sentido. Por debaixo do manto diáfano da propaganda que o Governo tem vindo a fazer, o que se trata agora é da outorga em propriedade aos rendeiros do Estado das áreas que lhes foram entregues para exploração, a realidade é bem outra.
Vejamos: a proposta exige, para essa entrega em propriedade, um período probatório mínimo de 10 anos contados da investidura na posse da terra, durante a qual os arrendatários tenham estado a explorar a respectiva área.
Se este período se refere ao passado, então é preciso que se diga que mais de 80 % dos actuais rendeiros (cooperativas e pequenos agricultores) estão à partida excluídos porque os seus contratos foram celebrados há menos tempo. Por exemplo, das 26 cooperativas com que o Governo decidiu celebrar contratos de arrendamento 21 têm menos de 10 anos.
Mas se este dispositivo se refere ao futuro, então é preciso que fique claro quais as condições em que vai ser exercida a exploração durante os próximos 10 anos e se todos os actuais rendeiros do Estado -repito, todos