2300 I SÉRIE - NÚMERO 68
O Dr. Ricardo Leite Pinto, assistente de Ciência Política e Direito Constitucional, escreveu o seguinte: «É óbvio, como de resto já tive oportunidade de sustentar, que a dimensão da defesa da Consumição e da concordância política podem coincidir no veto político. Todavia, o que de nenhum modo se legitima é que, não tendo visto os seus pontos de vista jurídico-constitucionais acolhidos pelo Tribunal Constitucional, o Presidente da República procura passar a situação pelo recurso ao veto político.» Ora, isto foi o que patentemente se verificou na recente atitude do Presidente da República, o qual, lendo deparado com a discordância do Tribunal em relação à inconstitucionalidade que o Presidente defende existir na norma do artigo 10.º, n.º 2, do Estatuto, recorre agora ao veto político para superar a tese afirmada pelos juizes constitucionais.
E mais adiante acrescenta o seguinte: «É evidente que, pela configuração dada aos dois instrumentos de veto constitucionalmente previstos, o Presidente não pode utilizar o veto político para ganhar o que pela via da fiscalização preventiva da constitucionalidade perdeu. O acto prejudicial é ainda inconstitucional pelas sequelas que acarreta. Se são conhecidas as críticas contra o figurino constitucional do Tribunal Constitucional e os perigos de politização partidária das suas decisões, decorrente da forma de designação e composição daquele, dificilmente se compreende que o órgão de soberania Presidente da República, pondo em crise a separação de poderes, discuta o valimento jurídico-constitucional das decisões do Tribunal, Constitucional, utilizando o veto político como instrumento para se sobrepor ao juízo daquele Tribunal ainda que, como é sabido, o Tribunal não emita decisões de conformidade constitucional.»
E continua: «De resto, o Presidente da República tem sempre à sua disposição a fiscalização abstracta sucessiva da constitucionalidade, de forma a, em momento posterior, procurar uma decisão conforme aos seus pontos de vista. Não se ficam por aqui as consequências negativas do acto presidencial comentadas ao nível do modelo constitucional de separação de poderes e do figurino semipresidencial do sistema de governo. Creio, todavia, que a conclusão que devemos extrair destas notas chegará. E a conclusão, já antes adiantada, é simples: trata-se de um veto claramente inconstitucional.»
Na mesma linha, outro assistente de Direito Constitucional, Dr. Jorge Bacelar, pronuncia-se lambem pela constitucionalidade e pela ofensa à separação de poderes pelo desvio de poder que o acto de velo do Presidente da República traduz nas circunstâncias em que foi proferido.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Era altura de resolver a questão criada pelo veto presidencial, pelo que mandava o senso que se encontrasse uma solução que permitisse o consenso que o Presidente da República, na sua fundamentação de veto, entendia dever existir nestas matérias e daí que tenha havido um esforço, em sede de Comissão, como, aliás, já aqui foi salientado, para encontrar uma redacção que substituísse a norma vetada pelo Presidente da República e permitisse encontrar uma solução para o regime das eleições legislativas regionais, lendo-se optado pelo sistema que já está consagrado no Estatuto provisório. Mas, mesmo assim, têm-se levantado dúvidas sobre a constitucional idade desta solução.
Em todo o caso, quero adiantar que já houve uma tentativa de alterar o sistema vigente, em 1988, através de um mecanismo similar ao que agora foi adoptado, com a excepção de que não se previa a disposição suplementar de impor que nenhum dos círculos elegesse menos de dois deputados. Porém, essa situação foi resolvida e, infelizmente, não aceite pelo veto presidencial.
Mas o Tribunal Constitucional já se pronunciou sobre essa matéria e considerou que era inconstitucional a solução encontrada, na medida em que criava um terceiro círculo uninominal, que era o de São Vicente, uma vez que hoje existem apenas dois círculos uninominais, o de Porto Moniz e o de Porto Santo.
Isto é, o Tribunal Constitucional considerou que não era uma distorção relevante, que não fosse tolerável, a que existe na solução actual, que é a da uninominalidade dos círculos e que está consagrada, como se sabe, há quase 15 anos.
Portanto, parece-me que é de todo impensável que esta solução - que é a consagrada no Estatuto provisório, que, como se sabe, foi da lavra do Sr. Deputado Almeida Santos e que tem vigorado durante estes anos - venha a criar um novo incidente e que o Presidente da República venha a ter dúvidas sobre a sua constitucionalidade ou venha a usar, de novo, o direito de veto para complicar a aprovação do Estatuto.
A posição desta Câmara foi adoptada por consenso, tendo sido, aliás, por unanimidade que há pouco votámos esta solução. Por isso, creio que as preocupações de consenso que o Presidente da República manifestou na fundamentação do seu veto estão satisfeitas e ultrapassadas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos na véspera do 25 de Abril! Com estes incidentes todos, feliz data esta para a aprovação do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira, que significa o reforço da autonomia, sendo esta o fruto, talvez o mais belo, do 25 de Abril a par das liberdades reconquistadas.
Estamos, pois, satisfeitos por ter havido esta coincidência de datas e porque, finalmente, a Madeira vai ter o seu Estatuto Político-Administrativo.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Perante o veto do Presidente da República e a consequente obrigação de encontrar uma solução, com outros partidos, para poder ultrapassar esse velo, quatro soluções eram teoricamente possíveis.
Em primeiro lugar, deixar cair a proposta do Estatuto Político-Administrativo, o que linha como inconveniente o problema da provisoriedade da actual lei e o reconhecimento da incapacidade de o PSD elaborar uma proposta de estatuto em condições de poder vir a ser aprovada, tal como o PSD/Açores já fez há mais de 10 anos.
Em segundo lugar, encontrar uma proposta alternativa para o sistema eleitoral, o que passaria sempre por uma maior fidelidade ao princípio da representação proporcional e obrigaria à reformulação dos círculos eleitorais existentes ou à introdução de um círculo regional corrector. Só que esta solução, além de comprovar a falência de estratégia do fundamentalismo, que baseou toda a pré-história deste Estatuto e que foi hoje aqui lembrada pelo Sr. Deputado Guilherme Silva, representaria um revés significativo para a engenharia eleitoral que tem servido o PSD/Madeira.
Em terceiro lugar, remeter para a lei eleitoral a solução definitiva sobre o assunto, dando razão aos diversos constitucionalistas que referem que esta matéria não deve